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10 de julho de 2015
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18:55

Colegas relatam medo de ir para a escola após jovem ser esfaqueado em Porto Alegre

Por
Luís Gomes
luisgomes@sul21.com.br
Comunidade escolar reclama de assaltos frequentes no entorno do Colégio Protásio Alves. | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
Comunidade escolar reclama de assaltos frequentes no entorno do Colégio Protásio Alves. | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

Luís Eduardo Gomes

Os alunos do Colégio Protásio Alves, na Avenida Ipiranga, em Porto Alegre, já estão acostumados aos assaltos constantes na entrada e saída da escola. Mas, nesta semana, foram surpreendidos com um caso de violência extrema. Um de seus colegas foi esfaqueado após deixar o local. A falta de segurança os levou a organizar protestos para exigir mais policiamento na área.

Guilherme, 17 anos, estudante do 3º ano, diz que todos os alunos do Protásio Alves ou já foram assaltados ou conhecem alguém que já foi. “A lista é grande. Tem outro caderninho aí para anotar?”, diz. Estudante da escola desde o 1º ano, ele relata que, até o início do ano passado, quase não se ouvia falar de assaltos na região, mas a situação começou a piorar do fim de 2014 para cá.

Gabrielly, 17 anos, estudante do 2º ano, conta que sempre tenta andar em grupos na saída do colégio, mas nem sempre essa tática funciona. Ela relata que, há cerca de duas semanas, um colega foi agredido e teve o celular roubado mesmo tendo saído da escola acompanhado de outros estudantes.

Segundo os jovens, os assaltantes são figuras bem conhecidas. Eles identificam um como um homem moreno, na casa dos 20 anos, com uma tatuagem de uma lágrima verde abaixo de um dos olhos e outro como “alemão”. Pelos relatos que ouvem dos colegas, as abordagens são sempre parecidas. “Eles chegam botando o braço em volta do pescoço e perguntam ‘que horas são?'”, diz Gabrielly, relatando que, na sequência, apontam a faca para os estudantes, pedem o celular e depois saem correndo.

A direção também afirma que os assaltantes são figuras conhecidas. “Semana passada, a professora de Educação Fìsica foi na rua e falou com os assaltantes. Um deles tinha uns 10 celulares na barriga, enfiado nas calças”, conta Ana Maria de Souza, diretora da escola.

A Brigada Militar reconhece que já recebeu denúncias sobre o homem com a “lágrima tatuada”, mas até o momento ele não foi identificado.

 | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
Rosângela Machado é mãe de uma aluna do 1º ano e conta que reforçou os cuidados com a filha | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

Alunos estão assustados

Denner Centeno foi esfaqueado na noite da última quarta (8) ao deixar a escola durante uma aula de Biologia. Segundo a direção da escola, ele foi visto saindo na direção da rua João Pessoa e teria sido atacado na altura da General Lima e Silva. Ele retornou à escola após ser atacado e só então foi chamado o atendimento do Samu.

Rosângela Machado, tia de Denner, conta que ele foi esfaqueado no peito, próximo ao coração. Ela diz que o menino está melhorando, mas ainda corre risco de vida. Segundo o Hospital de Pronto Socorro (HPS), o adolescente segue internado na UTI em estado grave.

Rosângela também tem uma filha no 1º ano no Protásio Alves. Ela diz que a preocupação é constante. “Nunca deixa minha filha vir sozinha e digo para nunca andar com celular à mostra”, afirma. Segundo ela, as ruas Marcílio Dias e João Neves da Fontoura são as mais perigosas da região.

Até o caso envolvendo Denner, os alunos dizem que a maioria das ocorrências era de roubos de celular.  Em geral, não havia agressão. Pela violência do ataque, estudantes e professores passaram a ficar mais preocupados. Na última quinta-feira (9), eles organizaram manifestações em frente ao colégio nos três turnos de aula para chamar a atenção para a falta de segurança no local.

“A gente tem medo de vir para a escola, mas vem porque é a obrigação”, diz Giuliana, 17 anos, estudante do 3º ano.

 | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
O vendedor ambulante, Rodrigo Batista, trabalha em frente à escola e  acompanha a rotina de assaltos | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

“Estamos bem assustadas”, reforça a colega Thalia, 17 anos. “Antes tu via assaltos, mas não era assim. Esse ano está muito pior”, complementa, salientando que as meninas se sentem mais assustadas porque são um alvo mais fácil.

As duas dizem que até veem policiais no entorno da escola, mas que eles não ficam muito tempo. “Eles ficam dez minutos e vão embora”, diz Giuliana.

Rodrigo Batista, 37 anos, é ambulante e trabalha em frente ao Protásio Alves desde 2012. Ele diz que, com frequência, vê os estudantes sendo assaltados na parada de ônibus da Avenida Érico Veríssimo e na Avenida Ipiranga, próximo a rua Gen. Lima e Silva. “Ali é um lugar com muitas árvores, deserto, só passa carro”.

