Eleições 2022
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29 de outubro de 2022
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00:39

No último debate, Bolsonaro repete ataques e mentiras. Lula lamenta nível do adversário

Por
Sul 21
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Lula e Bolsonaro realizaram último debate do segundo turno na Rede Globo (Reprodução)
Lula e Bolsonaro realizaram último debate do segundo turno na Rede Globo (Reprodução)

O último debate entre Lula e Bolsonaro, realizado na noite desta sexta-feira (28), na Rede Globo, não trouxe grandes novidades. Atrás nas pesquisas, Bolsonaro voltou a adotar um tom agressivo contra Lula, chamando-o de “mentiroso” e “ladrão” o tempo todo praticamente e repetindo afirmações e números sem citar fontes. A estratégia de Lula oscilou entre tentar fugir das provocações diretas de Bolsonaro e lamentar o nível de debate proposto pelo atual presidente da República.

Com um número de indecisos muito pequeno, as primeiras análises após o debate apontaram que o mesmo não deve ter produzido alterações significativas nas intenções de voto. Pesquisa qualitativa do Atlas Político, realizada junto a eleitores indecisos, apontaram o seguinte resultado após o quarto bloco: Lula (PT): 51,5% Bolsonaro (PL): 33,7% Não sei: 14,9%

Segundo os principais institutos de pesquisa que acompanham o segundo turno das eleições, Lula lidera com uma diferença média de seis pontos sobre Bolsonaro considerando os votos válidos. Em termos absolutos, isso significa cerca de 8 milhões de votos.

No primeiro bloco, Bolsonaro começou atacando Lula, chamando-o de “mentiroso”, e anunciou que, em 2023, vai elevar o salário mínimo para R$ 1.400 – embora não exista nenhuma previsão orçamentária para isso. O ministro Paulo Guedes, da Economia, já declarou que, num segundo mandato, pretende vincular os reajustes do mínimo e das aposentadorias à inflação futura, e não aos índices oficiais.

Lula lembrou que o salário mínimo, pela primeira vez na história, é menor do que quando o atual presidente iniciou seu mandato. “A verdade nua e crua é que o salário mínimo é menor que quando você entrou. Eu aumentei o mínimo em 74%. Ele apenas concedeu inflação e, às vezes, até menos que isso. Agora é fácil prometer. Mas por que durante quatro anos não aumentou [acima da inflação]?”, questionou o ex-presidente.

Agressivo, Bolsonaro voltou a chamar Lula de mentiroso. “O programa de TV do PT propagou mentiras. O senhor é um mentiroso. Nunca falei isso [que iria limitar os aumentos do salário mínimo]. Ele fala isso para influenciar as pessoas mais humildes, especialmente de em determinadas regiões do país. É um mentiroso. Não vai responder”, atacou. Lula classificou Bolsonaro como “descompensado”.

O presidente também justificou o mau desempenho da economia pela pandemia de Covid-19, mas argumentou que “fiz a minha parte”. Segundo ele, o auxílio emergencial concedido pelo governo federal corresponde a 15 anos do Bolsa Família. “Seus governadores estimulavam as pessoas a ficar em casa. Lula, não vai responder? O senhor não vê o programa eleitoral? Não sabe de nada? Fale sim ou não, Lula”, provocou Bolsonaro.

O ex-presidente Lula respondeu que o ex-presidente mentiu 6.498 vezes durante seu mandato – a informação foi atribuída a uma revista, que não foi citada na declaração. A raiva de Bolsonaro respingou até no apresentador do debate, Willian Bonner. “Acho que o [Willian] Bonner vai ser indicado por um impossível governo teu para ser ministro do STF. Você foi descondenado por um amigo do Supremo, que achava que deveria ser julgado em Brasília e não em Curitiba. Você é um bandido, Lula”, disse Bolsonaro.

Segundo bloco: volta da fome, Reforma da Previdência e “agenda de costumes”

No segundo bloco, Lula questionou Bolsonaro sobre o retorno da fome ao país e sobre as razões pelas quais aumentou o nível de pobreza da população. Em sua resposta, Bolsonaro criticou matéria da Folha de S.Paulo sobre o tema, dizendo que a fonte de seus dados era o IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas). E voltou a criticar a adoção do distanciamento social durante a pandemia, atribuindo a essa medida o aumento da pobreza e a volta da fome. “Teus governadores obrigaram o povo a ficar em casa”, disse o atual presidente a Lula.

