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4 de agosto de 2015
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20:15

Projeto de lei quer multar estabelecimentos que proíbam amamentação em Porto Alegre

Por
Sul 21
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Teste da linguinha passa a ser obrigatório em hospitais e maternidades da rede pública e particular | Foto: Wilson Dias/Agência Brasil
Semana Mundial do Aleitamento Materno é comemorada na primeira de agosto| Foto: Wilson Dias/Agência Brasil

Débora Fogliatto

Em todo o mundo, mulheres que têm filhos pequenos precisam adaptar sua rotina para cuidar do bebê, o que, em geral, inclui amamentá-lo de três em três horas, em média. Por isso, muitas vezes elas estão em locais públicos ou em estabelecimentos comerciais em momentos em que é preciso alimentar os filhos. Em muitos casos, as mulheres preferem procurar o banheiro mais próximo, ou algum local mais reservado, para amamentar, devido ao constrangimento que podem vir a sofrer. Na Semana Mundial do Aleitamento Materno, começa a tramitar na Câmara de Porto Alegre um projeto de lei que prevê multa para locais que proíbam ou constranjam mães ao amamentar em suas instalações.

Em novembro de 2013, uma mulher foi impedida de amamentar em um centro cultural do Sesc, em São Paulo, quando estava em uma sala de leitura e foi abordada por uma funcionária, que a disse para se dirigir a uma sala de amamentação. Ainda na capital paulista, em fevereiro de 2014, uma mulher foi “convidada a se retirar” do Museu da Imagem e do Som (MIS), onde visitava uma exposição com a filha de sete meses, quando foi amamentá-la. Um segurança do local pediu que ela fosse para um lugar “mais reservado”.  A partir daí, foram realizados “mamaços” nos locais e campanhas pelo direito de amamentar em público começaram a ser realizadas em todo o país.

Iniciativas semelhantes aconteceram na Inglaterra e nos Estados Unidos, onde também houve casos de mulheres constrangidas por amamentar seus filhos. No país norte-americano, uma iniciativa de um “espaço privado” para mães amamentarem causou polêmica, por se tratar de uma pequena cabine sem janelas. Enquanto algumas pessoas parabenizam a ideia, por quererem um local privado para amamentar, outras consideram que isola a mulher e perpetua a cultura do constrangimento ao aleitamento. A polêmica também chegou a Caxias do Sul, onde os três principais shoppings recomendavam que as mães usassem os fraldários para amamentar.

Foto: Facebook/ Mamava
Cabine sem janelas causou polêmica nos Estados Unidos | Foto: Facebook/ Mamava

Em Porto Alegre, embora não haja casos famosos, a amamentação também é muitas vezes mal vista, e a situação é ainda mais complicada para mães que trabalham e estudam ao mesmo tempo. Em 2009, Ceniriani Vargas era estudante da UFRGS quando teve sua primeira filha, Dandara, e como a licença-maternidade era de três meses, foi assistir às aulas mesmo com a bebê. Com a criança era pequena e sem opções de com quem deixá-la, Ceniriani passou a levá-la junto para a universidade, onde se sentia “um ET” por carregar a pequena. O ambiente claramente não estava preparado para receber estudantes que também fossem mães. “Foi um esforço tremendo conciliar trabalho, faculdade e um bebê pequeno, ainda mais morando longe do Campus do Vale, praticamente na zona sul. Cada vez que tinha que mudar uma fralda era uma maratona, pois obviamente não existe fraldário na universidade”, relata.

Na universidade, ela sentia que as pessoas estranhavam a presença da menina, a lançavam olhares de repreensão e percebia preconceito por parte dos professores. Ceniriani conta que agia com naturalidade em relação à amamentação, o que, porém, não era sempre bem visto, e um professor chegou a se recusar a avaliar seu trabalho de fim de semestre. “Ela era um bebê muito tranquilo, mas às vezes dava uma resmungadinha. Ela nunca chupou bico, então ela resmungava e eu oferecia o peito pra ela se acalmar. Tinha um professor que me olhava como se quisesse me expulsar da sala. Não foi por falta de esforço que eu rodei naquela cadeira, mas por puro preconceito”, acredita.

Ela conseguiu concluir a licenciatura em Ciências Sociais e, agora, cursa o bacharelado do curso. Sua segunda filha nasceu em março e ela avalia que, agora, irá enfrentar “a maratona” de novo, mas com a vantagem de que com a licença-maternidade expandida para quatro meses, conseguiu tirar o primeiro semestre sem perder a vaga na faculdade.

