
Luís Eduardo Gomes
Desde o início deste ano, quando a Trensurb colocou em circulação novos trens, passageiros reclamam que o sistema de transporte ferroviário metropolitano tem apresentado mais problemas do que anteriormente e questionam se foi uma decisão acertada incorporar as novas composições ao sistema. A Trensurb confirma o aumento no número de falhas técnicas, porém, diz que já eram esperadas e fazem parte de um período de adaptação do novo sistema, com a perspectiva de estabilização para o ano que vem.
O aumento no número de problemas é recorrente entre quem utiliza o meio de transporte diariamente. A usuária Mariana Leite, que pega o Trensurb todos os dias para ir e voltar do trabalho, afirma que a situação está “horrível”. “Eu odeio o trem novo. Dependendo da estação, para várias vezes”, diz, enquanto aguarda por um trem na estação Aeroporto.
Pedro Nunes utiliza o serviço de trens todos os dias para ir de Canoas, onde mora, para Porto Alegre, onde estuda e trabalha, e também percebeu o aumento nos problemas desde a implantação dos novos veículos. “Toda semana passou por uma situação dessas”, afirma.
Por outro lado, João Batista Varriento, também um usuário diário do trem, diz que não notou nenhuma diferença do número de atrasos para anos anteriores. “Atraso sempre tem, mas nada fora do normal”, disse.
Contudo, a própria Trensurb reconhece que estão ocorrendo mais atrasos neste ano do que no ano passado por causa dos trens novos. “Essa sensação de aumento de atrasos é verdadeira e estão diretamente relacionados aos trens novos”, afirma Carlos Belolli, diretor de Operações do Trensurb.
De acordo com a assessoria de comunicação da companhia, o número de reclamações de usuários em relação aos trens novos também aumentou bastante. Um passageiro, inclusive, chegou a enviar uma carta pedindo que as novas composições não circulassem até Novo Hamburgo.
Porém, este aumento de atrasos já era esperado para os técnicos da Trensurb. Há até mesmo um termo técnico para isso: curva de bacia. “Quando tu colocas um novo sistema para operar, ele necessariamente passa por essa curva da bacia. Ele tem uma maior incidência de falhas no início de sua vida útil, depois ele estabiliza e, no final da sua vida útil, volta a ter uma quantidade alta de falhas”, diz Belolli.
O diretor salienta ainda que as falhas ocorrem no início devido a defeitos de instalação de componentes, falhas de projeto, falhas de fabricação e componentes inadequados.
“No início de implantação de qualquer sistema complexo, como são os novos trens, ele começa a apresentar essas falhas de sistema e, quanto mais tu atuas na manutenção, mais falhas ele vai apresentar. Ele apresenta nesse período as falhas que vão deixar de surgir posteriormente”, diz. “Lamentavelmente, a gente precisa pedir sim um pouco de paciência para o usuário nesse momento em que estamos inserindo um novo sistema”.

Falha segura
Uma dos motivos para as falhas nos novos trens, da chamada série 200, é o fato de eles terem uma dependência maior de softwares – existem 15 programas responsáveis por controlar diferentes etapas do processo de circulação dos trens. “Cada vez que a gente identifica a necessidade de ajuste em um software, a gente tem que ajustar os outros também, porque todos eles se comunicam”, afirma.
Outro motivo é o sistema chamado de “falha segura”. Segundo Belolli, cada vez que alguma falha é detectada pelo sistema – e não necessariamente precisa ser um problema que coloque em risco os passageiros -, o trem é parado.
“Qualquer falha que coloque em risco o sistema, faz com que o sistema automaticamente pare, para evitar qualquer risco para o nosso usuário. O sistema não tem a convicção de qual impacto isso tem na segurança, então ele para o trem até que a gente possa identificar qual é o problema e se tem impacto na segurança”, explica. “E este princípio, que para nós é fundamental, acaba influenciando nesses atrasos e nessas perdas de viagens”, complementa.
Uma falha a cada 200 km
O diretor de Operações da Trensurb afirma que existe um indicador ferroviário que mede a incidência de falhas por quilômetro rodado, o MKBF. Segundo ele, os trens antigos, da série 100, tem um MKBF de 9 mil, isto é, apresentam uma falha a cada 9 mil km rodados. Como os trens da Trensurb rodam 12,2 mil km por dia, isso significaria mais ou menos uma falha por dia em todas as viagens se fossem utilizados os trens antigos. Por outro lado, os trens da série 200 têm, atualmente, um MKBF em torno de 200, ou seja, apresentam uma falha a cada 200 km.
Segundo Belolli, a expectativa da Trensurb é que os trens novos atinjam a estabilidade da “curva de bacia” até o fim deste ano ou início do próximo. A partir daí, então, a série 200 deve apresentar menos falhas que a série 100.

Para efeito de comparação, o período de estabilidade dos trens da série 100, quando foram implementados na década de 1980, só veio após dois anos e meio de circulação, segundo Belolli.
Apesar de a Trensurb reconhecer o maior número de falhas, isto não tem tido um impacto expressivo em termos de aumento de minutos atrasados, o que vinha caindo drasticamente desde 2011, quando foram registrados 3.737 minutos de atrasos (0,089% do total). Ano passado, foram 1.142 minutos (0,024% do total) e, neste ano, 766 até agora (0,026% do total).
Além disso, foi registrada uma diminuição do trecho de viagens perdidas – quando o trem deixa de circular. Em 2011, por exemplo, foram 487 viagens perdidas (0,61% do total. Em 2013, ano de grandes manifestações que provocaram o fechamento da Trensurb em vários dias, foram 1.459 (1,64% do total). No ano passado, foram 426 (0,47% do total). Até junho deste ano, foram 153 (0,27% do total), média inferior ao ano passado.
Acidente em abril alarmou a população
O principal problema registrado na Trensurb este ano foi o descarrilamento de um trem no dia 7 de abril deste ano. Felizmente, ninguém ficou ferido porque a composição estava vazia. Contudo, o acidente provocou grandes transtornos e atrasou a vida de muitos usuários do sistema.
Após o acidente, todos os trens da série 200 foram retirados de circulação para passarem por manutenção, só voltando a circular no dia 19 de maio.
“O fator causador do descarrilamento foi uma folga excessiva em uma barra estabilizadora do trem. Essa folga, quando combinada com outros fatores, como a baixa velocidade e o fato do trem estar vazio, muito leve, é que fez com que o trem descarrilasse. Se o trem estivesse em uma velocidade maior ou tivesse carregado, não teria descarrilado”, diz Belolli. “A gente já corrigiu a folga que tinha na barra estabilizadora, isso exigiu uma melhoria no projeto de todos os trens novos, e só depois que implementamos a melhoria desse projeto é que colocamos os trens de volta para rodar”, complementou.
Novos trens diminuem o intervalo entre viagens
Atualmente, a Trensurb conta com 40 trens – 25 da série 100 e 15 da série 200. Desses 40, 37 estão em circulação normalmente. Um dos antigos está em manutenção de rotina – feita a cada 600 mil km rodados -, o trem que descarrilou em abril segue em manutenção e há uma composição que não foi comissionada, ainda está em fase de testes.
Apesar das falhas, Belolli explica que o aumento das frotas permitiu uma importante queda no intervalo de circulação dos trens. “O intervalo entre trens era de 6 minutos no horário de pico. Está em 3,5 minutos e esperamos que chegue a 3 minutos até o final do ano”, disse.