Entrevistas
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23 de junho de 2014
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13:13

José Ivo Sartori: “Se eleito, meu primeiro ato será arrumar a casa”

Por
Sul 21
sul21@sul21.com.br
José Ivo Sartori: "Chegou a hora de fazer um debate que não seja mais tão Grenal, ou Caju, Brapel, Avecruz" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
José Ivo Sartori: “Chegou a hora de fazer um debate que não seja mais tão Grenal, ou Caju, Brapel, Avecruz” | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Nubia Silveira

Numa boa casa, situada no bairro Petrópolis, sem qualquer faixa indicando que ali funciona o comitê de campanha do PMDB, o pré-candidato do partido, José Ivo Sartori, recebeu a equipe do Sul21. Na sala do segundo andar, em que concedeu esta entrevista, há apenas uma mesa de oito lugares, sobre a qual descansa uma bandeja com água, café e chimarrão. Era o dia em que o Brasil enfrentava o México, pela Copa do Mundo. Apesar disso, Sartori não olhou uma única vez para o relógio e se alongou nas respostas.

Sorrindo sempre, revelou-se irônico ao falar de sua imagem de liderança regional. “Com certeza, devo trabalhar mais do que eles (adversários), para ser mais conhecido”, disse. Com orgulho, revelou que ocupa cargos eletivos há 36 anos. “Eu passei por 12 eleições e o senador Pedro Simon, por 11. Ele começou em 1959 e eu, em 1976”. Sartori foi vereador, prefeito, deputado estadual, presidente da Assembleia Legislativa (1998-1999), deputado federal  e secretário estadual do Trabalho e Bem Estar Social, no governo de Pedro Simon.

Sartori afirma que nuca teve vergonha de fazer política e que, se eleito, seu primeiro ato será “arrumar a casa”. Acredita que a aliança formada em torno de sua candidatura (PMDB, PSD, PPS, PSDC, PT do B, PSL, PHS e Rede Solidária) tem unidade, apesar de ser composta por diferentes. E espera ser ele a encontrar uma solução para os problemas do Rio Grande do Sul.

"Eu nunca tive vergonha de fazer política, porque acredito que através dela se mudam as realidades, sejam elas locais, estaduais ou nacionais" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
“Eu nunca tive vergonha de fazer política, porque acredito que através dela se mudam as realidades, sejam elas locais, estaduais ou nacionais” | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21- Por que o senhor quer ser governador do Rio Grande do Sul?
José Ivo Sartori
– Acho que a pergunta não está bem formulada. Se tu perguntasses quais as circunstâncias que ocorreram neste querer, talvez fosse diferente. O partido já havia definido que teria candidatura própria e houve uma movimentação partidária da juventude, das mulheres, dos ex-presidentes do partido, de vereadores e de prefeitos que me convenceu. Sorte também foi que o PMDB decidiu fazer uma pré-convenção, o que ajudou a mobilizar o partido. Se colocar em termos pessoais, tenho que agradecer, em primeiro lugar, ao partido, que me deu 36 anos de vida pública, desde o MDB, de mandatos ininterruptos. Portanto, na hora que o partido desejava, eu tinha que responder positivamente. Em segundo lugar, acho que a realidade do Rio Grande do Sul impõe uma conversa, um diálogo, uma discussão e um debate diferentes. O Estado é, mais ou menos, como um cidadão que tem um problema numa perna, vai ao consultório, o médico dá uma olhada, manda fazer um exame, e ele vai para casa, toma um comprimido e passa a dor. “Não preciso fazer mais nada”, ele pensa. Parece que o RS também vive esta questão: tem dificuldade de fazer um controle financeiro, de melhorar suas finanças e criar condições para o investimento necessário em áreas importantes como a da infraestrutura, notadamente na malha rodoviária, e também na questão das águas, do lixo, do tratamento de esgoto e nas questões sociais. Chegou a hora de fazer um debate que não seja mais tão Grenal, ou Caju, Brapel, Avecruz. Vai chegar o momento, em que teremos de trabalhar – muita gente junta – para colocar o Rio Grande nos trilhos. Esse foi o desafio que me encantou. Eu não precisaria estar disputando absolutamente nada depois de 36 anos. Mas se adquiri um capital político, de experiência de administração, tenho também a capacidade de perceber que eu posso contribuir neste momento de debate sobre as grandes questões do Rio Grande do Sul. E se falei na questão social é porque acho que temos condições de contribuir para melhorar a vida da nossa gente, embora os sinais externos sejam todos de individualização, de desencanto, de desilusão mesmo com a vida política do país. Não é diferente no Estado, porque quem participa e quem se envolve está contaminado pelo que está espalhado: ninguém serve, ninguém presta, não existe nada de positivo. Eu nunca tive vergonha de fazer política, porque acredito que através dela se mudam as realidades, sejam elas locais, estaduais ou nacionais.

