
Luís Eduardo Gomes
A Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes) realizou nesta segunda-feira, no Hotel Continental, em Porto Alegre, o 1º Seminário Nacional de Gestão e Controle de Perdas de Água para discutir alternativas a serem adotadas pelas empresas de saneamento básico do País para enfrentar a escassez hídrica e, ao mesmo tempo, aumentar receitas para fazer investimentos no sistema.
O engenheiro hidráulico Mário Augusto Baggio, responsável pela palestra principal do evento “Como Formular e executar estratégia de combate às perdas, com foco em resultados?”, salientou que o momento vivido pelas empresas de saneamento básico é de queda no consumo, queda no faturamento e elevação de preço em decorrência da crise hídrica enfrentada em diversas partes do País – mais notoriamente em São Paulo.

Segundo Baggio, apesar da crise, a situação do sanamento básico deve sempre respeitar um tripé social, ambiental e econômico. “Nós temos que universalizar a água de maneira adequada, manter a viabilidade econômica das organizações e sem que elas degradem ao meio-ambiente”, disse.
De acordo com o engenheiro Alexandre Domingues Marques, representante da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), a seca que afetou o Estado e as políticas de utilização consciente de água resultaram em uma redução de consumo de cerca de 20% na Região Metropolitana de São Paulo.
Atenção a ocupações irregulares
Um dos principais eixos de preocupação das empresas de saneamento reunidas no Hotel Continental foi a questão do consumo irregular de água em ocupações ilegais através de ligações clandestinas, o que resulta em situações de desperdício e inadimplência.
Uma das ações apresentadas para lidar com a questão foi o Programa Consumo Responsável, criado em 2012 pelo Departamento Municipal de Água e Esgotos de Porto Alegre (DMAE) com o objetivo de combater o desperdício de água, perdas e contaminação das redes em áreas irregulares na cidade.

Segundo Patrícia Tompsen Bandel, coordenadora do programa, atualmente existem 267 aglomerados irregulares em Porto Alegre, onde se encontram 56 mil domicílios e 192 mil pessoas. Ela explicou que, a partir de um trabalho junto a comunidades selecionadas, passou-se a instalar redes provisórias e informar à população sobre a importância da instalação de redes de saneamento básico e do consumo de água adequado, o que vem resultando na redução de consumo médio e no aumento do faturamento.
Baggio salientou que um dos principais entraves para a regularização do fornecimento de água e do combate às perdas é a decisão da maior parte dos judiciários do País – Porto Alegre seria uma exceção – de não permitir que sejam feitas ações em ocupações irregulares. “Os judiciários e legislativos precisam voltar os olhos para essas famílias que estão abaixo da linha da pobreza e condenadas à sede”, disse.
A ONU estipula que é preciso garantir um mínimo de 10m³ de consumo familiar por mês para cada família. Segundo Baggio, o não cumprimento dessa determinação está na origem de epidemias e endemias transmitidas pelos sistemas hídricos das cidades.
“Não investimos no saneamento e condenamos as pessoas para que compareçam ao SUS (Sistema Único de Sáude), que é o local em que vamos tratar das pessoas com doenças de veiculação hídrica”, afirma.
O representante da Sabesp Alexandre Marques afirmou que, somente na região metropolitana de São Paulo, as áreas irregulares consomem 5m³ por segundo. Para efeito de comparação, a vazão total do Guaíba é de 6m³ por segundo.
Marques concorda que é necessária uma iniciativa do poder público para permitir a regularização, ao menos temporária, de ocupações que se encontram em situação irregular para que se possa aferir de forma correta o consumo de água por residência, o que possibilitaria coibir fraudes e estimular o consumo consciente de água pela população, além de trazer benefícios indiretos para a população dessas regiões.

A regularização da situação de saneamento de ocupação e concessão de um endereço fixo para uma família poderia, por exemplo, permitir que eles passassem a fazer compras parceladas. “O que a população anseia muito, além de ter uma água regularizada e um esgoto à sua porta, é a necessidade de ter um endereço para que possa fazer uma compra no crediário, um parcelamento”, disse Marques.
Combate a fraudes
Além da questão das ocupações, as empresas salientaram a importância de se realizar investimentos em infraestrutura para que se possa medir corretamente o consumo de água por domicílio e combater fraudes. Cesar Rehnolt Meyer, presidente da comissão técnica de redução de Perdas de Água da Cia Águas de Joinville (SC), afirmou que uma das medidas adotadas em sua cidade foi reforçar a micromedição.
Segundo ele, em 2005, quando a sua empresa assumiu a operação que antes era realizada pela Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan), a perda de água por problemas de medição era de 60% e mais de 70% da população da cidade pagava a taxa mínima, muito em parte por erros nos hidrômetros. Com uma nova política de troca e instalação de hidrômetros, Meyer diz que, em três anos, Joinville aumentou o faturamento em 35% e reduziu o volume disponibilizado (enfrentando o desperdício) em 7%.
Marcelo Depexe, da Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), lembrou que mesmo um hidrômetro novo só consegue medir 95% da água consumida. Contudo, como o custo de troca destes aparelhos precisa ser mensurado, ele salienta que o desafio é identificar o momento certo em que a troca do aparelho compensa as perdas de faturamento registradas.
Depexe afirmou que a Sanepar identificou que este ponto de equilíbrio seria de 5,2 anos de vida útil por aparelho. Contudo, ele salientou que, na realidade, este ponto de equilíbrio varia de caso para caso, uma vez que uma pequena defasagem em um grande consumidor de água, como uma indústria, tem um impacto muito maior no faturamento do que uma grande defasagem de um pequeno consumidor.
Baggio afirmou que, a partir do debate, ficou evidente que é necessário que as empresas façam uma reengenharia econômica. “É preciso fazer uma revisão de preços, pensar em aspectos econômicos, integrados com aspectos sociais e ambientais”, disse.