Lasier Martins: “Há uma sintonia entre o que eu venho dizendo nos microfones e o que a população pensa”

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Sul 21
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Lasier Martins: “Há uma sintonia entre o que eu venho dizendo nos microfones e o que a população pensa”
Lasier Martins: “Há uma sintonia entre o que eu venho dizendo nos microfones e o que a população pensa”

Débora Fogliatto

O senador eleito Lasier Martins começava a se adaptar à sua nova realidade na manhã desta segunda-feira (06), quando recebeu o Sul21 às 10h30min – o sexto veículo a entrevista-lo. De sua casa, onde paralelamente uma equipe de uma emissora de televisão filmava um perfil dele, entrevistando suas familiares, seguiu para o estúdio de outra TV, às 11h. Apenas na noite deste domingo (05), uma chamada a cada cinco minutos chegava em seu celular.

De jornalista que criticava a política a um agente da própria, Lasier não vê incoerência em sua trajetória. Pelo contrário, para ele, sua eleição é baseada exatamente no fato de que “houve correspondência, eu soube interpretar aquilo que esse eleitorado desejava”. Eleito para seu primeiro mandato político, ele se demitiu da RBS, onde trabalhou por 27 anos, em 2013, anunciando que concorreria a uma vaga no Senado.

Enquanto concedia a entrevista, recebeu o primeiro contato oficial do Congresso Nacional: a ligação do secretário-geral do Senado Luís Fernando Bandeira de Melo, com quem tratou de sua chegada à Brasília. “Vou precisar de orientação, afinal sou político novo”, pediu o comunicador ao telefone, questionando que dia precisaria chegar à capital brasileira e quando era a posse como senador.

“Fui muitas vezes ao Congresso em coberturas jornalísticas, então conheço as dependências de certa forma”, disse para o secretário, mas questionou onde ficaria hospedado. Ao Sul21, Lasier afirmou que não pretende se mudar para Brasília em tempo integral, mas sim trabalhar lá e continuar morando em Porto Alegre, onde viveu durante a vida toda.

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21
Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Confira a entrevista na íntegra:

Sul21 – O senhor concorreu contra dois políticos já conhecidos na carreira, já foram governadores. O que foi o fator determinante para sua vitória?

Lasier Martins – Acredito que tenha sido o reconhecimento do público de que eu merecia uma oportunidade, considerando meus comentários em rádio e televisão. Houve correspondência, eu soube interpretar aquilo que esse eleitorado desejava. Ou seja, um crítico inconformado com os vícios da política, com o abuso de dinheiro público, os escândalos do governo, a inoperância de outros. E daí procuraram alguém novo na política, acho que essa foi a razão principal na minha vitória. Não há sentido falar em ser um comunicador conhecido, porque os outros dois candidatos eram muito mais conhecidos como legisladores e executivos.

Sul21 – Então ter sido exatamente crítico da política foi o que fez as pessoas acreditarem que o senhor poderia mudá-la? 

Lasier Martins – Acho que foi um dos fatores importantes, não digo que tenha sido o único, mas foi muito importante.

Sul21 – O senhor diria que sua eleição mudou o seu conceito de política?

Lasier Martins – Não mudou nada, mas aumentou minha desconformidade em alguns aspectos. Por exemplo, o fato dos candidatos não se afastarem para concorrer é inaceitável, porque cria uma dificuldade quase intransponível para quem quer entrar na política, porque eles têm vantagens da máquina, em ter veículos, assessores, diárias. Enquanto o novato tem que enfrentar tudo com recursos próprios.

Sul21 – A sua imagem como alguém que veio de fora da política colaborou, visto que as pessoas se mostram desiludidas com a política?

Lasier Martins – Sim, exatamente. Há uma sintonia de pensamento entre o que eu venho dizendo nos microfones há algum tempo e o que a população pensa, uma descrença com a política. Querem uma novidade.

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21
Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Sul21 – O senhor já havia percebido esse eco no público, por isso decidiu concorrer?

