
A polêmica proposta do novo Plano Diretor de Torres chegou à esfera judicial. No último dia 3 de agosto, o Instituto Curicaca ingressou com denúncia no Ministério Público Federal (MPF) alegando que os planos da prefeitura da cidade litorânea são conflitantes com a legislação ambiental sobre áreas, ambientes e espécies de competência do órgão federal.
Leia mais:
‘Torres está a um passo de perder sua beleza característica’
No pedido de abertura de inquérito civil, entre os aspectos apontados como em conflito com a legislação ambiental estão a proteção e recuperação de ambientes da Orla Marinha, como campos de dunas, sangradouros e banhados, e sobre a proteção e recuperação das Áreas de Preservação Permanente (APP) do Rio Mampituba.
O Instituto Curicaca, que se define como atuante na conservação da natureza e na promoção do ecodesenvolvimento, também aponta na denúncia a existência de “conflito com as orientações de uso e ocupação do solo dadas pela Reserva da Biosfera da Mata Atlântica e sobre as funções de manutenção e recuperação da conectividade definidas pelos Microcorredores Ecológicos de Itapeva, reconhecidos como importante instrumento pelos MP Federal e Estadual”.
A denúncia foi apresentada ao procurador da República André Casagrande Raupp, na sede regional do MPF em Capão da Canoa. No documento, a entidade ambientalista afirma que a proposta do novo Plano Diretor de Torres prevê adensamento em vários balneários localizados ao Sul do município sem, entretanto, considerar a capacidade de tratamento de efluentes cloacais, o que apresentaria “alto potencial de poluição de águas marinhas”.
Por fim, o Curicaca pede que o MPF também avalie a existência de conflito do novo Plano Diretor com as normas e orientações para a Zona de Amortecimento do Parque Estadual de Itapeva.
“Considere-se que para todas essas situações territoriais apontadas, a proposta de Novo Plano Diretor passa a orientar formas de uso e ocupação do solo ou que são inadequadas diretamente para o local onde estão sendo previstas, nesse caso pelo estímulo à conversão do uso do solo em ambientes que devem ser protegidos, ou que causam impacto sobre áreas naturais adjacentes pela densidade e altura de edificações alterando as dinâmicas eólicas, hídricas e solares nesses ambientes próximos através da perda de condições para a manutenção de espécies ameaçadas de extinção constantes nos Planos de Ação Nacionais para a conservação da biodiversidade ou por afetarem a dinâmicas de manutenção de dunas e banhados que abrigam essas espécies e mantém a paisagem naturais da Reserva da Biosfera e do Geoparque Canyons do Sul”, explica trecho da denúncia.
O atual Plano Diretor do município é de 1995. A nova proposta da Prefeitura foi apresentada em audiência pública no dia 26 de julho. Na ocasião, entre as preocupações de moradores e ambientalistas, esteve a permissão de aumentar a altura de prédios em determinadas zonas da cidade; a mudança da caracterização da zona rural para zona urbana; a criação de uma zona industrial com possível impacto numa terra indígena Guarani; e a não contemplação de medidas protetivas ao Parque Estadual de Itapeva. Há ainda a preocupação com a possibilidade de se permitir a construção de prédios mais altos nas quadras próximas à beira-mar das praias da Cal, Prainha e Praia Grande (zona 8).
O procurador da República André Casagrande Raupp informou à reportagem do Sul21 já ter agendado uma reunião para o próximo dia 18 de agosto com o Instituto Curicaca e a Prefeitura de Torres. De acordo com o procurador, a denúncia é bem abrangente e a intenção é obter informações complementares de ambas as partes sobre os pontos mais sensíveis, além de ouvir as respostas da gestão municipal.
Com relação ao ponto da denúncia que envolve a capacidade de tratamento de esgoto nos pequenos balneários localizados ao Sul de Torres, o procurador explica já haver procedimento aberto no MPF sobre este problema e, por isso, o encaminhamento foi repassado aos colegas que atuam no caso. O novo Plano Diretor propõe aumentar o adensamento em praias pequenas do município, como Itapeva, Lagoa do Jardim, Rivieira, Tupinambá, Casqueiro, Gaúcha, Yara, Petrópolis, Recreio, Webber, Santa Helena, Estrela do Mar, Real e Paraíso.
Coordenador técnico e de políticas públicas do Instituto Curicaca, o agrônomo Alexandre Krob diz que a denúncia foi apresentada ao MPF como forma de antecipar pontos de vista da entidade após entrevistas de membros da Prefeitura de Torres na imprensa. Ele explica que a proposta do novo Plano Diretor atinge diretamente aspectos relacionados à União e que, portanto, são de competência do Ministério Público Federal (MPF) e não do Ministério Público Estadual (MPE).
“Foi isso que quisemos colocar claramente para o Ministério Público já ficar de ‘olhos abertos’ porque ele terá que agir”, afirma Krob.
O coordenador do Instituto Curicaca define como “retrógrada” a maneira como o governo de Torres pensa o novo Plano Diretor ao não considerar aspectos ambientais e climáticos na proposta.
Em nota, a Prefeitura de Torres declarou que a Secretaria de Meio Ambiente e Urbanismo do município encaminhou a denúncia do Instituto Curicaca ao Conselho do Plano Diretor e que o tema entrará em pauta na próxima reunião do conselho. A Prefeitura afirma que as “restrições ambientais continuarão a ser observadas, já que a legislação ambiental se sobrepõe à urbanística”.