“As diferenças que temos entre nós, candidatos, são muito inferiores às necessidades do Estado”

Sul21 – O senhor é visto, especialmente entre seus adversários, como uma liderança regional, não muito conhecido no restante do Estado. Qual a sua avaliação?
Sartori – Com certeza eu devo trabalhar mais do que eles, para ser mais conhecido. Eles estão mais descansados. E não deixam de ter razão, porque sempre fiz trabalho regionalizado, nunca saí da minha toca, como digo brincando, não importunei ninguém em outras regiões. Mas, acho que é preciso ficar conhecido, é preciso ter humildade. Não tenho arrogância dos outros de dizer “este não serve porque é regional”. O problema não vai ser um ou outro candidato. Os problemas são os do Rio Grande do Sul. As diferenças que temos entre nós são muito inferiores às necessidades do Estado. Mais cedo ou mais tarde, precisaremos de um pacto de convergência, e uma aproximação de todos, para a confirmação daquilo que é necessário fazer: o equilíbrio financeiro do RS. Cuidar do cofre e criar as condições para poder fazer investimento. Para isso, é preciso ter projeto, captar recursos, seja dentro ou fora do país. Isso serve para mim e para os outros, que são muito conhecidos. Sei que vou enfrentar candidatos de grandeza, mas terei a humildade suficiente de saber que eu tenho de trabalhar, me dedicar e manter a responsabilidade e a seriedade. Espero que o debate político seja elevado, para que a gente contribua para encontrar um caminho que possa colocar o Rio Grande nos trilhos.

"Mais cedo ou mais tarde, precisaremos de um pacto de convergência, e uma aproximação de todos, para a confirmação daquilo que é  necessário fazer: o equilíbrio financeiro do RS" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
“Mais cedo ou mais tarde, precisaremos de um pacto de convergência, e uma aproximação de todos, para a confirmação daquilo que é necessário fazer: o equilíbrio financeiro do RS” | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21 – O senhor falou num pacto de convergência. Seria como o tentado pelo deputado Alceu Moreira (PMDB), quando ele presidia a Assembleia Legislativa?
Sartori – Quando há muita divergência, muita disputa, você não consegue fazer a soma. Usei o pacto de convergência, mas o meio-termo seria um pacto de unidade mínima sobre algumas questões fundamentais da vida econômica, social e financeira do Estado, porque sem finanças controladas e sem sair da estrutura que temos hoje, nós não vamos encontrar caminho para continuar crescendo. Até porque o estado sozinho não vai conseguir sair da situação em que está. Se ele não tiver o apoio da sociedade, das organizações da sociedade e de todos os setores, e a paciência com isso, nós vamos continuar remando e mermando as condições necessárias para provocar outra etapa do desenvolvimento do RS.

Sul21 – Sua pré-candidatura foi uma das últimas a ser confirmada.
Sartori – Não, até fechamos antes que os outros a aliança (PMDB, PSD, PPS, PSDC, PT do B, PSL, PHS e Rede Solidária). O tempo não quer dizer (nada), até porque as campanhas serão muito curtas, não só pela Copa do Mundo, mas porque não há o ânimo e o envolvimento generalizado que existiam em outras ocasiões. A maneira é outra, a informação é outra, as condições de obter a informação, o avanço tecnológico nos colocou em outra realidade. E a gente sabe que a campanha eleitoral só vai começar mesmo depois da televisão e do rádio. Agora é a hora de fazer contatos, de organização e estruturação.

