
O primeiro dinossauro brasileiro foi descoberto em Santa Maria em 1936, mas só foi oficialmente descrito em 1970, recebendo o nome de Staurikosaurus pricei. Quase três décadas depois, em 1999, um novo dinossauro foi anunciado para o município. Recebido com grande entusiasmo pela comunidade científica, o réptil foi batizado de Saturnalia tupiniquim. Com cerca de 230 milhões de anos, ele se destacou por ser um dos dinossauros mais antigos já conhecidos no mundo. Apesar de boa parte do esqueleto fóssil ter sido preservada, a região facial não foi recuperada. Portanto, até então, não era possível determinar como foi a verdadeira face desse dinossauro, um cenário que mudou agora devido a uma nova descoberta anunciada por pesquisadores da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
Os fósseis estudados foram escavados em 2018 no sítio fossilífero Cerro da Alemoa, localizado em Santa Maria. Depois disso, eles passaram por um minucioso processo de limpeza, que envolve a remoção da rocha que reveste os fósseis. Essa etapa revelou a presença de três indivíduos, sendo que um deles preservou o crânio quase completo. Ao observar a anatomia dos ossos que compõem a face do dinossauro, os pesquisadores ficaram surpresos com sua morfologia delicada e grácil. Assim, carinhosamente apelidaram o espécime de “Gracinha”.
Com base nas dimensões dos fósseis, os pesquisadores conseguiram determinar que eles pertenceram a dinossauros com aproximadamente 1,50 metros de comprimento. Ainda, a ocorrência de características únicas permitiu atribuí-los a espécie Saturnalia tupiniquim. Diante dessa constatação, a descoberta de materiais cranianos trouxe à tona uma série de novos dados a respeito desse dinossauro.
A espécie teria um crânio relativamente curto e afunilado, com dentes em forma de punhal e munidos de serrilhas. Essas características são típicas de animais carnívoros. A curiosidade é que a espécie pertence à linhagem de dinossauros conhecidos por seu tamanho gigantesco, pescoço longo e dieta herbívora. No entanto, segundo os pesquisadores, a explicação para isso é que Saturnalia tupiniquim foi um membro muito primitivo dessa linhagem, mantendo uma dieta carnívora e um tamanho corporal reduzido, características comuns aos seus ancestrais.
A pesquisa foi conduzida por Lísie Damke, ao longo de sua pesquisa de Mestrado em Biodiversidade Animal (UFSM), sob orientação do Dr. Rodrigo Temp Müller (CAPPA/UFSM). Também participaram do estudo os pesquisadores Dr. Max Cardoso Langer (USP) e Dr. Átila Augusto Stock Da-Rosa (UFSM).

A descoberta de um crânio quase completo de Saturnalia tupiniquim também contribui para encerrar uma discussão que perdura há 25 anos. Com base nos poucos ossos cranianos descritos em 1999, pesquisadores sugeriram que a espécie teria um crânio pequeno em comparação com outros dinossauros de idade similar. Essa característica ajudaria a agrupar Saturnalia tupiniquim com dinossauros gigantes e herbívoros.
Novas estimativas publicadas em 2019, baseadas em tomografias dos materiais recuperados em 1999, deram mais respaldo a essa hipótese. No entanto, foi apenas com a recente descoberta que essa hipótese pôde ser definitivamente confirmada. E assim, de fato, Saturnalia tupiniquim possuía um crânio relativamente pequeno. Os pesquisadores acreditam que essa característica, juntamente com sua dentição carnívora, pode ter ajudado a espécie a realizar movimentos rápidos com a cabeça para capturar presas.
