
Débora Fogliatto
Com o objetivo de discutir a intersecção entre identidade de gênero e raça, acontece em Porto Alegre o 1º Fórum Nacional de Pessoas Trans Negras e Negros (Fonatran). O evento iniciou nesta quarta-feira (20) e vai até sábado (23), promovendo encontros entre ativistas, pesquisadores e gestores transexuais e travestis de todo o país, para discutir questões relacionadas aos direitos humanos da população trans afro-brasileira.
O Fonatran surgiu em julho do ano passado, durante um encontro de pessoas trans do nordeste, quando se falou da necessidade de haver uma “rede que integrasse pensamentos para lidar de forma interseccional com a questão do racismo e da transfobia”, explica Alessandra Ramos, uma das coordenadoras do Fórum. “Entendemos que isso potencializa a vulnerabilidade dessa pessoa frente ao Estado, achamos importante o empoderamento para que a gente possa buscar políticas que deixem de invisibilizar essa população, que sofre um duplo estigma”, apontou ela, que também é intérprete de Libras e assessora do deputado Jean Wyllys (PSOL) no Rio de Janeiro.

As pessoas negras são mais de 79% da população de transexuais e travestis, segundo a outra coordenadora do Fórum, Jovanna Cardoso. “Muitas vezes, elas não são empoderadas dessa discussão. Já existem redes afro LGBT, mas não o recorte específico de travestis e transexuais negros”, apontou, afirmando que é preciso começar a discutir para averiguar os casos de transfobia combinados com racismo. “Sabemos que essas pessoas estão segregadas, estão na marginalidade”, lamentou.
As mulheres trans e travestis negras são também as que compõem a maioria das que acabam se prostituindo, conforme apontaram as coordenadoras. “Nós queremos que a prostituição seja uma das opções delas, e não um destino certo. O direito de escolha é fundamental”, colocou Alessandra. Por isso, elas consideram que a realização do evento, com a presença de pesquisadores e gestores transexuais, é fundamental. A própria Jovanna é coordenadora Municipal da Coordenadoria de Direitos Humanos de Picos, no Piauí, e uma das pioneiras do movimento trans brasileiro.
As duas ressaltaram a importância da realização do evento em Porto Alegre, onde há uma secretaria-adjunta de Livre Orientação Sexual, coordenada por Glória Crystal, e uma coordenadoria de Diversidade Sexual no âmbito estadual, comandada por Marina Reidel. “Queremos ressaltar a importância da Glória, sabemos que o fato dela estar na gestão e ter acesso não quer dizer que ela não é discriminada por ser trans e negra. Essa mulher precisa estar reverenciada e reconhecida, respaldada nacionalmente”, elogiou Jovanna.
A secretária-adjunta, que agora deve aderir ao Fórum, respondeu emocionada que Porto Alegre é pioneira em políticas públicas para pessoas LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuaus). “É uma responsabilidade muito grande e estamos muito orgulhosos justamente por isso, tenho certeza que é o primeiro de muitos. Eu digo que Porto Alegre é a capital da diversidade, trabalhamos um passo a frente nas políticas públicas LGBT”, orgulhou-se.

Marina Reidel, coordenadora estadual da Diversidade, mencionou que há diversos avanços nas discussões relacionadas às pessoas trans. “Há 20 anos isso aqui não era possível, hoje temos pessoas que estão estudando, sendo gestoras, que de alguma forma estão inseridas e dando visibilidade para esse movimento”, avaliou, ponderando que mesmo que seja um “trabalho de formiguinha”, as melhorias estão sendo construídas.
Dentre as pessoas presentes no início do evento, cerca de três eram homens trans. Essa população, historicamente invisibilizada, está começando a reivindicar espaços, conforme explicou Leonardo Pessani, diretor de pesquisa do Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (Ibrat). “Já havia homens trans, mas estamos começando a nos organizar agora. Éramos invisibilizados inclusive pela mídia”, destacou.
O encontro contará com cerca de 30 pessoas, por ter o objetivo de ser uma reunião inicial, mas com representações de todo o país. O evento segue, após a abertura oficial nesta quarta-feira (20), às 19h, com as presenças dos secretários de Direitos Humanos do município e do estado. Na sexta-feira (22), o evento receberá também o ministro Pepe Vargas. O Fonatran é aberto ao público local que queira assistir e acontece no auditório do PROCONRS, Rua 7 de Setembro, 723, 4º andar.