“Vamos construir aquele Estado que todos nós desejamos”

Sul21 – Sua aliança é grande.
Sartori – É melhor do que esperávamos. Nossa coligação tem uma questão importante politicamente: é bem centrada, com uma diversidade importante política e ideologicamente, na medida em que representam a diversidade, pois nem todo mundo pensa igual. A nossa é uma composição de diferentes, mas que tem uma unidade, que quer mudar o Estado, formatado de maneira diferente. Chegou a etapa em que todo mundo está preocupado com o bem do Estado, este tido como poder público, como governo e como sociedade. Todos estão envolvidos. O que a gente pleiteia é que tenhamos a unidade nesta diversidade, diversidade esta que existe também no estado, na população, com a diversidade étnica, além de cultural, econômica e regional. Compomos uma chapa que tem esta diversidade. Parece que estou voltando ao meu tempo de movimento estudantil, com grupos que não aceitavam participar porque legitimava o sistema – mas nós pertencíamos ao grupo que queria a unidade na diversidade. No interesse de todos, vamos construir aquele Estado que todos nós desejamos, que atenda bem as pessoas, que tenha respeito, sensibilidade, seriedade e responsabilidade no trato da coisa pública.

"O que importa é um bom discurso, estar bem afinado entre si e ter o apoio da população" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
“O que importa é um bom discurso, estar bem afinado entre si e ter o apoio da população” | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21- As alianças, às vezes, impedem a realização do programa de governo do candidato. O senhor vai conseguir cumprir o seu programa?
Sartori – Só faltava que as pessoas diferentes não tivessem dificuldade de convivência… Mas quando você tem uma meta e um horizonte maior do que as nossas diferenças, isso não vai trazer dificuldades. Os problemas são muito mais de interesses localizados, de posturas individuais, de interesses momentâneos e ocasionais. O que temos que olhar estrategicamente é a vida do Rio Grande do Sul. E nós estamos dando a nossa participação, centrados no Rio Grande do Sul.

Sul21- Sua campanha terá dificuldades financeiras?
Sartori – Acho que todos terão dificuldade, porque ainda não começou absolutamente nada de estrutura de campanha eleitoral. Sempre houve dificuldades. Eu passei por 12 eleições (concorri mais que o senador Simon, que concorreu 11 vezes; ele começou em 1959 e eu, em 76). Dificuldade existe para todos, é normal. E tudo vai depender da pesquisa, do momento, mas acho que todos sabem que hoje é muito caro uma campanha, a população não entende porque precisa de tanta infraestrutura para uma campanha eleitoral… Mas estamos programados e organizados. Existem, sim, dificuldades por que negar isso? Mas a gente não pode perder a capacidade de olhar para a luta política esquecendo o fato de que por não ter recursos não vai fazer uma boa campanha. O que importa é um bom discurso, estar bem afinado entre si e ter o apoio da população.

“Não adianta querer aumentar a receita e aumentar as despesas”

