
Os estudantes indígenas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) que há 10 dias desencadearam um processo de reivindicação para ter a própria Casa do Estudante, tiveram ontem mais uma etapa na articulação pra viabilizar o pleito. Depois da frustração da última sexta-feira (11), quando a reunião prevista com a universidade e a Prefeitura de Porto Alegre não ocorreu, dessa vez os alunos foram recebidos pelo Ministério Público Federal (MPF).
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Após a reunião, a sensação dos estudantes foi de, enfim, terem sido ouvidos. Estudante de odontologia da UFRGS, Tailine Kaingang avaliou o encontro como importante para o avanço da reivindicação dos alunos indígenas.
Os participantes puderam expor todas as difíceis condições por eles enfrentada na atual Casa do Estudante Universitário, onde alegam sofrer com preconceitos e com a dificuldade de assimilação de sua cultura pelos outros alunos. Por essa razão, desde o dia 6 de março, os estudantes indígenas da universidade ocuparam um prédio abandonado próximo à UFRGS para chamar a atenção sobre o tema. O imóvel pertence à Prefeitura de Porto Alegre e já abrigou a Secretaria Municipal de Indústria e Comércio de Porto Alegre. Posteriormente, o prédio foi cedido à UFRGS para abrigar um polo de tecnologia.
Tailine explica ter ficado acordado com o procurador da República, Jorge Sodré, que ele convocará a UFRGS para uma reunião nos próximos dias. A expectativa dos estudantes indígenas é que o MPF cobre uma posição da universidade: se a UFRGS tem mesmo interesse em resolver a questão de modo definitivo e construir a Casa do Estudante Indígena; ou se não tem condições de fazer isso agora e então apresentar uma solução emergencial.
“O Ministério Público se mostrou aberto, realmente nos ouviu e nos deu a confirmação de que há mesmo a necessidade (da Casa do Estudante Indígena). Vão tentar nos ajudar dentro do necessário”, afirmou a estudante de odontologia.
Na semana passada, os alunos chegaram a ter gestos positivos tanto da UFRGS, que sinalizou se comprometer com a construção da Casa do Estudante, quanto da Prefeitura, que chegou a mencionar alguns endereços de imóveis desocupados e que poderiam ser cedidos. Entretanto, logo depois ambos os órgãos recuaram, o que fez os alunos reclamarem de um “jogo de empurra”.
Agora, na última segunda-feira (14), a Prefeitura de Porto Alegre entrou com pedido de reintegração de posse do prédio ocupado pelos indígenas. O mesmo MPF deverá se pronunciar sobre o pedido do governo municipal nos próximos dias.
Nesta quarta-feira (16), representantes do movimento tiveram reunião com o prefeito, Sebastião Melo, para debater a situação da ocupação. Também participaram do encontro o procurador-geral do Município, Roberto Silva da Rocha, a secretária municipal da Educação, Sônia da Rosa, e a vereadora Karen Santos (Psol).
Horas depois, a Prefeitura divulgou que vai solicitar ao Poder Judiciário que faça a mediação do problema envolvendo a ocupação do imóvel. Segundo o governo municipal, uma vistoria realizada no última dia 10 de março por engenheiros da Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura (Smoi), concluiu que o prédio deve ser fechado imediatamente ao uso público porque “não apresenta segurança em relação a estrutura nem condições de habitabilidade em função, especialmente, das patologias observadas e documentadas no presente relatório”.
Construído há mais de 40 anos, o prédio de cinco andares está sem uso há cinco anos.
Um grupo de aproximadamente 50 estudantes indígenas da UFRGS, em sua maioria mães, ocupou no dia 6 de março o prédio onde funcionou a Secretaria Municipal de Indústria e Comércio de Porto Alegre, na entrada do Túnel da Conceição, e que hoje está abandonado. As estudantes indígenas dos povos Kaingang, Xokleng e Guarani reivindicam a construção de uma Casa do Estudante Indígena, demanda antiga, que até hoje não foi atendida pela Universidade.
O coletivo de estudantes indígenas assinalou que, em uma carta dirigida à Coordenadoria de Acompanhamento do Programa de Ações Afirmativas (CAF) da UFRGS, em 2017, exigiu ações da universidade para que a cultura dos povos fosse respeitada e valorizada, assegurando condições para a permanência nos estudos, a não desistência e o não “embraquecimento”.
Entre as reivindicações apresentadas na carta, uma das mais importantes era uma casa indígena. As estudantes relatam ainda que algumas mulheres indígenas que já viveram na Casa do Estudante da UFRGS tiveram que esconder seus filhos, pois o regimento interno da casa não permite crianças.