Eleições 2024
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21 de outubro de 2024
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15:25

Caxias do Sul: saúde e urbanização pautam disputa inédita de direita no segundo turno

Por
Bettina Gehm
bettinagehm@sul21.com.br
Scalco (esq) e Adiló (dir). Foto: Divulgação
Scalco (esq) e Adiló (dir). Foto: Divulgação

O segundo turno da eleição municipal de Caxias do Sul vai ser disputado entre dois candidatos de direita pela primeira vez desde 1992. Como resultado de um primeiro turno onde a saúde pública e a urbanização estiveram no centro do debate, Maurício Scalco (PL) teve 38,04% dos votos, e o atual prefeito Adiló Didomenico (PSDB) ficou com 27,50%.

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“A maior parte dos municípios têm visto uma disputa mais acirrada entre direita e extrema direita, identificada com uma pauta conservadora”, afirma o cientista político e professor João Ignacio Pires Lucas. “A candidatura da coligação com o PT, que tinha Denise Pessôa (PT) e o ex-prefeito Alceu Barbosa Velho (PDT), ficou de fora do segundo turno numa disputa acirrada contra Adiló. Não foi novidade: em 2016, o já ex-prefeito Pepe Vargas (PT) ficou de fora do segundo por poucos votos a menos que Daniel Guerra (Republicanos)”.

A novidade, por outro lado, é que a frente de esquerda foi ampliada para o PDT pela primeira vez. Vereadora eleita pelo PT, Rose Frigeri destaca que a esquerda cresceu na Câmara, apesar do segundo turno configurar uma dobradinha da direita. “Reelegemos os três vereadores do PT e um a mais o PCdoB. Mas, tanto na Câmara quanto na cidade, essas forças de direita acabaram crescendo. É uma questão do País inteiro refletida na nossa cidade, que já é um tanto conservadora”, afirma.

Segundo o professor, Caxias do Sul é um município que se aproxima das tendências verificadas no pleito estadual, comparando o cenário à reeleição de Eduardo Leite (PSDB) em 2022. “A ‘não-ida’ ida de um voto de esquerda para o segundo turno fez com que Leite ultrapassasse o primeiro colocado no primeiro turno. Houve uma votação relativamente integral dos eleitores de esquerda no Leite. Em 2024, há possibilidade de que o candidato do PL fique na faixa dos 30% e Adiló, numa visão mais moderada e de um partido que não tem esse estigma tão conservador, faça mais votos. Mas é desafiador para ambas as candidaturas, que precisam ampliar o discurso e as propostas para furar a bolha conservadora”.

Os candidatos agora disputam pelos votos angariados por Denise Pessôa e Felipe Gremelmaier no primeiro turno, uma somatória de 34,5% do eleitorado caxiense, fora a abstenção de 25,13%. O PT orientou voto em Adiló para “derrotar a extrema-direita” no segundo turno. O MDB, pelo qual concorreu o candidato Felipe Gremelmaier, também declarou apoio à reeleição do atual prefeito. O PDT optou pela neutralidade, mas o presidente do partido em Caxias, Rafael Bueno, declarou voto em Scalco.

A saúde pública é um dos temas centrais nesta eleição em Caxias do Sul. Para a vereadora Rose, o problema é que os serviços de saúde na cidade estão voltados para média e alta complexidade. “As UPAs estão lotadas, os hospitais não têm leito. Tem gente há três anos na fila para fazer um exame”, relata. “Não se tem uma visão para a atenção básica. Se houvesse melhor atendimento nas UBS, com encaminhamentos adequados, a pessoa não precisaria chegar na UPA tão mal e muito menos chegar ao hospital”.

Durante o último mandato, foi instaurada uma CPI na Câmara Municipal para investigar irregularidades na saúde. Entre elas, o registro irregular de horas no ponto de médicos da UPA Central, resultando em pagamentos indevidos no valor de R$ 1,3 milhão ao Instituto Nacional de Pesquisa e Gestão em Saúde (InSaúde).

A investigação de 160 dias analisou ainda a ausência de procedimento licitatório para gestão de outra UPA, indicadores de saúde divergentes dos parâmetros estabelecidos pelo Ministério da Saúde, possível conflito de interesses no fornecimento de materiais para a Fundação Universidade de Caxias do Sul (FUCS) e outras irregularidades. 

Candidato à reeleição, Adiló elenca a infraestrutura e a zeladoria da cidade como pautas centrais para Caxias do Sul, reconhecendo que há “muito trabalho a fazer” nesse aspecto. “Desde maio do ano passado, tivemos longos períodos chuvosos e também muitas obras na cidade. Tivemos enchente em setembro, em novembro, em janeiro e em maio deste ano. Isso agravou muito a situação das vias. Perdemos a usina de asfalto da Codeca, soterrada até hoje”, afirma. 

Já o opositor, Scalco, destaca o déficit de aproximadamente 4 mil vagas na educação infantil. “Quanto à infraestrutura, é essencial elevar o padrão de Caxias do Sul. Precisamos construir viadutos, elevadas e túneis para aliviar o trânsito caótico em pontos críticos. É fundamental implementar o Plano de Mobilidade Urbana, com o objetivo de melhorar o transporte público da cidade”, diz.

O professor João Ignacio também visualiza desafios na urbanização de Caxias do Sul. “Existem muitas áreas que necessitam de regularização fundiária, de melhor qualidade de transporte, saneamento, de tudo”, afirma. O cientista político pontua que a cidade é alvo de migrações internas e tem registrado crescimento na população. “De acordo com o último Censo, foi o município que mais cresceu em números absolutos no RS. A periferia é sempre muito demandada”, diz.

Durante o segundo turno, o candidato à reeleição tentou “mostrar como encontrou a cidade e como ela está hoje”. De acordo com o prefeito Adiló, Caxias do Sul estava num momento financeiramente difícil, com uma dívida de R$ 230 milhões. “Recuperamos a cidade financeiramente e, agora, estamos mostrando o que mais pretendemos fazer”, afirma. 

Do outro lado, Scalco buscou evidenciar uma comparação entre as duas candidaturas. “De um lado, um governo liderado pelo mesmo grupo político que administra a cidade há quase 20 anos. Do outro, uma candidatura que se propõe a romper esse ciclo”, afirma. “Nossa proposta abrange a desburocratização dos processos internos e a revisão de diversas leis e decretos que limitam o crescimento da cidade, como o Plano Diretor e a Lei das Águas”, garante.


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