Sul21- Qual a proposta do seu programa de governo? O que fará se eleito?
Sartori – Obrigatoriamente, todos os partidos têm que apresentar o seu programa no dia da convenção que oficializa as candidaturas. Até o final deste mês (junho) todos terão que apresentar. Nós fomos escolhidos numa pré-convenção porque definimos uma postura, uma linha de conduta. Um plano de governo pode ser ocasional, serve para atender a determinada ideia que seja aceita pela convenção; outro é o plano estratégico, para vencer questões estruturais do estado, para renovar o Estado, para que não atrapalhe o crescimento do Estado. Plano estratégico nunca vai se finalizar, porque quando tu começas a atividade como governante sabe que tem que escolher prioridades, e nem sempre elas estão definidas no período eleitoral. Quando chega ao governo, tem que incorporar propostas de outros candidatos, porque você tem que ter sensibilidade de ver que eles estão fazendo propostas para o Rio Grande. Por outro lado, não vamos construir este plano de governo a sós, vamos tomar a contribuição de todos os setores da sociedade, sejam eles empreendedores comerciais, industriais, de serviços, do agronegócio, trabalhadores urbanos ou rurais, patronais, sindicatos, e também cooperativas, que são um exemplo daquilo que deu certo, são importantes para toda a atividade econômica. Por outro lado, organizações da saúde, da educação, da segurança, que é outro fator que chama a atenção, e as questões públicas vinculadas à infraestrutura. Estou falando com simplicidade, as questões concretas virão depois. A questão fiscal, a financeira é um ponto muito importante no plano de governo e terá que ter controle muito grande, especialmente nas despesas do Estado. Não adianta querer aumentar a receita e aumentar as despesas. É preciso trabalhar isso de maneira muito forte para que aconteça como sustentação de todo o plano de governo.

"Renegociar a dívida do Estado é um fator importante, mas não o principal de todos, renegociação é paliativo" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
“Renegociar a dívida do Estado é um fator importante, mas não o principal de todos, renegociação é paliativo” | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21- Se a eleição fosse hoje e o senhor fosse eleito, qual a primeira providência que tomaria?
Sartori – Arrumar a casa. Controlar tudo, saber organizar uma boa equipe, ter prioridades bem clareadas. Se a gente vai casar, primeiro arruma uma casa, depois começa a ajeitar. A mesma coisa é o estado: o primeiro trabalho é organizar todas as questões internas do governo, pois sem esta infraestrutura interna não dá. Tem que arrumar uma maneira de administrar o governo. Não tem como nas condições atuais, no começo de uma caminhada, ser enfático a ponto de dizer “vou fazer assim”, porque depende muito das condições que você tiver para objetivar aquilo que está no plano de governo. Tem que ter paciência e tolerância. Tenho às vezes dificuldade de colocar questões desta natureza, porque não quero prometer coisas que não possa realizar.

Sul21 – Para arrumar a casa é preciso renegociar a dívida do Estado?
Sartori – É um fator importante, mas não o principal de todos, renegociação é paliativo. É hoje, e amanhã o problema volta. Tem que mexer estruturalmente, mudar a forma de tratar a sociedade, de como o governo se relaciona com a sociedade. Ou abraçamos esta mudança… e a gente sabe que mudança não é fácil, sempre vai haver contrariedade, mas alguém tem que começar – gostaria que fosse eu, se tiver o apoio da sociedade -, é preciso muita determinação e muita vontade. Muitas mudanças estruturais não foram feitas, por conta da motivação política momentânea e ocasional.

“O plano de governo não é tudo, tem coisas do dia a dia que precisa mudar”

Sul21- O senhor teve uma administração considerada positiva em Caxias do Sul. Traria alguma medida adotada lá para o governo do estado?
Sartori – É difícil transpor uma realidade regional para a estadual. A gente foi muito feliz na escolha da equipe, tivemos a solidariedade dos partidos que fizeram parte do governo, teve uma caminhada em que a população colaborou. Tínhamos no programa de governo a meta de incentivar o voluntariado e a solidariedade, algo que deu certo socialmente. Vai desde a associação do bairro até a entidade empresarial, de uma organização média da sociedade até a Igreja, da colônia ao bairro, da pessoa mais simples à mais bem aquinhoada, todos compreenderam que precisavam dar as mãos para ajudar. Se teve uma prática positiva foi na questão social. E muita coisa que a gente fez não estava nem no programa de governo, porque virou uma necessidade da sociedade. O plano de governo não é tudo, tem coisas do dia a dia que precisa mudar, tem que olhar o horizonte. Não será o meu governo, única e exclusivamente ele, que vai ter capacidade de fazer as mudanças estruturais, tais como cuidar do cofre: tenho que cuidar dele melhor do que do meu dinheiro.