Lula insistiu no questionamento sobre a existência de cerca de 30 milhões de brasileiros hoje passando fome, sem ter o que comer. “O povo está na fila do osso, comendo carcaça de frango”, exemplificou. Ao contrário do que disse recentemente, quando negou que existissem pessoas pedindo comida no país, Bolsonaro admitiu que “tem gente passando fome”, mas destacou os R$ 600,00 do Auxílio Brasil como medida para enfrentar esse problema. “Botamos essas pessoas no Auxílio Brasil”, afirmou.

O ex-presidente também questionou Bolsonaro sobre os impactos da Reforma da Previdência para aposentados e pensionistas. “Se o Guedes não te falou, liga para ele no intervalo e pergunta”, provocou Lula. “Quem falou de (acabar com) 13º e férias foi o teu Deus, Paulo Guedes. Entra aí no Google e vê o que Guedes falou”, emendou o candidato do PT, ironizando a costumeira recomendação de Bolsonaro, “dá um Google aí”…

Lula replicou questionando por que o tempo de concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) passou de 30 dias para 416 dias, e o de concessão de auxílio por acidente de trabalho passou de 25 para 212 dias. “É sempre em cima do povo pobre, do povo trabalhador”, acrescentou. Bolsonaro questionou esses números e afirmou que há um clima de prosperidade no país. “Prosperidade para quem? – questionou Lula. “Só se for para a tua família que comprou 51 imóveis com 26 milhões de reais”.

Bolsonaro procurou fugir do tema da pobreza e da Previdência e passou a questionar Lula sobre o “respeito à Constituição”, citando como exemplos de infração ao direito de propriedade as ações do MST e do MTST, “invadindo terras produtivas”. Lula ironizou o “respeito à Constituição” de Bolsonaro, lembrando que ele “passa o tempo todo ameaçando os ministros da Suprema Corte” e assinalou que, no seu governo, foram desapropriados 51 milhões de hectares de terras improdutivas para pequenos agricultores que são responsáveis hoje por cerca de 70% do alimento produzido no Brasil.

O candidato do PL terminou sua participação neste bloco esgrimindo a sua tradicional “agenda de costumes”, acusando Lula de ser “abortista”, “defensor da liberação das drogas” e da “ideologia de gênero”. Lula repudiou as acusações do adversário, afirmando que, no próximo bloco, passaria a falar de propostas para o futuro do país.

Terceiro bloco: saúde e pandemia em debate

O tema da saúde dominou o terceiro bloco. Além dos médicos cubanos do Mais Médicos, citados obsessivamente por Bolsonaro, que acusou Lula de transferir bilhões de reais para Cuba, o tema do aborto provocou farpas entre os dois candidatos.

Lula relembrou uma fala de Bolsonaro em que ele disse ter considerado o aborto de um dos filhos – a declaração foi dada na época em que o presidente era deputado federal, em 2000. “O candidato se lembra desse discurso? Eu vou ver um trecho aqui. Não adianta uma multidão de brasileiros subnutridos sem condições de servir a seu país. Conclui o teu deputado que oferece que seja distribuído pílula de aborto para a sociedade brasileira em 1992, quando era deputado. Falou isso ou não?”, questionou Lula.

Bolsonaro sentiu o golpe e chamou Lula de “abortista”, além de dizer que a pílula do dia seguinte é considerada um método contraceptivo e não uma interrupção da gravidez. “Uma declaração de 30 anos atrás? Não confunda pílula do dia seguinte com Cytotec”, afirmou Bolsonaro. A pílula é usada para o tratamento de úlceras digestivas e, devido a seus efeitos colaterais, foi adaptado para aborto farmacológico.

Ao chamar Lula de abortista, Bolsonaro lembrou indiretamente do caso Miriam Cordeiro, mãe da filha mais velha do petista, Lurian. “Não vou trazer aqui o caso da primeira mulher dele por que… Eu quero respeitar essas pessoas, respeitar a filha que nasceu naquele momento”, disse. Em 1989, Miriam deu uma entrevista na TV afirmando que Lula teria oferecido dinheiro para ela abortar. Lula reafirmou ser contra o aborto, assim como “as minhas mulheres eram contra”. Mas confirmou que considera o tema como estratégico para a saúde pública.

Antes disso, Lula havia fustigado Bolsonaro sobre a pandemia de Covid-19 – embora tenha apenas 3% da população mundial, o Brasil concentrou cerca de 10% das mortes pela doença. E cobrou do presidente a informação sobre sua caderneta de vacinação. “Por que esconder o cartão da vacina, Bolsonaro? Por que cortar 33% dos recursos da Farmácia Popular?”

