
Além de Porto Alegre, mais quatro cidades gaúchas têm número suficiente de eleitores para que haja segundo turno nas eleições municipais deste ano: Canoas, Caxias do Sul, Pelotas e Santa Maria. O Sul21 conversou com o cientista político Rodrigo Stumpf Gonzalez, professor da UFRGS, para traçar um panorama da disputa pela prefeitura desses municípios.
“Um dos aspectos que afeta a maior parte desses municípios – com exceção de Pelotas – é que ambos os partidos com maior chance de vitória têm presença no governo federal. Há uma possibilidade menor da influência do presidente Lula nessas eleições. Essa tende a ser uma discussão local”, adianta o professor.
O atual prefeito Jairo Jorge (PSD) tenta emplacar seu terceiro mandato à frente de Canoas após ser eleito em 2008, 2012 e 2020. Seu último mandato foi turbulento, tendo sido afastado duas vezes do cargo. Jairo é investigado por irregularidades em contratos de serviços terceirizados em unidades de saúde que ultrapassam R$ 66 milhões. O prefeito e os demais investigados teriam cometido os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro entre 2020 e 2021.
Jairo foi afastado do cargo pela primeira vez em março de 2022. Um ano depois, como a Justiça Estadual não prorrogou o afastamento, ele reassumiu a gestão de Canoas. O Tribunal de Justiça decidiu por um novo afastamento em novembro de 2023, por entender que a competência para julgar o caso seria da Justiça Federal. Em abril de 2024, o STJ determinou o retorno de Jairo à prefeitura.
Além das acusações de corrupção, Jairo acumula em seu último mandato a histórica enchente de maio deste ano. Canoas foi um dos municípios mais atingidos pela água e muitos moradores relatam descaso por parte da prefeitura em meio à tragédia.
Mesmo assim, Jairo é um candidato forte no pleito deste ano. O professor Gonzalez explica que, em diversos municípios afetados fortemente pela enchente, a população não necessariamente vincula a tragédia à responsabilidade do prefeito.
“A catástrofe também foi muito usada pelos prefeitos para aparecer na mídia. Candidatos à reeleição tiveram uma espécie de pré-campanha na enchente, ao aparecer com colete da Defesa Civil ajudando a população Houve uma exposição de mídia que poderia se pensar como negativa, mas que muitas vezes resultou num reforço de imagem positiva”, afirma o cientista político.
As acusações contra Jairo também não parecem prejudicá-lo de forma intensa na campanha. “O candidato pode ser condenado, mas seus eleitores tradicionais vão achar que ele é inocente e está sendo perseguido. Cada vez menos as pessoas confiam que a justiça é neutra, e passam a atribuir as acusações a uma perseguição política”, explica Gonzalez.
Jornalista de formação, Jairo Jorge tem 61 anos e uma carreira política extensa. Foi o vereador mais votado de Canoas em 1988. Em 2004 e 2005, exerceu cargos executivos no Ministério da Educação do governo Lula. Assumiu a pró-reitoria da Ulbra em 2006, antes de se licenciar do cargo para concorrer a prefeito em 2008.
Em 2024, o atual prefeito concorre com outros cinco candidatos. Um deles é Airton Souza (PL), empresário de 57 anos que foi eleito vereador pela primeira vez em 2004. Venceu novamente a eleição em 2008, batendo o recorde de votos do município, em 2012 e em 2020.
Airton é alvo de uma ação do Ministério Público por improbidade administrativa. Enquanto ocupava o cargo de diretor da então Companhia de Indústrias Eietroquímicas (CIEL), subsidiária da Corsan, Airton e outro diretor da empresa teriam revogado um processo licitatório sem justificativa. Depois, teriam instaurado um novo certame, com o mesmo objeto, culminando na contratação de um concorrente desclassificado na primeira licitação, por valor superior ao da proposta vencedora no procedimento revogado.
Entre os candidatos de Canoas também está a ex-vice-prefeita Beth Colombo (Republicanos). A professora municipal aposentada tem 70 anos e já havia disputado a eleição para a prefeitura em 2016, mas foi derrotada no segundo turno.
Pelo partido Novo, o candidato é o empresário de 44 anos Odirlei Campiol, que disputa sua primeira eleição. Também concorrem a prefeito Marcio Freitas (PRD), atual vereador de 51 anos que já concorreu a deputado federal; e Rodrigo Cebola (PSOL), 43 anos, que já concorreu a vereador e deputado em diferentes oportunidades desde 2008, terminando as disputas como suplente.
O PSDB governa a cidade de Pelotas desde 2012, com Eduardo Leite sendo sucedido por sua antiga vice, Paula Mascarenhas. Este ano, quem concorre pelo partido é o comerciante Fernando Estima, 58 anos, que disputa sua primeira eleição.