Lasier Martins – Eu sempre gostei de política e há mais de 30 anos vinha sendo convidado para concorrer, mas sempre relutei e rejeitei. Com o agravamento ético, ou antiético, da política, fui me insurgindo, me indignando e cheguei à conclusão de que tinha chegado a hora. Concluí que só criticar pelo rádio e pela televisão não resolvia nada, quem sabe fazer uma tentativa com boa perspectiva de também influenciar dentro da política e foi isso que determinou minha mudança. E não me arrependo, só tenho a agradecer por quem votou em mim e me deu essa votação tão expressiva.

Sul21 – Nesse sentido, o senhor vê uma semelhança entre a sua eleição e a da senadora Ana Amélia, que também veio de uma carreira jornalística na mesma empresa?

Lasier Martins – Eu acho que há algumas semelhanças, mas não total, porque os meus comentários e cobranças sempre foram mais contundentes que os dela.

“O decepcionante foi deslealdade na competição, porque tive poucos recursos financeiros, ¼ do que tiveram meus adversários e que além de serem maiores, ainda destruíram minha propaganda na rua”.

Sul21 – O que o senhor achou de disputar, o que mais o surpreendeu e o que mais o desgastou?

Lasier Martins – Uma alegria foi o contato com o eleitorado, é algo extraordinário. Abraçar, cumprimentar, tirar fotografia, ser saudado, isso é muito bom. A maneira como fui recebido por esse estado foi gratificante. O decepcionante foi deslealdade na competição, porque tive poucos recursos financeiros, ¼ do que tiveram meus adversários e que além de serem maiores, ainda destruíram minha propaganda na rua. Os meus cavaletes e propaganda na rua foram destruídos, principalmente de madrugada. Meus assessores colocavam faixas e nunca mexeram nas dos outros, as minhas eram sempre destruídas.

Sul21 – O senhor falou que teve menos recursos que seus adversários. Para que se tenha mais igualdade nesse sentido, defende uma reforma politica?

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21
Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Lasier Martins – Claro. Essa é a reforma mais urgente que nós temos e quero batalhar muito assim que chegar no Senado, sabendo da dificuldade pelo corporativismo que reina no Congresso. Mas por exemplo, propor o afastamento a quem concorrer a reeleição três meses antes, não é possível manter essas vantagens. Aceitar coligação, mas com o direito de acesso de televisão contabilizando apenas o tempo do partido principal, inibindo partidos de aluguel, que sedem tempo em torno de cargos. Adotar financiamento só de pessoas físicas, não públicos nem de empresas; apenas de pessoas físicas e com limitadores, para igualar mais a disputa.

Sul21 – O senhor diria que é essa sua principal bandeira ao chegar no Senado?

Lasier Martins – É uma delas, a outra é lutar por recursos para o Rio Grande do Sul, que está literalmente no fundo do poço. Levantar verbas, investigar porque a Lei Kandir nunca foi regulamentada. O Rio Grande do Sul recebe 10% do que tem direito como estado exportador, procurar ver de perto porque isso acontece e pedir a regulamentação e o reembolso. O Rio Grande do Sul recebia no mínimo 200 milhões por mês e hoje apenas 117 e pelo volume de exportação mereceria em torno de um bilhão de reais por mês. Além de defender que se vote logo a renegociação da dívida afim de modo a reestabelecer o poder de empréstimos, que no momento o RS esgotou a capacidade de endividamento, não pode fazer nenhum empréstimo. E como terceiro passo diminuir a prestação da receita líquida, que hoje é de 13%, lutar para que se baixe para 9%, de modo a sobrar alguma coisa para investimentos.

Sul21 – Como o senhor se sente estando do “outro lado”, era jornalista e agora é o entrevistado, é estranho para o senhor?

