
Marco Weissheimer
– Tem Coca-Cola grátis aqui, rápido, entrem na fila.
Um caminhão da empresa de refrigerantes, postado estrategicamente em uma das entradas do Largo Glênio Peres, no centro de Porto Alegre, convidava a população a entrar num corredor para pegar sua garrafinha gratuitamente e aguardar a chegada tão esperada da tocha olímpica que terminaria ali a sua maratona na capital gaúcha, iniciada na metade da tarde no tradicional Parque Moinhos de Vento. A marca do patrocinador misturava-se com a do espírito olímpico que ficou meio perdido no Largo em meio a uma profusão de outros patrocinadores, ávidos por visibilidade, um forte esquema de policiamento por parte da Brigada Militar e dezenas de manifestantes contra o presidente interino Michel Temer e o golpe em curso contra a presidenta Dilma Rousseff. Foi o último capítulo de um dia onde a tocha olímpica mudou a rotina do centro da capital gaúcha, em diferentes momentos.
A chegada da tocha olímpica atrasou e acabou arrastando a cerimônia de sua passagem por Porto Alegre para o final da tarde, hora em que o trânsito fica mais crítico na capital. Mas os principais meios de comunicação da cidade, que costumam resumir manifestações de rua, organizadas por sindicatos, movimentos sociais e estudantes, por sua capacidade de “tumultuar” o trânsito e o direito de ir e vir, desta vez destacaram o espírito olímpico do evento e chegaram mesmo a pedir paciência aos motoristas. Mas mesmo o espírito olímpico teve que se curvar a uma das rivalidades reinantes no Estado. Um conjunto de esportistas destacados como celebridades no Estado – entre eles, representantes da dupla Gre-Nal, é claro – foram escolhidos para acompanhar o trajeto do fogo olímpico em toda a sua trajetória que iniciou no Parcão, passou pela Redenção, pelo Parque Marinha do Brasil, e terminou no Largo Glênio Peres. O Grêmio reinou no Parcão e o Internacional teve seu momento no Beira Rio.

Este caminho foi marcado também por várias manifestações “Fora Temer!” e por duas tentativas frustradas de apagar o fogo olímpico com água, uma no Parque da Redenção e outra na avenida João Pessoa. Mas a tocha estava guarnecida por homens da Força Nacional de Segurança e da Brigada Militar as tentativas não foram bem sucedidas. Os autores, um homem e uma mulher, chegaram a ser detidos mas acabaram o dia liberados pela polícia.
No início da noite, chegou a ocorrer um incidente no Largo Glenio Peres, quando seguranças de uma empresa privada contratada para trabalhar no evento, tentaram retirar uma faixa da Frente de Luta Contra o Golpe, colocada junto a uma grade que formava o corredor de passagem da tocha. Avaliaram que a mesma não condizia com o espírito olímpico. Em meio ao debate sobre a permanência da faixa, um militante da Organização Marighella chegou a ser agredido por um segurança, o que lhe valeu um hematoma no olho esquerdo. Mas a faixa permaneceu. Presentes, militantes do Levante Popular da Juventude, da União da Juventude Socialista, da Juventude do PT, da União Brasileira de Estudantes Secundaristas (Ubes), da União Nacional de Estudantes (UNE) e de trabalhadores da área da saúde, que denunciaram as ameaças feitas pelo governo interino de Temer contra o Sistema Único de Saúde (SUS).

Um forte contingente da Brigada Militar postou-se ao lado dos manifestantes. Esse contingente era formado por efetivos de vários destacamentos da BM: Batalhão de Operações Especiais, Pelotão de Operações Especiais, Patres e do já tradicional serviço de inteligência da corporação. No início da noite, um animado grupo de policiais militares fazia fotos e vídeos de manifestantes. Uma fileira de brigadianos e brigadianas perfilada há cerca de três metros dos manifestantes anti-Temer portava, presas em seus uniformes, bombas de gás, balas de borracha e sprays de pimenta. Mas a tocha chegou e sua passagem pelo corredor armado no centro do Largo Glênio Peres transcorreu sem maiores incidentes. Embalado pelos brindes da multinacional de refrigerantes o espírito olímpico atravessou o Largo e subiu ao palco onde foi recebido pela ginasta Daiane dos Santos que acendeu a pira olímpica.
O dia olímpico de Porto Alegre chegou ao fim com o Largo Glênio Peres dividido entre as marcas dos patrocinadores das Olimpíadas, vendedores de pastéis, balas e outros quitutes, um forte aparato de segurança e muitos cartazes e faixas denunciando o golpe em curso no país e o seu presidente interino, uma cena que tende a se repetir nas próximas semanas no País.
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(Foto: Joana Berwanger/Sul21)