Estima já foi superintendente do Porto de Rio Grande, nomeado em 2019. Também já ocupou o cargo de secretário de Desenvolvimento Econômico e Turismo de Pelotas, nos governos de Eduardo Leite e Paula Mascarenhas.
“No caso de Pelotas, a influência do governador acaba tendo um peso decisivo”, afirma Gonzalez. “O PSDB não é forte no interior, mas é forte em Pelotas. Leite não só foi prefeito, mas tendo se tornado governador, manteve uma forma de sucessão de candidatos que são identificados com ele. No passado, o PT teve certo peso na cidade”.
É o candidato do PT, Fernando Marroni, que lidera as intenções de voto em Pelotas de acordo com a última pesquisa divulgada. Ele vinha ocupando o cargo de diretor-presidente da Trensurb, que assumiu em julho de 2023.
O petista já foi prefeito da cidade, de 2001 a 2004, mas perdeu a reeleição no segundo turno para Bernardo de Souza (PPS). No pleito de 2012, foi novamente para o segundo turno, mas acabou sendo derrotado por Eduardo Leite (PSDB).
Marroni foi denunciado pelo Ministério Público por dispensa indevida de licitação enquanto esteve à frente de Pelotas. Ele teria firmado um termo de concessão de uso de bem público para permitir a exploração de uma pedreira por uma cooperativa de cortadores. O ex-prefeito foi absolvido da acusação pelo STF. A vida política de Marroni também inclui o cargo de deputado federal por quatro mandatos, entre 1999 e 2018, e de deputado estadual entre 2019 e 2022.
O candidato mais experiente de Pelotas é Irajá Rodrigues (MDB). Aos 88 anos, ele já ocupou o cargo de prefeito por dois mandatos, de 1977 a 1982 e de 1993 a 1996. Também foi deputado federal de 1983 a 1986 e foi um dos líderes do PMDB na Assembleia Nacional Constituinte.
Irajá não passou inócuo pela longa trajetória política. Em 1998, foi alvo de uma denúncia do Ministério Público por adiantar o pagamento de fornecedores de merenda escolar sem tomar garantias da entrega das mercadorias. As empresas teriam deixado de fornecer parte do produto, levando a um prejuízo de R$ 129,6 mil. Irajá foi condenado por improbidade administrativa em 2006, mas teve a condenação anulada em 2010.
Marciano Perondi (PL), empresário de 41 anos, também concorre a prefeito de Pelotas em sua primeira eleição. Ele tem envolvimento no acidente de trânsito que resultou na morte de um ciclista em julho deste ano. Perondi conduzia o carro Land Rover Discovery que atingiu o ciclista. Segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), o então pré-candidato aguardou a chegada de uma equipe da concessionária que administra a rodovia onde ocorreu o acidente, mas não esperou a viatura da corporação e seguiu viagem. A polícia investiga o caso.
Outro candidato em Pelotas é Reginaldo Bacci (PDT). Aos 63 anos, Bacci é advogado, economista e presidente municipal do PDT de Pelotas. Ele já foi candidato a vice-prefeito do município pelo PC do B em 2012.
Bacci também tentou a eleição para deputado federal pelo partido Rede em 2018, mas teve a candidatura impugnada. O candidato estava inelegível por ter sido demitido do serviço público em decorrência de processo administrativo menos de oito anos antes. Em 2014, Bacci foi demitido do cargo de Analista Tributário da Receita Federal por ato de improbidade.
O candidato do PCO em Pelotas é João Bourscheid. Ele tem 58 anos, é professor de Ensino Médio e este é o primeiro pleito em que se candidata.
Outro município onde o atual prefeito tenta a reeleição é Caxias do Sul, na Serra. Adiló Didomenico (PSDB) começou sua militância política ainda como estudante, em 1974. Ajudou na fundação do PTB em Caxias e presidiu o partido em três oportunidades. Foi eleito vereador pela primeira vez em 2012, cargo do qual se licenciou no ano seguinte para assumir como secretário municipal de Obras e Serviços. Elegeu-se novamente para a Câmara em 2016. Em 2020, mudou do PTB para o PSDB.
Adiló chegou a ser alvo de um pedido de cassação que foi rejeitado por unanimidade em janeiro deste ano. A denúncia havia sido feita pelo ex-vice-prefeito Ricardo Fabris (PSD), que apontava supostas irregularidades no contrato entre a prefeitura e o Instituto de Desenvolvimento, Ensino e Assistência à Saúde (Ideas).
“Nessa eleição, os incumbentes têm tido certo sucesso. É o caso de Porto Alegre e outras capitais. Candidatos que já estão no cargo têm tido certa vantagem no processo”, destaca Gonzalez. No entanto, para o cientista político, a reeleição de Adiló não é dada: pode haver uma disputa acirrada entre o atual prefeito e a candidata Denise Pessôa (PT).
