
Em ato realizado nesta quarta-feira (8) no Palácio do Planalto, 21 obras restauradas após o 8 de janeiro retornaram oficialmente ao acervo da Presidência da República – incluindo um relógio pêndulo do século 18 e um quadro do artista Di Cavalcante. “A preservação desse legado que une cultura, história e democracia é responsabilidade de todos”, destacou a primeira-dama Janja da Silva, durante a cerimônia.
“A memória é um dos alicerces mais importantes da nossa identidade enquanto brasileiros. Sua preservação não é a apenas uma homenagem ao passado, mas também um compromisso com o futuro”, disse. “O restauro das obras de arte do palácio é a parte desse esforço comum com a nossa democracia. Não conseguiram impedir a liberdade nem destruir a beleza. Contra a violência e cinza do autoritarismo, fazemos brotar o colorido da nossa cultura e a alegria do nosso povo”.
A restauração das peças, segundo Janja, contou com a colaboração do governo da Suíça e da embaixada da Suíça no Brasil, do Ministério da Cultura por meio do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e da Universidade Federal de Pelotas. A restauração teve início em 2 de janeiro de 2024, com a montagem de um laboratório de restauração do Palácio da Alvorada, em espaço cedido pelo governo federal.
Cerca de 50 profissionais estiveram diretamente envolvidos no projeto, incluindo 12 professores da UFPel e dois da UnB, quatro técnicos, 14 alunos de graduação da UFPel e três da UnB, além de cinco conservadores-restauradores especializados, com a colaboração de profissionais da área de fotografia e audiovisual.
Foram mais de 1.760 horas trabalhadas no laboratório, e as atividades de restauro contaram com a produção de 20 relatórios técnicos detalhando o processo de recuperação de cada obra. “A gente está recuperando elementos, símbolos, bens que dizem sobre o que é o Brasil, que falam sobre o que somos. São peças de artistas que conseguiram expressar a nossa cultura e tradição. Quando a gente devolve esses bens à população, a gente está dizendo: ‘nós cuidamos do que é de todos’””, frisou o presidente do Iphan, Leandro Grass.

Na visão da professora da UFPel Andréa Bachettini, coordenadora do projeto de restauração, um dos trabalhos mais simbólicos foi o quadro “Mulatas”, de Emiliano Di Cavalcanti, que durante os ataques sofreu sete punhaladas. Avaliada em cerca de R$ 8 milhões, a obra tem 3,5 metros de largura por 1,2 metro de altura, a maior do acervo. O quadro foi pintado em 1962 e retrata mulheres de ascendência africana, uma das bases formadoras da sociedade e cultura brasileiras. “Após a restauração, os danos ficaram imperceptíveis pela parte da frente, mas pelo verso a gente consegue ver as ‘cicatrizes’, as marcas dos rasgos. A gente não podia esconder”, afirmou.
“Quando a obra for exposta de novo, vai ser possível perceber que, na frente, está plenamente restaurada. Mas atrás, na parte de trás da tela, as restauradoras fizeram questão de deixar as marcas como ‘cicatrizes’. A gente entendia que era preciso contar a história. Deixar essa marca de memória do que ocorreu para que não se repita. Não que a gente venha a celebrar, mas que a gente venha a memorar como fato. As cicatrizes indicam que ali houve um dano passado”, destacou Leandro Grass.
Outra obra de grande destaque do acervo restaurado é o relógio de mesa histórico fabricado por Balthazar Martinot e André Boulle no século XVII, que pertenceu a Dom João VI, e é uma das obras mais antigas que compõem o acervo. O restauro foi realizado um Acordo de Cooperação Técnica com a Embaixada da Suíça. Por meio do Embaixador Pietro Lazzeri, o país europeu manifestou disposição em colaborar com o restauro dias após as invasões. A tradicional empresa familiar suíça de relojoaria Audemars Piguet, criada em 1.875, ofereceu-se para o restauro, arcou com custos técnicos (mão de obra e materiais), bem como transporte e seguro. Portanto, não houve gastos públicos.
