

Da Redação
Mais de 60 organizações assinaram, nesta semana, uma carta que denuncia retrocessos no sistema de proteção ambiental, de populações tradicionais e de trabalhadores do campo no Brasil durante os últimos anos – e que atualmente ganharam, de acordo com os movimentos, “uma nova dimensão”. O texto, que entre os signatários tem movimentos como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Central Única dos Trabalhadores (CUT), o Greenpeace Brasil, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a Via Campesina, critica a atuação do governo federal e da bancada ruralista no Legislativo.
A carta cita, por exemplo, a Medida Provisória 759/16, que trata da regularização fundiária no campo e nas cidades, da regularização fundiária no âmbito da Amazônia Legal e sobre os imóveis da União – e é caracterizada pelos movimentos como “aniquilação das políticas de reforma agrária e do uso social da terra”. Cita também o projeto, de autoria do governo Temer, que abre no país a possibilidade da venda de terras para empresas e investidores estrangeiros. “Para o avanço rápido desta agenda, governo e parlamentares armam tramitações expressas no Congresso e fazem uso desmedido de medidas provisórias”, diz o texto, expondo a ausência de participação da sociedade e de cientistas nas discussões públicas.
As entidades referem-se a temas como a soberania e segurança alimentar; a concentração de terras no país, a falta de viabilidade econômica de pequenos agricultores, de quilombolas e indígenas; da violência crescente na disputa por terras; ao desmatamento na Amazônia – que teve redução de 80% entre 2004 e 2014 –; a questões referentes à biodiversidade e ao aquecimento global; de direitos de povos indígenas e direitos humanos.
Conheça a lista de organizações signatárias e leia, abaixo, o texto na íntegra:
“Nos últimos anos, as agendas socioambiental, de direitos humanos e de trabalhadores do campo têm sido alvo de ataques sistemáticos por grupos de interesse instalados no Congresso Nacional e no Executivo Federal. Nem mesmo direitos garantidos pela Constituição estão a salvo.
Atualmente estes ataques ganharam uma nova dimensão. Em meio ao caos político que assola o país, a bancada do agronegócio e o núcleo central do governo federal fazem avançar, de forma organizada e em tempo recorde, um pacote de medidas que inclui violações a direitos humanos, “normalização” do crime ambiental e promoção do caos fundiário. Se aprovadas, tais medidas produzirão um retrocesso sem precedentes em todo o sistema de proteção ambiental, de populações tradicionais e dos trabalhadores do campo, deixando o país na iminência de ver perdidas importantes conquistas da sociedade ocorridas no período democrático brasileiro.
Às tentativas de aniquilação das políticas de reforma agrária e do uso social da terra, contidas na Medida Provisória (MP) 759, somam-se iniciativas de extinção de Unidades de Conservação, a facilitação e legalização da grilagem de terras e os ataques contra direitos e territórios indígenas.
Em conjunto, tais investidas buscam disponibilizar estoques de terras para exploração desenfreada e também para serem negociadas através do projeto que libera a venda de terras para estrangeiros.
A lista de retrocessos segue com as tentativas de enfraquecimento do licenciamento ambiental e da fiscalização sobre a mineração; a liberação do uso e registro de agrotóxicos, inclusive daqueles proibidos em diversos países do mundo; a ocupação de terras públicas de alto valor ambiental; a concretização das anistias a crimes ambientais e o ataque a direitos trabalhistas e sociais de populações camponesas e de trabalhadores rurais.
Para o avanço rápido desta agenda, governo e parlamentares armam tramitações expressas no Congresso e fazem uso desmedido de medidas provisórias, inclusive para temas que já se encontram em debate no legislativo, excluindo assim a possibilidade da participação da sociedade e de estudiosos dos temas.
Além de colocar em risco a nossa própria soberania e segurança alimentar, a aprovação de tais medidas resultará em maior concentração fundiária; na inviabilidade econômica de pequenos produtores rurais e da agricultura familiar, dos quilombolas e povos indígenas; no aumento da violência e da disputa por terras; no beneficiamento da grilagem de terras públicas e na mercantilização dos assentamentos rurais e da reforma agrária.