“Caxias é um lugar onde o PT historicamente teve força, não só na candidatura para prefeitura, como também de deputados na região. É o que coloca em dúvida a reeleição, pois existe possibilidade real de que a candidata do PT possa ser vitoriosa”, afirma Gonzalez.
A petista Denise Pessôa tem 41 anos e ocupa o cargo de deputada federal. Sua carreira política remonta a 2009, quando foi a mulher mais jovem eleita em Caxias do Sul para o cargo de vereadora. Teve quatro mandatos e deixou a Câmara em 2022, para assumir como deputada no ano seguinte.
Denise é coautora do Projeto de Lei 03/2023, que cria o “Protocolo Não é Não”. O texto trata do atendimento à mulher vítima de violência sexual ou assédio em discotecas ou estabelecimentos noturnos, eventos festivos, bares, restaurantes ou qualquer outro estabelecimento de grande circulação de pessoas.
O vereador Felipe Gremelmaier (MDB), 45 anos, também disputa a prefeitura de Caxias. Foi eleito vereador pela primeira vez em 2008, mas licenciou-se da Câmara logo após tomar posse para assumir a Secretaria Municipal do Esporte e Lazer. Felipe foi eleito novamente em 2012, em 2016 e em 2020. Ele é o candidato apoiado pelo ex-governador José Ivo Sartori.
O empresário Maurício Scalco, 49 anos, concorre a prefeito pelo PL. Ele ocupava o cargo de vereador, eleito em 2020 pelo partido Novo. Em novembro de 2023, no entanto, filiou-se ao PL quatro meses antes da chamada “janela partidária”, prazo de 30 dias para que parlamentares possam trocar de partido sem perder o mandato.
O atual vice-prefeito de Santa Maria tenta assumir a gestão do município após dois mandatos de Jorge Pozzobom (PSDB). O candidato Rodrigo Decimo (PSDB) é empresário, tem 56 anos e ingressou na política nas eleições municipais de 2020.
“O PSDB tem uma grande força histórica em Santa Maria, e uma aliança de centro-direita sempre é uma candidatura forte”, avalia Gonzalez.
Para o especialista, no entanto, o Partido dos Trabalhadores também tem chance de vencer esta eleição na cidade. “O PT não tem tido sucesso nas eleições majoritárias em Santa Maria, mas sempre teve boa votação para deputado federal na região. O que talvez não tenha conseguido é um padrão de aliança mais ampla para conquistar o voto centrista. Valdeci tem um perfil um pouco mais centrista, então tem uma chance razoável”.
O candidato do PT é Valdeci Oliveira, ex-metalúrgico de 67 anos que lidera as intenções de voto segundo uma pesquisa divulgada nesta quinta-feira (3). Ele ocupa o cargo de deputado estadual desde 2011, tendo presidido a Assembleia Legislativa em 2022. Valdeci assumiu o mandato de deputado federal em 1997, após ter ficado como suplente, e foi eleito novamente em 1998. Já foi vereador e depois prefeito em Santa Maria, eleito para gerir o município em 2000 e reeleito em 2004.
Em 2008, Valdeci foi alvo de uma ação civil pública referente a um contrato com dispensa de licitação feito em 2002, quando era prefeito de Santa Maria. Ele foi condenado pelo Tribunal de Justiça do RS em 2019 a ter os direitos políticos suspensos, mas a punição não entrou em vigor porque ele recorreu a instâncias superiores.
A advogada de 46 anos Roberta Leitão é a candidata do PL em Santa Maria. Ela aparece em segundo lugar nas intenções de voto registradas na última pesquisa eleitoral feita no município. Eleita vereadora na cidade em 2020, Roberta é autora de um projeto de lei que obriga as unidades hospitalares da cidade que realizam o aborto legal a fixarem cartazes “educativos” em seus estabelecimentos. O material deveria prever danos físicos e psicológicos que o aborto poderia causar, além de explicação, através de fotos ilustrativas, do que ocorre com o nascituro após o procedimento. O projeto foi vetado.
Candidato pelo PRD, Dr. Moacir é cirurgião dentista e tem 70 anos. Ele já pleiteou os cargos de deputado estadual, deputado estadual e vereador, entre 2012 e 2022. Exerceu a função de delegado regional da saúde na Secretaria Estadual da Saúde.
Professor Burmann (PDT) já foi reitor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) entre 2013 e 2020 e, recentemente, atuava como Diretor-Geral da Secretaria de Educação do Estado. Tem 66 anos e já se candidatou a deputado federal pelo PDT em 2022.
Peppe Riesgo (Novo) é o mais jovem candidato à Prefeitura de Santa Maria, com 29 anos. Atualmente é chefe de gabinete do deputado federal Marcel van Hattem e já foi deputado estadual eleito em 2018.
Alidio da Luz (PSOL) tem 30 anos, é psicólogo e disputa sua primeira eleição.