Em Guarujá, Prefeitura promoveu amamentação coletiva em 2013 | Foto: Prefeitura de Guarujá
Algumas cidades brasileiras têm mamaços promovidos pelo poder público, como Guarujá | Foto: Aliana Britto/ Prefeitura de Guarujá

Legislação

Após os dois casos de mulheres expulsas de centros culturais, a prefeitura de São Paulo aprovou, já em 2015, um projeto de lei que multa quem impedir amamentação em público, proposto pelo vereador Aurélio Nomura (PSDB). O estabelecimento ou pessoa que proibir o aleitamento materno sofrerá multa de R$ 500, que será dobrada em caso de reincidência. A ideia é que a amamentação não precise ser feita em uma área segregada, mas sim encarada com naturalidade.

Em Porto Alegre, um projeto de lei caminha no mesmo sentido. Proposto pelo vereador Cássio Trogildo (PTB), o PLL 080/15 prevê multa para “estabelecimento localizado no Município de Porto Alegre que proibir ou constranger ato de aleitamento materno em suas instalações”. A justificativa do texto defende que “A lactação é uma das maneiras mais eficientes de atender aos aspectos nutricionais, imunológicos, psicológicos e ao desenvolvimento de uma criança no seu primeiro ano de vida. A questão do aleitamento materno não é somente biológica, é também histórica, social e psicologicamente delineada”.

Cássio Trogildo, autor do projeto, explica que teve a ideia ao perceber que há um movimento mundial pelo direito à amamentação. “Teve aquele episódio no metrô de Nova York e depois em São Paulo, onde agora já é lei. E foi a partir desses anúncios que fomos pesquisar. Até no início eu pensei se seria necessário uma lei nesse sentido, porque parece uma coisa tão óbvia”, conta. Ele se refere a um caso ocorrido em 2011, quando a atriz Mayim Bialik foi alvo de polêmica ao ser fotografada amamentando seu filho no metrô.

A partir daí, o vereador conta que começou a prestar atenção a relatos e casos de mulheres que foram constrangidas por amamentar e percebeu que a lei era, sim, necessária. “Pelo menos por uma medida de prevenção a gente já passa a ter uma legislação sobre esse direito mundial do aleitamento materno em qualquer circunstância. A legislação seria a fim de garantir que se eventualmente alguém que proíba, em estabelecimento comercial, receberia multa, que seria de R$ 495 reais, e a reincidência R$ 828 reais”, explica. O projeto está no início da tramitação, sendo apreciado pela diretoria da Câmara, e em seguida deve ingressar nas comissões, passando pela de Constituição e Justiça e depois por mais duas.

Foto: Jessica Barbosa/ Governo do MS
Mamaços buscam trazer reflexão sobre importância do ato | Foto: Jessica Barbosa/ Governo do MS

 Hora do mamaço

Para comemorar a Semana Mundial do Aleitamento Materno, mulheres se organizam no Brasil inteiro e realizaram um “mamaço”, no último sábado (1º). Em Porto Alegre, foi a segunda edição do evento, no Parque Redenção. O evento é promovido pela campanha Hora do Mamaço, criada em 2012,  com o objetivo de ser um evento anual onde “todas as mães, de todas as cidades e estados brasileiros, se reúnam – no mesmo dia e no mesmo horário – em um ponto turístico de suas cidades, para amamentarem seus bebês simultaneamente”, segundo texto da facilitadora Simone de Carvalho.

Atualmente, são 45 cidades que participam do evento, que busca “trazer à sociedade a reflexão e a discussão da importância do apoio e reconhecimento de amamentar e seus inúmeros benefícios para a mãe e para o bebê”. Em 2014, o movimento lançou uma petição, que pede que seja criada uma “Lei Nacional que proteja o Ato de Amamentar em locais públicos e privados e que mães e bebês sejam respeitados, apoiados e incentivados por isso”, segundo o texto. A petição argumenta que “mães diariamente são impedidas e/ou constrangidas por amamentar seus bebês em locais públicos e privados. Amamentar é um ato natural e puramente amoroso e deve ser protegido e respeitado por toda a sociedade”. A campanha alcançou cerca de 11 mil assinaturas, mas por enquanto tal legislação não existe em âmbito nacional.


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