
Felipe Prestes
Sempre com orçamento pequeno em relação a áreas consideradas mais prioritárias, a cultura tem tido duas formas principais de financiamento. Numa delas, empresas deixam de pagar impostos para financiar projetos culturais pré-aprovados pelos governos, são as leis de incentivo à cultura. Noutra, o estado transfere os recursos diretamente para projetos culturais, escolhidos por meio de editais – aqui no Rio Grande do Sul isto ocorre por meio do Fundo de Apoio à Cultura (FAC). Esta dicotomia se encontra presente nas propostas dos principais candidatos ao Palácio Piratini, assim como há quem pense que nenhuma das alternativas serve.
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O plano de governo de Tarso Genro (PT) propõe “equilibrar” o orçamento do FAC ao da Lei de Incentivo à Cultura do Rio Grande do Sul. A LIC vai liberar R$ 125 milhões em recursos para a cultura de 2011 até o final de 2014 (o limite é de R$ 35 milhões anuais); enquanto o FAC liberou R$ 20 milhões entre 2012 e 2014.
O plano de Ana Amélia Lemos (PP), por seu turno, propõe a ampliação da Lei de Incentivo à Cultura e não menciona o FAC. A candidata preconiza a democratização do acesso à LIC. “Ampliação da Lei Estadual de Incentivo à Cultura, democratizando o acesso aos recursos, contemplando a diversidade cultural e artística do estado, evitando o privilégio a determinados grupos ou pessoas que possam ter maior grau de articulação”, afirma o texto.
José Ivo Sartori (PMDB) também menciona apenas a LIC e defende a necessidade de democratizá-la. “Utilizar os recursos viabilizados pela Lei de Incentivo à cultura de forma equilibrada, por meio de editais de concorrência pública e com atenção à diversidade da produção cultural”, afirma o programa do peemedebista.
A candidatura de Vieira da Cunha (PDT) tem uma visão bem diferente sobre o financiamento da cultura. Editais, seja para FAC ou LIC, têm favorecido grandes produtoras, afirma Caco Coelho, ex-diretor da Usina do Gasômetro e responsável pelo plano de governo do pedetista na área da cultura. “É preciso inverter a lógica. Edital é dizer não para a maioria. O governo tem que ir no encalço de todos. Artista não tem que provar que é artista”.

O representante da Região Sul no Colegiado Setorial de Música do Conselho Nacional de Política Cultural, Ricardo Bordin, concorda que há falhas no sistema de editais. “Eles são engessados. Se imaginou inicialmente que isto fortaleceria o artista, mas, geralmente, ele não tem know how para elaborar projetos, então precisa contratar um produtor. Acabou fortalecendo as produtoras, criando um mercado dos editais”, afirma. Apesar disto, Bordin acredita que os editais são necessários, porque eliminam arbitrariedades. “A tendência é que com o tempo o artista se capacite para concorrer em editais”.
Quanto à dicotomia entre Fundo de Apoio à Cultura e Lei de Incentivo, Ricardo Bordin afirma que o Fundo é melhor para o pequeno artista. “A LIC funciona como um patrocínio, só que com dinheiro da população, pois são recursos de isenções fiscais. A empresa quer o nome dela vinculado a grandes artistas, não vai escolher o pequeno. O fundo não está à mercê destes interesses”.
Vieira defende apoio a grupos de trabalho continuado
“Reconhecer e fomentar, de modo sistemático, os milhares de grupos de arte presentes no Estado, dispondo como reciprocidade o complemento à educação, promovendo oficinas e fortalecendo o binômio arte/educação” é o trecho do programa do candidato do PDT destacado por Caco Coelho. O ex-diretor da Usina do Gasômetro relata que recentemente a Famurs fez um mapa da cultura no Estado e detectou a presença de mais de 10 mil grupos de arte, como corais, bandas, orquestras, entre outros. “Isto é uma massa que é o grande foco de resistência. É nestes grupos de trabalho continuado que está o resíduo cultural. Isto jamais foi olhado. O primeiro passo é reconhecer estes grupos”, afirma.