"O PMDB sentiu que não foi duas vezes para o segundo turno e precisa ir, para justamente ter o papel protagonista que sempre teve no Estado" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
“O PMDB sentiu que não foi duas vezes para o segundo turno e precisa ir, para justamente ter o papel protagonista que sempre teve no Estado” | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21- Nesta campanha, quais serão seus principais cabos eleitorais?
Sartori – O principal é o PMDB. Eu já percorri todas as 33 coordenadorias, fui aos municípios, vejo todo o PMDB motivado e trabalhando, porque sabe que tem uma importância fundamental. O partido se emocionou, porque veio de uma prévia que poderia ser uma divisão, mas acho que foi o único partido que fez disputa interna para candidato a governador. Em vez de divisão, foi soma; vejo uma população disposta, mulheres, jovens, prefeitos, vereadores. E com estes aliados que nós temos, tudo vai ajudar, de maneira ousada. Não é por causa do meu nome. O PMDB sentiu que não foi duas vezes para o segundo turno e precisa ir, para justamente ter o papel protagonista que sempre teve no Estado.

Sul21- A expectativa é de que esta eleição seja polarizada entre o PT e o PP. Como o senhor vê este quadro?
Sartori – Perfeitamente normal nas condições atuais. Tem gente que é candidato desde 2010. Existem outros que são candidatos há muito tempo e cumprem papel importante democraticamente, mas nós acreditamos na nossa força, do PMDB, PSB, PSD, PPS, pois muita gente nesta caminhada é originária do próprio PMDB. Mas o grande cabo eleitoral é a população, se ela não continuar desiludida, se ela acreditar que quem participa pode modificar a realidade.

“Espero que o PMDB nacional não venha interferir na decisão do PMDB do RS”

Sul21 – Esta campanha, em nível nacional, deverá ter como tema a moralidade, a luta anticorrupção. Estes serão temas de sua campanha?
Sartori – Não. Acho que o tema é a questão do estado propriamente dito, que ele tenha outra formatação, que tenha condições de enfrentar estes desafios e encontrar a solução dos problemas do RS, que se possa oferecer um bom serviço público, que a população seja bem atendida e o servidor público valorizado.

"A gente não desconhece que seria bom uma mudança nacional, sim" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
“A gente não desconhece que seria bom uma mudança nacional, sim” | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21- Como será criada unidade dentro do PMDB, com alguns sendo a favor da presidenta Dilma Rousseff, outros do ex-governador Eduardo Campos e outros ainda do senador Aécio Neves?
Sartori – Existem questões legais que serão cumpridas. Nas questões políticas, nós compomos com o PSB, com a candidatura de Beto Albuquerque ao Senado. Não se pode impedir o cidadão de querer acompanhar um ou outro candidato. Não vivemos esta fidelidade partidária num país em que a disciplina seja um conteúdo prático. Não é. O conteúdo prático que conheço é outro…

Sul21- Qual o senhor conhece?
Sartori – O que conheço é da minha história, da minha vida. Sempre fui fiel ao debate político elevado e procurei ter conduta séria e responsável e aquilo que foi decidido a gente vai cumprir. Nacionalmente existe uma composição do PMDB que estadualmente não se refletiu. E não há impedimento nos estados de ter a composição que nós fizemos aqui. Espero que o PMDB nacional não venha interferir na decisão do PMDB do RS, porque o presidente, a executiva, os dirigentes sempre colocaram na nossa eleição que o foco era o RS. Mas a gente não desconhece que seria bom uma mudança nacional, sim.

