
Jaqueline Silveira
Encravado no extremo sul de Porto Alegre, o abrigo de grandes animais da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) recebe cavalos encontrados soltos ou abandonados nos quatro cantos da Capital, ou ainda, que sofreram maus-tratos dos seus donos, ainda que ajudando no sustento da família.
Alguns chegam num estado crítico e são submetidos a um tratamento intensivo nas 12 cocheiras para se recuperarem. Na última quarta-feira (13), um dos cavalos, encontrado no início da semana abandonado no Porto Seco, zona norte, não tinha nem condições de se levantar. Tomado pela fraqueza, o animal ainda tinha lesões nas pernas. Já nesta sexta-feira (15), o animal deu sinal de reação conseguindo parar de pé e até começou a comer. Outro cavalo, que chegou à área verde em condições parecidas e com uma perna encurtada em razão de maus-tratos, já apresentava melhora significativa, apesar de ainda muito magro.

Já Ceguinho está muito bem, apesar da falta de visão. Está gordo e com o pelo bonito. “Esse é o mascote, é muito manso”, diz Gilberto Machado Fonseca, um dos integrantes da equipe de Fiscalização de Veículos de Tração Animal da EPTC. Como descreveu Fonseca, Ceguinho não é arredio, apesar da crueldade que sofreu. Ele vai completar quatro anos como inquilino do abrigo. O cavalo foi parar no local depois de ser encontrado solto no Arroio Dilúvio, na Avenida Ipiranga, e cego. Responsável pelo abrigo, Denízio Pires Corrêa conta que o animal deve ter ficado cego na noite anterior ao dia que foi encontrado pelo estado em que chegou ao local com os olhos ensanguentados. Embora não enxergue, Ceguinho responde às ordens dos cuidadores. É obediente.

Os cavalos estão espalhados por toda a parte: pelas cocheiras, pelo pátio e campo, dependendo da situação em que chegam ao abrigo, de 20 hectares. Atualmente, são 58 à espera de um dono. Há três anos, o abrigo mantém o programa de adoção de animais. Conforme o coordenador da equipe de Fiscalização de Veículos de Tração Animal da EPTC, Tiago Oliveira, em 2015, 70 cavalos foram adotados, o maior número desde a implantação do programa. Os interessados em adotá-los devem procurar a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), na Avenida Erico Verissimo, 100, e preencher um formulário com número de identidade, CPF e endereço. Depois, o interessado passa por uma entrevista feita pelo tradicionalista Dorotéo Fagundes, do Instituto Cavaleiros Farroupilhas, por recomendação do Ministério Público (MP). Os trâmites para a adoção levam normalmente 40 dias.

Doados para equoterapia
“A gente tem todo um controle”, afirma Oliveira, que avalia os formulários, antes da entrevista. Uma vez por ano, o coordenador da Equipe de Fiscalização da Equipe de Veículos de Tração Animal vai até os locais onde vivem cavalos adotados com o fim de verificar se estão bem cuidados. Há donos que moram em lugares distantes da Capital, como Uruguaiana, e mandam com frequência e-mails com fotos e informações sobre a evolução dos cavalos depois da adoção. Oliveira também faz relatório de prestação de contas e envia ao MP, que acompanha e fiscaliza todo o processo. Muitos dos cavalos, informou ele, foram doados para o trabalho de equoterapia, ajudando na recuperação de crianças. “Dá muita alegria saber que os cavalos foram doados para equoterapia”, diz.
Às vezes acontece, segundo Oliveira, do adotante não ter mais condições de manter o animal. “Não tem problema nenhum, a gente vai e busca, e o processo que está arquivado é desarquivado. Já aconteceu de um cavalo ser adotado duas vezes”, relatou ele. Além do controle pelas visitas, o monitoramento pode ser feito a qualquer momento. Assim que entram no abrigo, os animais se submetem a um procedimento cirúrgico feito por um médico veterinário para a colocação do chip. “Todos são chipados para podermos rastrear depois”, frisa o coordenador.

Os animais encontrados soltos e levados para o abrigo podem ser retirados em até 15 dias pelos proprietários. Depois, os cavalos estão aptos a serem adotados. Já as carroças apreendidas – na maioria das vezes em casos de maus-tratos aos cavalos -, pela equipe da EPTC permanecem por 90 dias, mas, conforme Oliveira, normalmente não são retiradas. Depois do prazo, são encaminhadas ao Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) para o descarte.
O coordenador da equipe de Fiscalização de Veículos de Tração Animal da EPTC comenta que o programa de adoção é referência no Brasil e que outros Estados, como Maranhão e Paraíba, já pediram informações sobre a iniciativa.

A área onde está localizado o abrigo não é da EPTC. Segundo Oliveira, foi aberta uma licitação para a prestação do serviço. O vencedor do processo licitatório fornece o terreno, caminhões com motoristas, cuidadores e médico veterinário. A EPTC só fiscaliza o trabalho e aciona o responsável pelo abrigo para buscar os cavalos. Entre os meses de março e abril, novos inquilinos devem chegar ao local. Isso porque em setembro deste ano encerra o prazo para a circulação de carroças no trânsito da Capital e a prefeitura está indenizando os donos dos cavalos, que terão como destino o extremo sul de Porto Alegre. Em 2015, a EPTC manteve 319 cavalos, mas em 2016, esse número pode aumentar. Então, não faltará cavalo para adoção. Basta se candidatar.
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