Lasier Martins – Parece estranho, mas eu tinha me preparado para isso. Porque eu vinha amadurecendo há vários anos a ideia de entrar na política. E eu já vinha sendo uma jornalista político, então faço uma inversão de entrevistador para entrevistado, então é uma inversão de papéis, de entrevistador para entrevistado. Mas realmente é uma coisa que me desvanece muito. Acho curioso isso, mas vou procurar me adaptar. Essa deve ser minha sexta ou sétima entrevista hoje, e já vou para outra depois. E o telefone não para, você está vendo que tenho dois telefones e eles não param.

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21
Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Sul21 – A gente sempre diz que a vida no jornalismo é muito corrida. O senhor está percebendo que talvez que a vida mais corrida ainda seja exatamente a da política?

Lasier Martins – Acho que têm afinidades, são parecidas. Mas, neste momento, incomparavelmente a vida de político é dez vezes maior que a do jornalista.

Sul21 – O senhor se elegeu senador e os dois candidatos que foram para o segundo turno no estado são de outros partidos — PT e PMDB. A que o senhor acha que se deve esta divisão do eleitorado, e porque o Vieira da Cunha não angariou os votos que você recebeu?

Lasier Martins –  É um mistério. Eu não entendo, estou procurando entender. Por que o Vieira fez uma bela campanha, foi muito bem nos debates, ele tem convicções muito claras. Mas eu acho que é por que houve uma polarização, a população queria decidir entre o Tarso e o outro. E como a Ana Amélia era muito conhecida, ela teve preferência. Mas quando houve aquele episódio do marido da Ana Amélia em que o PT bateu muito forte, ela começou a perder espaço, e assumiu o lugar o Sartori, que já vinha bem, que veio de baixo num crescimento fantástico, e acho até que vai ser o governador.

“Eu sou de opinião que o partido fique independente e cada um vote em quem quiser, que não se vincule a ninguém. O PDT se desgastou muito por viver à reboque dos outros”.

Sul21 – O senhor e o seu partido discutem em qual dos dois apoiar neste segundo turno?

Lasier Martins –  O partido vai fazer uma reunião hoje de tardezinha. Eu sou de opinião que o partido fique independente e cada um vote em quem quiser, que não se vincule a ninguém. O PDT se desgastou muito por viver à reboque dos outros, principalmente no governo passado à reboque do PT. Então eu defendo a autonomia, a independência. E no âmbito nacional, a mesma coisa. Não tivemos candidato a presidente. Que sejam liberados os pedetistas.

Sul21 – Existe uma outra coisa que se discute em termos de reforma, em que o PDT nacionalmente é aliado do PT, mas que aqui lançou outra candidatura. O que o senhor acha desta diferença entre os estados e o âmbito nacional? Acha que deve continuar?

Lasier Martins – Foi uma condição que eu fiz para concorrer, que tivéssemos uma candidatura daqui por diante a todos os cargos importantes no Brasil. E aqui no RS, que tivéssemos liberação do diretório nacional. E com o trabalho meticuloso do Vieira na reunião do diretório nacional, pediu e levou. Então nós tivemos liberação no RS independe do PDT nacional.

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21
Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Sul21 –  Por que o senhor optou por começar a carreira política no cargo de senador e não nenhum outro?

Lasier Martins –  Por duas razões fundamentais: para influenciar na vida nacional tem que ser no parlamento nacional. E a Câmara Federal é muito pulverizada, são 513 deputados.

Sul21 – O senhor já começou a planejar a vida em Brasília?

Lasier Martins – Acho que não vou morar lá. Mas vou ficar o tempo todo necessário numa primeira fase. Só vou me transferir para Brasília se achar que é realmente necessário, mas isso vou avaliar com o tempo. O plano é ficar indo e voltando, eu gosto muito de Porto Alegre.

Sul21 –  O senhor estava falando (no telefone) que já conhece também as dependências do Congresso, que sabe como funciona…

Lasier Martins –  Sim, eu fiz (como repórter)  as Diretas Já, a morte do Tancredo, a cassação do impeachment do Collor. No impeachment do Collor fiquei 20 dias cobrindo lá pela Rádio Gaúcha.