Confira a programação do evento:
Dia 20/05 – 1º Dia
EIXO TRANSVERSAL I: Direitos Humanos da População Trans Afro-Brasileira. “Nós Existimos e Exigimos Respeito”!
14h30 – Lançamento do “Relatório sobre a Situação de violação de Direitos Humanos de Mulheres Travestis e Transexuais Afro-Brasileiras”
Alessandra Ramos-FONATRAN
15h00 – Mesa:
Situação de Direitos Humanos da População Trans Afro-Brasileira, Violações, Combate à Violência, ao Racismo, Políticas Públicas e o Estado Brasileiro. Onde Estamos? Onde Queremos Chegar?
Politicas Nacional de Saúde Integral da População LGBT, e da População Negra.
Andrey Lemos – DAGEP-SEGEP-MS
Luciano Palhano – FONATRAN
18h00 – Coffee Break
19h00 – Abertura Oficial com presença de autoridades
Secretario da SJDH RS
Secretario Municipal de Direitos Humanos
Jovanna Cardoso FONATRANS
Luciano Palhano – FONTRAN
Gloria Crystal – SALOS POA
Show Cultural com Valeria Houston – Mulher trans, negra, cantora
Dia 21/05 – 2° Dia
EIXO TEMÁTICO II: Experiências e Expressões da População Trans Negra. Na Cultura, Educação e na Vida. Como somos vistos, como nos queremos ver?
09:00 – Mesa: Educação Afro-Brasileira: A Lei 10.639/03 e seus diálogos com a comunidade escolar quando falamos de pertencimento.
Diretora da Escola Estadual General Ibá Ilha Moreira, Adriana Souza. Doutoranda em educação UFRGS Eliane Almeida de Souza
Mediação: Marina Reidel – Mulher trans, professora, mestra em educação UFRGS- Coordenadora Estadual de Políticas LGBT do RS
11h00 – Mesa: Aquele Sapatão Preto ou Aquele Negão Traveco? Ou ainda, estão falando de nós ou por nós ou não se está falando nada?! As representações de pessoas trans no discurso e no imaginário coletivo.
Gloria Crystal – SALOS POA
Mediação: Cris de Madri, Articulação – FONATRAN.
13h00 – Almoço
EIXO TRANSVERSAL III – Saúde da População Trans Negra. Ainda Lutamos por Inclusão e Visibilidade…
14h30 – Mesa: Panorama Geral da Saúde, Populações trans e (In) visibilidade Institucional.
Maria Clara – FONATRAN
Fernanda Moraes Sousa – FONATRAN
16h30 – Mesa: Doenças da População Negra e novas Tecnologias de Prevenção ao HIV/DST/AIDS. Como Visibilizar a população Trans afro descendente frente às políticas Públicas. (Convidado do RS para falar + outras indicações).
Dra. Simone Ávila – DST/AIDS POA
Júlio Barros – ONG Criolos
Dia 22/05 – 3° Dia
10h00 Atividade Cultural – Passeio com o ônibus de turismo pela cidade de Porto Alegre. Saída do Mercado Público.
11h00 – Grupos de Trabalho – quatro temas: saúde, educação, cultura e trabalho e renda. (Funcionará como propostas para encaminhamento para as Conferências – continuidade no dia 23)
13h00 – Almoço
EIXO TEMÁTICO III: Experiências e Expressões da População Trans Negra. Na Cultura, Educação e na Vida. Como somos vistos, como nos queremos ver?
14h30 – Mesa: Representações Acadêmicas e (Im) Possibilidades Discursivas dos Corpos Trans.
Professora transexual Helena SMED
Policial Fernanda (BM POA)
16h30 – Apresentação de Trabalhos e Propostas dos Grupos de Trabalhos
18h30 – Atividade Cultural com Ângela Leclerry
Grupo Artístico gaúcho
Dia 23/05 – 4° Dia
09h30 – Consolidação de propostas e elaboração de documento final do Seminário / Atividades Plenárias
12h00 – Encerramento