Segundo Coelho, estes grupos poderiam ajudar na integralização da educação. “A educação integral não é só estar no espaço físico da escola. Potencializar os grupos de arte que têm trabalho continuado é também integralizar a educação”, diz. Segundo o plano de governo, o fomento a estes grupos teriam reciprocidade com a participação deles na educação, com oficinas, entre outras atividades. A escola também está presente no plano de Vieira da Cunha na proposta de desenvolver o teatro amador nas escolas gaúchas. Seriam criados concursos de teatro para alunos das diversas faixas etárias.
Tarso propõe ampliação de pontos de cultura
Além do aumento dos recursos para o FAC, o plano de governo de Tarso Genro propõe a ampliação de outros programas, como a pontencialização de Pontos de Cultura, Serão 160 pontos apoiados até o final de 2014 e a meta é dobrar este número até 2018, segundo o coordenador do plano de governo do petista, Marcelo Danéris. Incremento também deve acontecer no quadro de servidores da Secretaria Estadual de Cultura, com contratação de servidores e valorização. Parte desta reestruturação se daria pela criação da Fundação de Artes do Rio Grande do Sul.

Também estão entre as propostas a modernização de bibliotecas em todo o estado – foram contempladas 110 na atual gestão e a meta também é dobrar este número – e de museus, por meio do PAC Cidades Históricas. Marcelo Daneris destaca também a continuação das obras que a atual gestão iniciou, como a construção da nova sede da OSPA, a reforma na Casa de Cultura Mário Quintana e na Biblioteca Pública do Estado.
Sartori quer regionalizar a cultura
Assim como candidaturas apresentam propostas de descentralizar de Porto Alegre áreas como a saúde e a segurança, a candidatura de José Ivo Sartori apresenta a proposta de fazê-lo na cultura. “A ideia principal é a regionalização. Estímulo a equipamentos e atividades culturais no interior. Porto Alegre já tem o suficiente”, afirma o coordenador do plano de governo de Sartori, João Carlos Brum Torres. Entre as propostas neste sentido estão a formulação de políticas culturais para macrorregiões do Estado “centradas em alguns centros urbanos importantes, que possam exercer um papel catalizador (sic) para as atividades culturais de localidades menores em seu entorno”.

O programa peemedebista também propõe estímulos para projetos culturais que “possam gradativamente adquirir estabilidade financeira, tornando-os o mais possível independentes do patrocínio público continuado”. Além disto, há proposta de “revitalizar o projeto de um polo regional de cinema” no estado. O plano de Sartori também dá ênfase a cursos profissionalizantes para a cultura.
Programa de Ana Amélia para cultura tem dois parágrafos
Um dos dois parágrafos do programa de Ana Amélia Lemos para a cultura traz a proposta de ampliar a Lei de Incentivo à Cultura e já foi descrito no início da reportagem. O outro parágrafo traz algumas ideias para a área, não exatamente propostas. Segue na íntegra:

“Nosso estado tem uma bonita história de preservação de suas origens e tradições culturais. Cabe ao Governo Estadual a definição de políticas culturais que valorizem os talentos locais, oferecendo liberdade e autonomia aos artistas, para que a criatividade floresça pelos quatro cantos do Rio Grande. O objetivo principal de uma política cultural é o de criar condições para a sua produção e veiculação. Deve ser plural, criando espaços para a manifestação cultural em diversas áreas, seja na música, dança, artes plásticas, artes visuais, cultura de rua, literatura, entre outras formas de expressão cultural”.
O que dizem os demais candidatos
O plano de Roberto Robaina (PSOL) critica a LIC por dar incentivos fiscais a eventos que muitas vezes não precisariam do apoio e que cobram ingressos inacessíveis a grande parte da população. A LIC em um eventual governo psolista passaria a incentivar projetos que visem à produção de artistas locais. O FAC teria sempre 50% dos recursos da LIC. O plano também prevê o incentivo à criação de centros culturais.

O programa de Humberto Carvalho (PCB) prevê o fortalecimento da TVE, “com programação voltada para a cultura e a livre circulação de informações, para a garantia de mais densidade cultural na programação e de não interferência política dos interesses econômicos na geração e difusão de informações”. Edison Estivalete (PRTB) inclui a cultura entre as áreas em que o Estado deve promover a “expansão dos mercados e das relações internacionais, em um ambiente de cooperação e integração regional com o Mercosul, América Latina e países emergentes”.