“Não vou ficar pedindo desculpa para ninguém nem culpando os outros pelo que der errado”

Sul21- Eduardo Campos é o caminho?
Sartori – Não é que seja o caminho, mas ele vai dar uma contribuição ao debate político nacional, na medida em que se não estivesse participando deste processo não haveria discussão política nenhuma, seria apenas uma polarização entre quem já foi governo e quem está no governo. Ele cria alternativa junto com Marina (Silva) de oferecer à sociedade uma discussão mais ampliada, não apenas de A contra B. Acho que é uma atitude de coragem dele, de servir ao país e de recuperar a credibilidade nos interesses políticos da nação. Se não houvesse Campos e Marina hoje no centro da discussão, não teríamos discussão elevada politicamente nenhuma. E eu não vou ficar pedindo desculpa para ninguém nem culpando os outros pelo que der errado; este negócio de culpar alguém não faz parte do meu ideário. Às vezes pensam que a gente é tudo igual, mas não é, tem gente que pensa com consciência social e política.

"Esta campanha eleitoral é  menos politizada do que em outras ocasiões" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
“Esta campanha eleitoral é menos politizada do que em outras ocasiões” | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21- Sua candidatura pode ser vista, aqui no Estado, como a de Eduardo Campos em nível nacional? Será o nome que evitará a polarização?
Sartori – Tudo é possível que aconteça. Esta campanha eleitoral é um pouco mais descentralizada, não é tão polarizada assim. É menos politizada do que em outras ocasiões. Este debate de um contra outro não resolve os problemas do RS. No debate tem que aparecer o mínimo de centralidade, que ajude a várias pessoas de diversos pensamentos estarem juntas para construir uma nova realidade.

Sul21- A questão do piso do magistério, debatida há longo tempo, tem solução?
Sartori – O piso foi criado, debatido, questionado, analisado. Um ofendeu o outro, depois a ofensa virou contra um… Na verdade, o piso vai ser um ônus financeiramente para o Estado, já no final do ano será um passivo de R$ 10 bilhões. Evidentemente, quem é contra o piso? Mas também não pode continuar esta realidade que está aí; desde 1979 os professores estão numa luta por uma vida melhor e até hoje esta questão não foi resolvida. Eu era vereador, acompanhei uma das primeiras greves, em 1979, a professora Zilah Totta era viva, acho que o presidente do Cpers era Hermes Zanetti (Zanetti presidiu o Cpers de 1975 a 1979, quando assumiu Glacy Iolanda Rolin Corrêa). Zilah (Mattos Totta presidiu o Cpers de 1981 a 1984) era um símbolo da inquietação. Tenho orgulho de ter entregado à família dela, post mortem, a Medalha Farroupilha, quando era presidente da Assembleia. Ela merecia, pelas circunstâncias de sua vida. O piso é uma realidade que está aí, é lei, está sendo discutida judicialmente, mas tem que ser cumprida ou, no mínimo, modificada, mas acho que ninguém consegue modificar uma lei desta natureza. Além disso, é preciso ter educação de mais qualidade. Não podemos mais ter indicadores que a cada dia que passa são sempre para baixo, diminuindo. Significa também fazer um pacto pela educação, que envolva não apenas professores, pais, alunos, governo, mas envolva setores da sociedade, porque este é o motor principal da vida dos gaúchos que precisa ser trabalhado. Educação tem um papel não apenas no desenvolvimento ou na formação das pessoas, mas em todas as outras áreas. Por exemplo, na segurança. Quem vai admitir que hoje esta impunidade no país permita qualquer coisa. Hoje todo mundo assumiu que qualquer bloco ou gangue destrua com tudo, patrimônio público ou privado. Quem perde com isso é a sociedade. Aparece pai que mata filho e filho que mata pai, esta situação passa quase como natural. Se uma pessoa tiver boa educação, um bom preparo, vai ser um cidadão diferente; se você der condição a um menino de se formar bem, ele vai ser o dono de sua própria história. Acho que a gente dá pouco valor à educação como um todo, nós todos, desde a sociedade até o governante. Teremos que ter um olhar muito diferenciado para fazer outras conquistas na área.