O acordo permitiu que, em menos de 12 meses, os pedaços do artefato fossem enviados à Suíça e o relógio voltasse ao Brasil restaurado, após mais de mil horas de trabalho. O Palácio do Planalto recebeu a obra de volta oficialmente nesta terça, 7 de janeiro. “No contexto das amizades históricas entre os nossos países, isso para nós foi um passo adicional e coerente. Um dos principais desafios foi a dificuldade em reproduzir a cor original do gesso sobre as partes de ‘tartaruga’. Outro foi a confecção dos vidros laterais, que são curvos, e todo o trabalho de endireitamento dos bronzes que tinham sido deformados”, relatou o embaixador da Suíça no Brasil, Pietro Lazzeri.
O país, conhecido pela expertise em relojoaria, usou também um martelo de pele de porco para conservar o dourado original do relógio durante o restauro. “O objetivo foi trazer o objeto o mais próximo possível do original”, explicou o embaixador. “Estamos orgulhosos por ter contribuído para restaurar esse patrimônio para o povo brasileiro. Nas nossas relações internacionais, a Suíça sempre tem como prioridade a promoção da democracia, dos direitos humanos e da prosperidade comum. A promoção da democracia faz parte dos eixos estratégicos da nossa estratégia de política exterior”, disse o embaixador.
Nas redes sociais, o presidente Lula postou foto ao lado do relógio e agradeceu o acordo com a Suíça. “Ao lado das demais obras de arte, o relógio do século XVII, que foi depredado no 8 de janeiro, foi restaurado, fruto do Acordo de Cooperação Técnica com a Suíça. Agradeço à embaixada e ao governo suíço por este gesto tão importante. Os laços de amizade que unem nossos países se materializando mais uma vez no compromisso com a democracia”, disse.
Outra obra devolvida ao acervo é uma ânfora italiana em cerâmica esmaltada, que estava com 180 fragmentos catalogados após os ataques. “Foi muito desafiador, um verdadeiro quebra-cabeça. Nossa restauradora Keli Scolari, especialista em cerâmica, fez esse trabalho de reintegração que deixou o resultado imperceptível, mesmo com as marcas de restauração. Tivemos que usar muitas técnicas, moldes, porque uma das alças tinha só um pedaço. Foi preciso fazer moldes com silicone para reprodução. A gente também fez modulação no computador para ver como ia ficar, então teve uso tecnológico para ver como as obras seriam após a restauração”, disse Andréa. “Para nós foi muito importante fazer parte dessa história e agora devolver à população, ao povo brasileiro, essas obras que são super representativas da nossa cultura, da nossa arte, da história da arte brasileira e da nossa democracia”, complementou.
» Relógio de mesa, de Balthazar Martinot e André Boulle
» Ânfora italiana em cerâmica esmaltada
» Escultura O Flautista, de Bruno Giorgi
» Escultura Vênus Apocalíptica Fragmentando-se, de Marta Minujín
» Quadro com a pintura Mulatas, de Emiliano Di Cavalcanti
» Quadro com pintura do retrato de Duque de Caxias, de Oswaldo Teixeira
» Quadro representando galhos e sombras, de Frans Krajcberg
» Quadro com a pintura Fachada Colonial Rosa com Toalha
» Quadro com a pintura Casarios, de Dario Mecatti
» Quadro com a pintura Cena de Café, de Clóvis Graciano
» Quadro com a pintura Paisagem, de Armando Viana
» Pintura de Glênio Bianchetti
» Pintura de Glênio Bianchetti
» Pintura de Glênio Bianchetti
» Pintura de Glênio Bianchetti
» Pintura de Glênio Bianchetti
» Quadro com a pintura Matriz e Grade no primeiro plano, de Ivan Marquetti
» Quadro Rosas e Brancos Suspensos, de José Paulo Moreira da Fonseca
» Tela Cotstwold Town, de John Piper
» Tela de Grauben do Monte Lima
» Tela Bird, de Martin Bradley
*Com informações da Presidência da República e da Secom.