Meio Ambiente
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29 de julho de 2024
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16:53

Com 4 anos de atraso, governo estadual lança programa de Pagamento por Serviços Ambientais

Por
Luciano Velleda
lucianovelleda@sul21.com.br
O programa selecionará 40 proprietários de Reservas Particulares do Patrimônio Natural. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil
O programa selecionará 40 proprietários de Reservas Particulares do Patrimônio Natural. Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

O governo do Estado lançou, nesta segunda-feira (29), o primeiro edital do Programa Estadual de Pagamento por Serviços Ambientais. Considerado pelo governador Eduardo Leite (PSDB) como um dos “avanços” das polêmicas mudanças do novo Código Estadual do Meio Ambiente, o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) é um instrumento econômico que busca recompensar quem, em virtude de suas práticas de conservação, proteção, manejo e recuperação de ecossistemas, mantém ou incrementa o fornecimento de um serviço ecossistêmico (benefícios providos pela natureza). 

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Ao ser criticado por sua política ambiental após a enchente que varreu o Rio Grande do Sul em maio deste ano, o governador se referiu diversas vezes ao Pagamento por Serviços Ambientais como um avanço da sua gestão. Porém, o lançamento do edital hoje ocorreu quase quatro anos e meio depois da sanção do novo Código Estadual do Meio Ambiente. Neste período, o governo estadual não pagou nenhum centavo pelo instrumento criado.

Agora, o edital finalmente dá início ao Programa Estadual de Pagamentos por Serviços Ambientais para Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN), com previsão orçamentária de R$ 3 milhões. O programa selecionará 40 proprietários de Reservas Particulares do Patrimônio Natural, que deverão receber apoio financeiro e técnico para preservar a biodiversidade e melhorar os serviços ecossistêmicos de áreas naturais no estado. 

As RPPNs são unidades de conservação criadas em propriedades privadas a partir da manifestação voluntária do proprietário. Ao estabelecer uma RPPN, o proprietário assume compromissos ambientais para além das obrigações já previstas na legislação. Atualmente, existem 43 reservas deste tipo no RS.

O edital visa também apoiar iniciativas de conservação existentes e incentivar a criação de novas unidades de conservação. Os proprietários interessados deverão se cadastrar eletronicamente em até 60 dias após a publicação do edital no Diário Oficial do Estado. A inscrição exige a apresentação de documentação, incluindo comprovação de regularidade fiscal e ambiental, além do Projeto Individual detalhado. A lista de documentos necessários e o cronograma podem ser conferidos no site do Proclima 2050.

“O Pagamento por Serviços Ambientais é uma ferramenta para apoiar a proteção ao meio ambiente, que cria as condições para a proteção integral das unidades de conservação de domínio privado. O Estado apoiará os proprietários dessas reservas a fim de garantir sua preservação contínua”, explicou Marjorie Kauffmann, secretária estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura. 

Segundo o governo estadual, a seleção dos projetos será baseada na análise documental e revisão técnica das Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN), de modo a conferir as informações prestadas e garantir o cumprimento dos critérios de proteção e conservação. Os proprietários aprovados assinarão um Termo de Compromisso com o Estado que formaliza o compromisso de manter e melhorar os serviços ambientais nas suas áreas. A lista final das RPPN selecionadas será divulgada nos canais oficiais da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema).

Com o lançamento do edital, será introduzido o Cadastro Estadual de Pagamento por Serviços Ambientais (Cepsa), um formulário on-line com sete seções, acompanhado de um manual explicativo para monitorar a implementação e divulgação das novas propostas de Pagamento por Serviços Ambientais.

Solenidade de lançamento ocorreu no Palácio Piratini. Foto: Maurício Tonetto/Secom

Na visão da Associação dos Servidores da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura (Assema) e da Associação dos Funcionários da Fundação Zoobotânica FZB (AFFZB), o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) é, de fato, uma importante ferramenta de conservação que poderá ser grande aliada diante dos urgentes desafios ambientais, principalmente no atual cenário de desastres climáticos e redução da cobertura de vegetação nativa no Rio Grande do Sul.

Entretanto, a entidade defende a necessidade de haver mais avanços, muito além do que o governo estadual está anunciando para este ano, em busca de direcionar prioritariamente recursos para áreas e grupos que necessitam de maior apoio do poder público, como a conservação dos campos nativos do Bioma Pampa, os territórios das comunidades tradicionais, Áreas de Preservação Permanente, entre outras ações para a proteção dos efeitos de eventos climáticos extremos.

“Podemos usar exemplos de outros estados que já realizam a cobrança pelo uso d’água e direcionam seus recursos para ações ambientais, entre elas o pagamento de serviços ambientais. Infelizmente a cobrança pelo uso d’água, embora prevista há 30 anos, nunca avançou no nosso estado”, lamentou Pablo Pereira, presidente da Associação dos Servidores da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Urbanismo (Assema), em recente entrevista ao Sul21.

Na ocasião, ele destacou que o pagamento por serviços ambientais é novidade no âmbito do governo estadual gaúcho, mas outros estados, como Paraná, já implementaram a ação, além de cidades do RS, como Vera Cruz, Venâncio Aires e Santa Cruz.

O presidente da Assema enfatiza que o governo estadual precisa agir em outras frentes de preservação ambiental. Ele explica que experiências em outros locais mostram que onde a análise do Cadastro Ambiental Rural e a implementação do Programa de Regularização Ambiental está funcionando, há também maior aproximação e sucesso do Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) junto aos produtores rurais. Nestes casos, o PSA funciona como incentivo à recuperação ambiental.

“O início da análise do Cadastro Ambiental Rural e a implementação do Programa de Regularização Ambiental no Rio Grande do Sul, além promover benefícios previstos em Lei a quem mais preservou, como as Cotas de Reserva Ambiental, também ajudaria a melhor dialogar com os produtores rurais e até mesmo planejar estratégias em que o PSA e outras formas de incentivos pudessem ajudar na recuperação de ambientes e na regularização ambiental dos imóveis rurais”, explica.

No RS, o Cadastro Ambiental Rural (CAR) está paralisado devido a uma disputa jurídica entre o governo estadual e entidades ambientalistas. Uma decisão do governo de José Ivo Sartori (MDB), depois inserida no novo Código Estadual do Meio Ambiente, define como “área rural consolidada por supressão de vegetação nativa” campos usados para atividades pastoris (criação de gado, por exemplo). Tal permissão faz com que muitas propriedades rurais fiquem desobrigadas de cumprir a exigência de 20% de Reserva Legal, estipulada na Lei de Proteção da Vegetação Nativa, de 2012.

O imbróglio jurídico, entretanto, se refere apenas ao Bioma Pampa e, por isso, ambientalistas criticam o governo Leite por não aplicar o Cadastro Ambiental Rural nas propriedades localizadas no Bioma Mata Atlântica.


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