“Se não trabalharmos para ter uma cultura de paz, vamos ter violência, como se fosse uma coisa natural”

Sul21- A opção para melhorar a segurança está na educação?
Sartori- É problema de mais gente atuando, mas posso dizer, sem preconceito, que Caxias do Sul foi o primeiro município a estabelecer o policiamento comunitário, e espero que isto dê certo. Mais uma vez é o município que vai bancar parte disso, é um caminho muito longo. Várias medidas precisam ser feitas, temos que voltar a ser referência. O RS deu exemplo com palestras da Brigada Militar para preparação de policiais militares de outros estados. Temos que voltar a ser referência nesta disciplina, nesta hierarquia e na formação e atuação. Mas acho que, também na segurança, se a comunidade não se envolver profundamente, não apenas colocando recursos, não dará certo. Vivemos uma experiência em Caxias na área da educação, criando as comissões internas de prevenção de acidentes escolares – todos os organismos de segurança participaram (órgãos federais, policiais, guardas municipais, bombeiros). Foi num bairro humilde, em que tinha mais violência e acidentes na escola. Depois de, no máximo três meses, dessa operação conjunta (professores, associações de bairro, alunos, entidades), a escola passou para o décimo quinto-lugar. A escola é a coisa que mais deve ser preservada na vida da comunidade, senão fica difícil trabalhar. Em outras ações sociais observamos que as pessoas chegam à escola diferente, devido, por exemplo, a projetos do governo federal em relação às escolas infantis (dois a cinco anos) e do estadual PIM (Primeira Infância Melhor), que em Caxias nós transformamos em programa de governo. O PIM mudou a vida 600 famílias que foram trabalhadas, mudou a vida da comunidade. E a criança de seis anos chegou à escola diferente. Eu fui professor muitos anos e aprendi: o dia que eu chegava à sala de aula e tinha brigado com três, quatro alunos, com certeza, não conseguia passar a motivação para a educação que eu tinha que passar. Não tem que estar permanentemente em conflito, nesta área tem que se colocar uma solução e um encaminhamento para se ter paz nesta caminhada. Na segurança é a mesma coisa: se não trabalharmos para ter uma cultura de paz, de não violência, vamos ter pancadaria, violência, estragos, como se fosse uma coisa natural. Não é natural.

"Temos de voltar a ser referência em Segurança" | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
“Temos de voltar a ser referência em Segurança” | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Sul21- E quanto à gestão público-privada dos presídios?
Sartori – A questão tem que ser muito estudada. Na área social, todo mundo faz uma experiência aqui, outra acolá. Tem que dar valor ao trabalho nacional, porque existem avanços e conquistas. Independentemente de eu estar disputando uma eleição, não significa que vou descaracterizar o que foi conquistado, (defender) que tudo precisa ser destruído. Na questão das penitenciárias, aí sim, o governo federal deixou muito para trás a política do setor. Poderíamos estar em outro patamar no Brasil. Sofrem os estados, que precisam cuidar disso. Mas é uma experiência que no mínimo deve ser analisada e, se possível, implantada.

Sul21- Como o senhor vê o problema existente aqui no RS entre índios e colonos?
Sartori- Não adianta querer culpar a União. Não adianta se desculpar. As coisas acontecem no Estado e você é responsável por isso também. É preciso fazer uma negociação antecipada para evitar as mortes. Os avisos ocorreram, até que aconteceu o que ninguém desejava. O melhor caminho é o da negociação, às vezes é difícil, mas é preciso ir às últimas situações de trabalho para superar um impasse. Dizem que a responsabilidade é federal, mas o que acontece aqui é responsabilidade também do Estado. Dou o exemplo do que acontece no transporte escolar. Como eu vou impedir o transporte de um aluno do ensino médio da escola estadual? Ele é cidadão do município, tenho que ajudar, mesmo que eu receba poucos recursos do Estado. Os municípios hoje recebem muitos encargos e os recursos são bem menores, em todas as áreas, notadamente a social. Um incentivo que ainda houve no governo anterior ao Lula, no mínimo uma colocação de dinheiro já indexado nas áreas de educação e saúde, é garantido para o município. Um estado como o nosso tem que brigar pelo processo federativo mais ajustado às condições dos municípios e do próprio estado.


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