
Jaqueline Silveira
Raro na Capital ultimamente, o sol forte apareceu, no domingo (8), e brindou a 19ª Parada Livre de Porto Alegre, que ocorreu pela parte da tarde e reuniu milhares de pessoas no Parque da Redenção, tomado pelo colorido das bandeiras, fantasias e balões.
Pautada pela bandeira contra o retrocesso nos direitos da população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais), o evento, denominado 19ª Parada Livre Lesbitransviadagens, intercalou apresentações artísticas com manifestações de conscientização sobre a importância de lutar por avanços e, ao mesmo tempo, contra a lebisfobia, transfobia e homofobia. Atualmente, há um conjunto de projetos tramitando no Congresso Nacional, que retira direitos, principalmente da comunidade LGBT.

Ao abrir a parada, a travesti Glória Crystal, que também é secretária adjunta da Livre Orientação Sexual de Porto Alegre, lembrou que “até podem tentar desconstruir” os direitos conquistados, mas “nós vamos construir.” “Esse é um espaço político e cultural”, ressaltou ela. E prosseguiu com mais um recado: “Caráter é uma coisa, orientação sexual é outra. Façam de sua vida o que bem entender. Somos todos iguais, merecemos respeito.”
Já outra das apresentadoras do evento, a performer Charlene Voluntaire, frisou que a parada “é o momento que a gente tem de protesto e de visibilidade” em defesa dos direitos da população LGBT. Na sequência, a cantora transexual Valéria Hounston cantou o Hino Nacional. Esta edição foi dedicada à drag queen e atriz Dandara Rangel, que morreu em junho deste ano. A homenagem não se limitou a manifestações, também esteve em um dos carros que participaram da marcha.

A 19ª Parada Livre Lesbitransviadagens foi organizada por muitas entidades, ONGS e coletivos, que tiveram representantes passando pelo palco montado próximo ao Espelho d’Água para dar um recado ao público que se aglomerava em frente à estrutura e debaixo das árvores para driblar o forte calor da tarde deste domingo. Representante da ONG Outra Visão – LGBT, Thiago Fiorino disse que o evento iria servir para todos saírem mais conscientizados diante de um “mundo de retrocessos”. “O Rio Grande do Sul é que mais mata LGBT. Não estamos sozinhos, nossa luta é de todos”, refletiu. Em 2014, as estatísticas apontam, segundo os organizadores do evento, que 326 integrantes da comunidade LGBT morreram no Brasil.
Representantes do coletivo Mundo Invisível, prostitutas também subiram no palco. Elas se manifestaram contra o retrocesso de direitos no País e defenderam a regulamentação da profissão. Já Sandro Ká, da ONG Somos, enfatizou a importância da programação da Parada Livre no avanço dos direitos. “É desse jeito: com arte e cultura que a gente provoca a transformação.”

Coleta de assinaturas
Enquanto no palco ocorriam manifestações e apresentações artísticas, em uma tenda da Comissão de Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Rio Grande do Sul eram coletadas assinaturas para protocolar o Estatuto da Diversidade no Congresso Nacional. Para isso, são necessárias 500 mil assinaturas. Representante da comissão, a desembargadora aposentada do Tribunal de Justiça (TJ) Maria Berenice Dias destacou os direitos conquistados até agora pela população LGBT, como o casamento homoafetivo e a adoção de crianças por casais gays, graças à sensibilidade do Poder Judiciário.
“Precisamos de uma lei que assegure os direitos e criminalize a homofobia”, afirmou ela, que foi pioneira em reconhecer direitos homoafetivos no Estado. Maria Berenice fez, ainda, duras críticas ao Estatuto da Família, proposta que está tramitando na Câmara dos Deputados e que define família como a união de homem e mulher ou quando apenas um dos pais arca com a criação dos filhos. “Esse estatuto será um desastre se passar”, alertou a desembargadora aposentada.
Distribuição de cartilhas
Em outra tenda, integrantes do PSOL distribuíam uma cartilha voltada à população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. Lançada recentemente pela bancada do partido na Assembleia Legislativa, o documento reúne textos sobre as legislações em vigor para a população LGBT. Foram levados para a Redenção 8 mil exemplares da cartilha. “Queremos conscientizar o maior número de pessoas sobre seus direitos”, informou Taynah Ingnácio, integrante do PSOL.

Em meio às milhares de pessoas, muitos participantes também procuravam passar mensagens contra o preconceito e em defesa dos seus direitos. O advogado Vagner Oliveira e o Vice-Mister Diversidade do Rio Grande do Sul, Renan Chiaradia, foram vestidos de anjos com enormes asas. “A gente quer mostrar que é família e também merece o céu”, justificou o advogado sobre a fantasia, acrescentando que a Parada Livre “não é um momento só de festa”, mas também para lutar “por mais direitos”. “O grande objetivo é conscientizar o Brasil, País onde mais morre LGBT”, completou Chiaradia, em relação ao propósito de eventos como a Parada Livre de Porto Alegre.
Já a estudante de Psicologia Laura Possamai carregava um cartaz com a frase “Amor sem limites”. “A coisa mais importante é a visibilidade, tem gente que não entende o movimento LGBT. Nós somos iguais as outras pessoas”, argumentou. A estudante enfatizou, ainda, que as pessoas têm o direito de amar outras do mesmo sexo.
Apelo de mãe
O apelo pelo amor sem limites também foi feito no palco. No momento de maior emoção da Parada Livre, a coordenadora do coletivo independente Mães pela Diversidade, Renata dos Anjos fez um apelo para que as famílias apoiem seus filhos. “LGBT não é filho de chocadeira, nossas famílias existem, nossos filhos existem”, desabafou ela. O coletivo tem sede em São Paulo e no Rio Grande do Sul funciona uma coordenadoria que acolhe os pais e ajuda no processo de aceitação dos filhos, inclusive disponibilizando advogado e psicólogo. “A vida da pessoa muda quando a família adota”, disse Andes sobre as experiências que tem acompanhado.
Ao final das manifestações, vários políticos subiram ao palco, mas só o secretário de Direitos Humanos da Capital, Luciano Marcantônio, falou em nome do grupo. “Nós não vamos nos curvar ao conservadorismo”, avisou, fazendo referência a projetos que tramitam no Congresso Nacional e que retiram direitos LGBT.
A Parada terminou com a tradicional marcha pelas vias dos arredores do Parque da Redenção. Os shows, entretanto, ocorreram até as 22h.
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