O desmatamento será impulsionado de forma decisiva, colocando por terra todo o esforço da sociedade que levou à redução do desmatamento na Amazônia em cerca de 80% entre os anos de 2004-2014, nos afastando do cumprimento de compromissos internacionais assumidos em convenções sobre clima e sobre biodiversidade, de direitos indígenas e direitos humanos. Este conjunto de fatores poderá potencializar as dinâmicas das mudanças climáticas, impondo graves prejuízos à economia, aos produtores rurais e à toda população do campo e das cidades.
A participação do governo na ofensiva orquestrada contra os direitos, territórios da diversidade e meio ambiente revela um retrocesso político histórico: além da renúncia à obrigação constitucional de tutela dos direitos difusos e de minorias, escancara uma concepção de País calcada no desprezo pela natureza e pelo conhecimento sobre ela em função de interesses econômicos imediatos, reproduzindo o modelo excludente de expansão do agronegócio e facilitando a implementação de projetos frequentemente ligados a esquemas de corrupção e má-gestão dos recursos públicos.
Diante do exposto, as organizações e movimentos dos mais diversos campos de atuação abaixo assinados se unem para denunciar e resistir à perversa agenda de desmonte das conquistas socioambientais, e convidam a população e demais setores organizados da sociedade a somarem esforços no sentido de impedir tais retrocessos.”
Assinam:
1. 350.org
2. Actionaid
3. AdT/Amigos da Terra
4. AFES/Ação Franciscana de Ecologia e Solidariedade
5. ANA/Articulação Nacional de Agroecologia
6. Amazon Watch
7. APIB/ Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
8. Apremavi/Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida
9. Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil
10. BVRio
11. CBJP/Comissão Brasileira Justiça e Paz
12. CIMI/Conselho Indigenista Missionário
13. Comissão Dominicana de Justiça e Paz do Brasil
14. Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração
15. Comissão Pró-Índio de São Paulo
16. CONAQ/Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas
17. Conectas Direitos Humanos
18. CNS/ Conselho Nacional das Populações Extrativistas
19. Consulta Popular
20. CPT/Comissão Pastoral da Terra
21. CUT/Central Única dos Trabalhadores
22. Engajamundo
23. Escola de Ativismo
24. FASE/Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional
25. Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social
26. FURPA/Fundação Rio Parnaíba
27. Greenpeace Brasil
28. Grupo Carta de Belém
29. GT Infraestrutura
30. IBASE/ Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas
31. ICV/Instituto Centro de Vida
32. IDESAM /Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas
33. IEMA/Instituto de Energia e Meio Ambiente
34. IMAFLORA/ Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola
35. IMAZO N/ Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia
36. INESC/ Instituto de Estudos Socioeconômicos
37. International Rivers Brasil
38. ISA/Instituto Socioambiental
39. Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais
40. MAM/Movimento pela Soberania Popular na Mineração
41. MCP/Movimento Camponês Popular
42. MMC/Movimento de Mulheres Camponesas
43. MPA/Movimento dos Pequenos Agricultores
44. MST/ Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
45. MTST/Movimento dos Trabalhadores Sem Teto
46. Núcleo de Estudos das Diversidades, Intolerâncias e Conflitos – Diversitas/USP
47. Núcleo de Pesquisa e Extensão em Ambiente, Socioeconomia e
Agroecologia/NUPEAS-UFAM
48. Observatório do Clima
49. Organon/Núcleo de estudo, pesquisa e extensão em mobilizações sociais da UFES
50. PHS/Hospitais Saudáveis
51. PJR/Pastoral da Juventude Rural
52. RAMH/Rede Acreana de Mulheres e Homens
53. Rede Brasileira de Informação Ambiental
54. REDE GTA
55. Sinfrajupe/Serviço InterFranciscano de Justiça, Paz e Ecologia
56. SBE/Sociedade Brasileira de Espeleologia
57. SOS Mata Atlântica
58. Toxisphera Associação de Saúde Ambiental
59. Uma Gota no Oceano
60. União Brasileira de Mulheres/UBM
61. UNALGBT/União Nacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais
62. Via Campesina
63. WWF Brasil