Opinião
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24 de fevereiro de 2025
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09:33

A quebra de safra de soja e a MIP: uma estimativa preliminar (por Henrique Morrone)

Foto: Carina Venzo Cavalheiro
Foto: Carina Venzo Cavalheiro

Henrique Morrone (*)

As estiagens vêm assolando a economia gaúcha, impactando os resultados do setor agrícola e gerando desdobramentos negativos para o restante da economia. A seca atual tem gerado debates sobre seus impactos, com estimativas divergentes quanto à queda da produção de soja. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima uma queda de 6,1% na produção de soja devido à seca, enquanto a Associação dos Produtores de Soja (Aprosoja) aponta uma redução de 35% na produção do grão.

Diante dessa divergência, surge a pergunta: qual será o impacto da queda na produção de soja no valor adicionado bruto (VAB) da economia gaúcha? Para responder a essa questão, utilizaremos a Matriz de Insumo-Produto (MIP) do Estado de 2019. Supomos que a estrutura intersetorial de 2019 permaneceu relativamente constante entre 2019 e 2024, o que é uma suposição recorrente na literatura de insumo-produto.

A MIP é uma matriz quadrada que indica o consumo intermediário, a demanda final e o valor adicionado das atividades econômicas. Tradicionalmente, a MIP é divulgada por setores produtivos. Com ela, podemos simular os efeitos de aumentos de salários, exportações e oscilações cambiais na economia. No entanto, para simular os efeitos da queda da produção de soja, transformamos a matriz setorial de 52 setores em uma matriz de 117 produtos. Com isso, é possível aplicar um choque de redução na produção de soja e analisar seus desdobramentos na economia.

Neste estudo, adotaremos uma abordagem diferente da usual. Normalmente, choques de demanda são aplicados, e seus efeitos em termos de produção e valor adicionado são analisados. No entanto, neste caso, partiremos de uma redução no vetor de produção (com um cenário de queda de 35% na produção de soja) e procuraremos encontrar o vetor de demanda final que causaria essa redução na produção. Com o novo vetor de demanda, multiplicamos pela matriz inversa de Leontief para calcular a queda no vetor de produção setorial e no Produto Interno Bruto (PIB) da economia gaúcha.

Assumindo ceteris paribus (tudo o mais constante), os resultados preliminares encontrados para o evento mais extremo (uma queda de 35% na produção de soja) são os seguintes: o valor adicionado bruto total apresentará uma queda de 1,2%. Os setores mais afetados serão a Agricultura, Pecuária e Produção Florestal (pesca e aquicultura). A Agricultura sofrerá uma queda do valor adicionado bruto de 19,5%, enquanto a Pecuária apresentará uma redução de 3,6%.

Em resumo, os resultados preliminares das estimativas para o cenário extremo indicam efeitos negativos em termos de redução da produção e do valor adicionado na economia gaúcha. Contudo, novos estudos devem se aprofundar nessa questão, a fim de explorar outros desdobramentos na economia. Ademais, a economia pode sofrer outros choques, os quais poderiam tanto mitigar quanto impulsionar as perdas provenientes da seca. Deve-se também considerar o efeito da seca em outros produtos, para que os impactos na economia sejam compreendidos. Dada a persistência dos impactos negativos causados pelas estiagens, é urgente que se pense em estratégias pragmáticas para combater o problema e mitigar as perdas no setor agrícola.

(*) Professor de Economia UFRGS

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