O presidente justificou que o Orçamento não é prerrogativa do Executivo, mas uma negociação com o Legislativo. Além disso, disse que o governo comprou mais de 500 milhões de doses e mentiu ao afirmar que comprou as primeiras doses um dia após a Anvisa aprovar a vacina. “Se você tomou a vacina, agradeça a mim”, acrescentou.

Lula retrucou dizendo que o governo atrasou a compra de vacinas em pelo menos 45 dias. E que quando o país foi comprar doses, vários países já haviam comprado. Também mencionou que o Comitê Científico foi criado por Bolsonaro “para negar a pandemia”. Lula disse que o objetivo de Bolsonaro era “vender cloroquina”.

“Se Bolsonaro tivesse ouvido os governadores do nordeste teríamos 200 mil mortes a menos. Metade das 700 mil mortes, se houvesse agido corretamente. O presidente não foi a um hospital, não fez um gesto em favor das vítimas. Mas foi no enterro da rainha da Inglaterra, para mostrar que era bonzinho”, ironizou Lula.

Também o tema da compra de dezenas de milhares de doses de viagra superfaturados pelas Forças Armadas entrou em pauta. “Sabe o que você fez a mais? Que você poderia explicar para o povo? 35 mil caixas de Viagra para dar para as Forças Armadas. Explica por quê? Se o povo não tem sequer fraldão geriátrico para as pessoas mais velhas, de idade, que você retirou”, declarou Lula no debate. Bolsonaro retrucou: “Já expliquei. O Viagra é usado para tratamento de próstata. Você usa Viagra?”, perguntou o candidato à reeleição.

Quarto bloco: criação de empregos e crise climática

No quarto bloco, Bolsonaro fez um auto-elogio da suposta criação de empregos em seu governo, “mesmo com a pandemia”. “Mesmo com a pandemia, o Brasil criou empregos em 2020 e 2021”, disse o atual presidente sem citar nenhum número e nenhuma fonte que sustentasse sua afirmação. “Este ano, estamos criando 250 mil empregos por mês”, acrescentou, mais uma vez sem citar a fonte de seus números.

Lula questionou as afirmações de Bolsonaro, assinalando que o atual governo mudou os critérios de aferição da criação de empregos, colocando MEI’s, trabalhos informais e temporários como empregos criados. “No meu tempo, era emprego com carteira assinada”, afirmou. Logo em seguida, Lula anunciou algumas de suas primeiras iniciativas, caso eleito no próximo domingo. “Nós vamos visitar vários países e fazer reuniões com os governadores, pedindo para eles apontar as obras prioritárias para seus estados”. Além disso, o candidato do PT anunciou que pretende implementar a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até 5 mil reais/mês e políticas de apoio a pequenos e médios empreendedores.

Bolsonaro respondeu dizendo que o Brasil está “pronto para decolar”, que o país “vai crescer mais do que a China” e vai construir um grande parque eólico na costa do Nordeste que “vai gerar 50 vezes mais energia que Itaipú”.

Na sua vez de perguntar, Lula questionou Bolsonaro sobre o desmatamento dos biomas brasileiros, em especial da Amazônia, e sobre o impacto disso na crise climática. Bolsonaro repetiu o que já havia feito em debates anteriores, dizendo que seu governo desmatou menos do que o governo Lula, afirmação que já foi amplamente desmentida pelos meios de comunicação do país. “O clima não é só a Amazônia, tem a ver também com outras questões”, arriscou Bolsonaro sem mencionar que questões seriam estas. “O Brasil está do mesmo modo que estava quando Pedro Álvares Cabral chegou aqui”, acrescentou o candidato do PL. O candidato do PT prometeu que, caso eleito, vai acabar com as queimadas, com a invasão de terras indígenas e com o garimpo em terras indígenas. Bolsonaro disse que seus dados na questão ambiental seriam do Inpe (Instituto de Pesquisas Espaciais), na questão ambiental, mas seus números já foram desmentidos por técnicos do órgão.

Considerações finais

Em sua última intervenção, Lula disse que pretende restabelecer a harmonia no Brasil. Ele lembrou que, no seu governo, o MEC era o maior vendedor de livros do mundo, que a Cultura e a Educação funcionavam e o salário mínimo era reajustado acima da inflação. “Nós vamos reconstruir esse país e o povo vai voltar a comer bem”, prometeu.

Já Bolsonaro, usou seu último espaço de tempo para falar de Deus, pátria e família. Agradeceu a Deus pela “segunda vida” que recebeu em Juiz de Fora (no episódio da facada) e pela oportunidade de governar o país. “Se Deus quiser vou cumprir mais um mandato de deputado federal”, acrescentou, logo corrigindo o cargo…”mais um mandato de presidente da república”.


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