
A sequência de dez feminicídios em apenas cinco dias no Rio Grande do Sul, sendo seis deles registrados em um único dia, na sexta-feira (18), levou a Polícia Civil e a Secretaria de Segurança Pública do Estado a anteciparem a implementação de medidas voltadas à proteção das mulheres. Outras ações seguem em fase de desenvolvimento.
Em coletiva de imprensa nesta quinta-feira (24), em Porto Alegre, o Chefe da Polícia Civil do RS, Delegado Fernando Sodré, e o secretário de segurança pública do estado, Sandro Caron de Moraes, anunciaram iniciativas que já estavam sendo planejadas, mas que, diante da escalada de casos durante o feriado de Páscoa, começaram a ser aplicadas. Entre as ações anunciadas está a solicitação de medida protetiva de urgência online, a realização de visitas domiciliares a agressores de mulheres, desenvolvimento de grupos de reflexão com os agressores e operações permanentes de capturas a partir de denúncias.
Em sua fala, o Delegado Sodré aborda a situação dos casos de feminicídio no feriado como “um dia fora da curva”, destacando que o estado vem em queda no registro desse tipo de crime. “Nós estamos permanentemente acompanhando os dados criminais e essa questão do feminicídio, até o dia 18, que foi um dia fora da curva, e dia 20 também, de certa forma, nós tínhamos um viés de queda de quase 20% dos feminicídios e viemos no viés de queda desde 2022”, afirmou.
O destaque entre as ações anunciadas é a disponibilização da solicitação da medida protetiva online, por meio da Delegacia de Polícia Online da Mulher, visando tornar mais seguro para a vítima poder realizar a solicitação. Conforme dados da Polícia Civil, 93% das mulheres vítimas de feminicídios no Rio Grande do Sul não possuíam medida protetiva ativa contra seus agressores. O Delegado Sodré afirma que esses dados refletem a insegurança que as mulheres possuem em se locomover até uma delegacia e realizarem o pedido.
“A nossa leitura institucional e a prática tem mostrado que a maioria delas não fazem por medo e por insegurança. Medo de ir a uma delegacia e sofrer alguma retaliação. Então nós criamos um mecanismo, que é a medida protetiva online feita toda pelo sistema, pelo computador”, explica.
Conforme o Delegado, o melhor segue sendo a vítima dirigir-se a uma delegacia e realizar a denúncia pessoalmente, para obter um acolhimento profissional no momento, mas que, devido à situação em que muitas mulheres se encontram, a ferramenta torna-se uma opção mais segura.
A plataforma para a solicitação das medidas protetivas de urgência já está disponível e até a tarde desta quinta-feira, 14) pedidos haviam sido feitos pela plataforma, com dois deferimentos já expedidos pela Justiça. O tempo entre o pedido e o deferimento da primeira medida online foi de quatro horas, média semelhante ao atendimento presencial, segundo a SSP.
Outra frente anunciada envolve a realização de visitas domiciliares aos agressores que respondem a medidas protetivas. A ação, que já vem sendo realizada pela Brigada Militar, deverá contar com a adesão da Polícia Civil, mas não há um cronograma definido de mobilização, pois a demanda ainda necessita ser avaliada.
“Além das visitas às vítimas, que merecem toda atenção do estado e todo acolhimento, há um mês as patrulhas Maria da Penha da Brigada Militar passaram a fazer visita também aos agressores, para que eles tenham sempre de maneira muito clara na cabeça que estão sendo acompanhados pela segurança pública e para que isso os iniba de retomar uma agressão”, explica o delegado Sodré.
Já o grupo de reflexão, outra medida relata na coletiva, é uma ação ainda em fase inicial de desenvolvimento. Inspirado em uma experiência da Polícia Civil de Minas Gerais, o projeto será adaptado à realidade gaúcha e deverá atuar no início do processo de responsabilização, logo após o registro da ocorrência, com foco na conscientização e prevenção da reincidência. O Delegado Sodre explica que está sendo debatido o formato destas ações, que variará conforme a disponibilidade de recursos humanos e materiais.
Por fim, a última medida anunciada, é o início de operações permanentes de busca e captura com base em relatos de Disque-Denúncia ou de outros meios de comunicação, visando cumprir mandados em aberto relacionados a violência doméstica.
O Secretário Sandro Caron afirmou que novas estratégias de combate aos feminicídios e à violência doméstica seguem sendo estudadas. “O Estado nesse sentido tem que criar cada vez mais canais para que a gente busque ter conhecimento, enquanto Polícia Civil, instaurar o inquérito, pedir a medida protetiva de urgência e a gente evitar que uma situação de agressão evolua para o que há de pior que é um feminicídio”, afirmou.
Medida protetiva on-line
Já está disponível no site da Delegacia de Polícia Online da Mulher do Rio Grande do Sul a ferramenta que permite a solicitação de medida protetiva de urgência pela internet. Para acessar o serviço, é necessário ter uma conta no portal GOV.br, por meio da qual os dados da vítima são integrados automaticamente ao sistema da Policia Civil.
O primeiro passo é registrar uma ocorrência policial, de forma on-line na plataforma, e então solicitar a proteção. De acordo com o delegado Fernando Sodré, o detalhamento das informações é essencial para a efetividade do pedido. Na plataforma a vítima deve descrever de forma detalhada os episódios de violência, sejam físicos ou psicológicos. Também é possível anexar documentos, fotos e outros materiais que comprovem a situação.
Após o preenchimento das informações, a Polícia Civil analisa os requisitos legais e encaminha a solicitação ao Poder Judiciário. O prazo para análise é de até 48 horas, conforme previsto na Lei Maria da Penha. A medida passa a ter validade somente após o deferimento por um juiz.