Ele afirma que a Brigada Militar já fez uma ação recente na escola. “Mas não logrou êxito”, afirma. Ele ainda diz que, no dia a dia, só vê viaturas rondando o colégio, não vê policiais a pé ajudando no policiamento da região.

 | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
Ana Maria de Souza, diretora da escola, acredita que a violência na região aumentou neste ano, pois ocorre em qualquer horário | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

Assaltos estão se tornando mais violentos

Diretora da Protásio Alves, Ana Maria de Souza relata que a escola já tomou conhecimento de pelo menos 50 casos de assaltos nas imediações da escola só neste ano. Contudo, ela afirma que o número de casos deve ser muito maior, porque vários alunos não relatam. “A gente descobriu que, na noite que o menino foi esfaqueado, uma menina foi assaltada 30 minutos antes dele. Ela disse que foi a segunda vez, só que ela nunca tinha nos falado”.

Segundo a diretora, a situação de violência no entorno da escola piorou consideravelmente de um ano para cá. “No ano passado, a gente já teve muitos assaltos, mas nunca houve uma violência desse tipo”, disse, ressaltando que os casos não se limitam a apenas roubos de celulares e que ocorrem em todos os turnos, não apenas durante a noite.

Ela conta que, há cerca de duas semanas, duas meninas foram agredidas por assaltantes ao descerem do ônibus na Avenida Érico Veríssimo, por volta das 7h30. “Uma das meninas era super magra e uns caras grandões deram dois socos na cara dela. Levaram celular e botaram a faca na cara dela”, afirma Ana Maria.

Em outro caso, um menino passou por um caso de sequestro relâmpago. “Pegaram um menino em frente à Procempa e largaram lá no Padre Réus só de ceroula. Levaram tudo dele, mochila, tênis”, diz Ana Maria, acrescentando que o menino saiu da escola após sofrer esse trauma.

A diretora culpa a diminuição do policiamento na região pelo aumento da violência. “Eu acho que diminuiu (o policiamento). Até o ano passado, a gente tinha uma patrulha escolar, e este ano não tem mais”, afirma, salientando que a Brigada Militar não teria informado os motivos para a retirada da patrulha.

 | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
Ao menos 50 alunos já teriam sido assaltados só este ano | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

Alunos não registram casos

De acordo com o tenente Nunes, do 1º Batalhão de Polícia Militar, localizado no bairro Menino Deus, o número de ocorrências registradas está muito abaixo do relatado pela escola, apenas cinco casos teriam sido registrados esse ano.

O tenente salienta que é essencial que os estudante registrem um Boletim de Ocorrência para que a Brigada tenha conhecimento da situação e possa direcionar seus esforços de forma adequada. Segundo ele, já existe um reforço de policiamento no local nos horários de entrada e saída da escola, mas não seria possível estar presente em todos os horários. Denner, por exemplo, foi atacado ao deixar a escola durante o período de aula.

 | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
O colégio conta com câmeras de vigilância e segurança privada, mas para área interna| Foto: Caroline Ferraz/Sul21

“O jovem estava fora do horário de [saída da] aula, fica complicado porque não temos condições de manter uma viatura durante todo o horário de funcionamento da escola”, disse o tenente Nunes.

Os alunos, porém, afirmam que nem a presença policial afasta os assaltantes. Eles relatam que já ocorreram casos de assalto próximos à escola mesmo em dias que a polícia estava presente no local.

Para tentar orientar os alunos a se proteger melhor, a BM fará palestras em que orientará os alunos sobre uma “conduta segura”, que inclui as recomendações de não andarem sozinhos em locais ermos, evitarem locais escuros, não “ostentarem” celulares caros na parada de ônibus, entre outras ações.

Comissão da Câmara discutirá o tema                                                  

Na próxima quinta-feira (16), a Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Urbana (Cedecondh) fará uma audiência emergencial para tratar do tema. O vereador Alex Fraga (PSOL), que esteve presente nos protestos organizados por alunos e professores ao lado da vereadora Fernanda Melchionna, diz que o objetivo é estudar medidas que possam ser tomadas para melhorar a situação de segurança nessa e em outras escolas. “Apesar de a segurança pública não ser de responsabilidade do município, está todo mundo muito preocupado”, disse o vereador.

Ele ainda reclama que há um descaso da Brigada Militar em relação à proteção das escolas públicas. “Infelizmente, nós percebemos que há patrulhamento nas saídas de escolas privada, que já contam com segurança privada, enquanto as escolas estaduais ficam desguarnecidas. O que é uma contradição”, diz.

Cartazes em frente à escola chamam a atenção após o crime desta semana | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
Cartazes em frente à escola chamam a atenção após o crime desta semana | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

 


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