Sul21 – Justamente o Collor se elegeu lá em Alagoas agora. Por que o senhor acha que esse tipo de coisa acontece, as pessoas esquecem?

Lasier Martins – As pessoas não estão preparadas. Tem muita gente que não acompanha nada, que nem sabe o que fizeram.Tem pouca gente que lê jornal, que acompanha os debates e televisão. Tem muita gente que não entende também. Nós somos 35 milhões de brasileiros analfabetos funcionais, que não sabem interpretar o que ouvem.

“Eu andei muito pelas vilas populares e pude sentir o quanto tem gente que sofre e que tem pouca instrução. Isso se reflete na votação”.

Sul21 –E aqui no Rio Grande do Sul o senhor não acredita que isso aconteça também? 

Lasier Martins –  De forma um pouco menor, aqui temos um nível um pouco melhor. Mas ainda sim. Agora eu andei muito pelas vilas populares e pude sentir o quanto tem gente que sofre e que tem pouca instrução. Isso se reflete na votação.

Sul21 – A forma de melhorar as condições de vida para estas pessoas também vai ser uma das suas bandeiras? Isso é uma coisa que o senhor já percebia, ou que veio com o tempo?

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21
Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Lasier Martins – Claro. Eu já sabia, mas agora eu mergulhei fundo. Veja, nós somos a sétima economia do mundo, mas com o IDH, índice de qualidade de vida medido pela ONU anualmente, nós estamos em 79. É um abismo. É um país rico de muita pobreza. Muita gente pobre, muita desigualdade. E isso tem que ser modificado lá de cima, através de políticas mais justas, menos desperdício do dinheiro, menos escândalos, menos rombos como este da Petrobrás, que é o maior da história do Brasil, por aí.

Sul21 –  Quando o senhor disse que tinha sido convidado antes para fazer parte da política, tinha sido pelo PDT também?

Lasier Martins – Não, fui convidado há 32 anos pelo Simon, que me levou até a casa dele, para ser do deputado estadual, na época pelo MDB. Depois, fui convidado pelo Zambiasi para entrar no PTB, fui convidado pelo Marchezan para entrar no PSDB, fui convidado pelo Celso Bernardi, para entrar no PP. Numa ocasião, fui convidado para entrar no PSB, mas agora não me lembro por quem, foi há mais tempo. Fui convidado pelo DEM. Fui muito convidado.

Sul21 – E como é a sua relação com o PDT, com o prefeito Fortunati, como você foi acolhido pelo partido? Será que a sua escolha pelo PDT causou alguma surpresa em outros partidos?

Lasier Martins – O Fortunati, num primeiro momento, foi o meu coordenador institucional, depois começou a faltar tempo para ele, mas esteve comigo o tempo todo. O Vieira foi um companheiro muito valoroso. E o partido me festejou muito por eu entrar lá. Acho que alguns (outros partidos) esperavam muito pela minha filiação. Mas teve dois motivos principais. Primeiro que foi o partido do meu pai. Meu pai foi um homem simples, trabalhador comum, muito trabalhista, muito fã do Brizola. E eu escolhi o PDT muito em homenagem póstuma ao meu pai, que eu acompanhei em comícios quando eu era pequeno. E segundo por que este é o partido da educação. É o princípio primeiro do programa partidário, está lá escrito: priorizar a escolarização das crianças e dos jovens.

Sul21 –  O senhor chegou a conhecer o Brizola?

Lasier Martins – Claro, entrevistei ele um sem-número de vezes. Há 12 anos atrás eu estive com ele e ele me convidou a me filiar ao partido e eu me filiei. Depois, no ano seguinte, tinha eleições no estado e como a empresa soube que era filiado, me chamou a me desfiliar por que eu ia mediar os debates no final do ano. Mas na presença do Fortunati, ele foi testemunha da minha filiação com o PDT acompanhado do Brizola.


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