

Ernesto Velásquez, para o Sul21
“Há um desejo de esvaziamento da cultura para deixar as pessoas com menos capacidade de produzir, de pensar, de criar”
Antonio Villeroy, também conhecido como Totonho Villeroy, é autor de canções que já se tornaram clássicos da música brasileira e com composições gravadas por nomes como Maria Bethânia, Gal Costa, Maria Gadú, Ivan Lins, Seu Jorge e Ana Carolina, o cantor e compositor Antonio Villeroy tem sido um dos músicos mais atuantes para impedir que o Governo do Estado concretize a extinção da TVE e da FM Cultura. Nesta segunda-feira, logo após o anúncio do pacote, conclamou artistas pelas redes sociais a uma mobilização para conversar com os deputados e evitar que o projeto seja aprovado.
Nesta terça-feira, Antonio conversou com nossa reportagem durante mobilização de servidores e artistas em frente ao Palácio Piratini. Na conversa, também tratou dos diversos ataques sofridos pela cultura, tanto em nível federal, quanto estadual, e em outras unidades da Federação, como o Rio de Janeiro.
Sul21: Qual a importância da TVE e da FM Cultura para o Estado?
Antonio Villeroy: São órgãos de comunicação indispensáveis porque são descomprometidos, tocam música sem jabá – a gente sabe que tem rádios locais que só tocam música com jabá. A programação da rádio é variada, contempla todos os estilos de música, música nativista, tem o programa do Demétrio Xavier (Cantos do Sul da Terra), que faz uma reflexão sobre a cultura latino-americana, tem programas de jazz… Todo o tempo que eu estou ouvindo rádio eu ouço esta rádio, porque ela também presta serviços de informação, uma série de coisas. Então, são veículos que dialogam com a cidade, com a comunidade cultural, o tempo inteiro. São veículos com os quais a cultura pode realmente contar. Mas não é porque prestam um serviço para a gente, é porque prestam um serviço para a comunidade. O risco que se corre é ficar cada vez mais numa situação de impessoalidade, de distanciamento. Os gaúchos se enxergam por ali também. Isto falando da Fundação Piratini, mas a gente sabe que tem outras super importantes, que não podem ser extintas também. E a gente quando vê a economia que o Governo ia fazer com isto, que é 129 milhões (anuais, somando as nove fundações que podem ser extintas), é mais ou menos que ele paga de publicidade para os outros canais. E o foco tinha que ser ir atrás dos sonegadores. Neste ano, só entre janeiro e setembro, 5 bilhões foram sonegados e essa cifra tende a chegar a 7 bilhões no final do ano. O orçamento da Fundação Piratini é só 0,4% do que foi sonegado. Vejo muito empresário querendo enxugar o Estado, mas eles estão sonegando. Tão batendo latinha, panelinha, com a camisa da Seleção, mas não pagam os impostos.
Sul21: Esse argumento de que seria uma economia para o Estado, vem de uma ideia que cultura é uma brincadeira e que não gera recursos. Tu achas que cortando os cerca de R$ 30 milhões de orçamento da Fundação Piratini vai haver alguma economia real, ou vai deixar de girar a economia da cultura?
Antonio Villeroy: Eu estava pensando nisso quando vinha para cá, porque, eu, por exemplo, promovo shows que mobilizam mais ou menos R$ 30 mil por mês, e com isto tem um monte de gente que se beneficia, que trabalha, até mesmo o taxista que tá trabalhando nessa hora. Então, um veículo de comunicação que atua junto com a comunidade e ajuda a fomentar a cultura acaba gerando empregos indiretos. E outra coisa: querem aumentar a segurança, mas se botarem um monte de gente na rua, vai empurrar outros que já estão na rua mais para baixo. E esses que tão mais em baixo vão mais para baixo ainda. Isto vai gerar mais violência, porque tu achas que aumentando o desemprego vai diminuir a violência?
Sul21: A cultura sofre uma série de ataques, vista como algo que não é prioridade. O Rio de Janeiro anunciou o fim da Secretaria de Cultura, assim como o Governo Federal tentou extinguir o ministério, e agora o governador do Rio Grande do Sul faz o mesmo. Essa visão de que é necessário investir em segurança, em educação, ela não engloba o fato de a cultura ser educação e de ser uma alternativa para combater a violência. Como tu vês isto?
Antonio Villeroy: Sinceramente, eu acho que nenhum desses governos têm interesse em educação. Isso é mentira. Quanto à questão da segurança, já poderiam ter feito muita coisa, mesmo com os recursos que têm. O que tem acontecido é que querem marginalizar a cultura, como já ocorreu no passado. Como se fosse uma coisa de comunista e associar quem é de esquerda a ladrão, pô, é óbvio que muita gente meteu a mão, mas principalmente do partido do governador, e eles continuam metendo a mão: acabou de ser preso o Sérgio Cabral com R$ 122 milhões desviados, e que também é do PMDB. Ou seja, eu não acredito que haja interesse na educação, é tudo balela. Há um desejo de esvaziamento da cultura, e não para substituir pela educação, não, é para deixar as pessoas com menos capacidade de produzir, de pensar, de criar. Uma coisa ridícula, velha, antiga. Esses caras acreditam que toda cultura que tem sido produzida no Brasil nos últimos 40 anos é uma cultura de esquerda, que a esquerda se infiltrou em todo meio de comunicação, nas artes, que todo artista é de esquerda. É uma visão tacanha. O Sartori não entende nada de cultura e de comunicação. Eu acho que ele é um grosso mesmo.
Sul21: E tu não achas que uma sociedade com mais acesso à cultura tende a ser menos violenta?
Antonio Villeroy: Com certeza. Esses tempos eu estava revendo um documentário sobre o Nem, que era chefe do tráfico na Rocinha, e ele falava que tinha perdido cinquenta e poucos soldados para a cultura, para ONGs que trabalhavam com cultura. Foram caras que foram trabalhar com a cultura e não voltaram. A cultura tem uma capacidade de recuperação das pessoas.