
A juíza Patrícia Antunes Laydner, da 20ª Vara Cível e de Ações Especiais da Fazenda Pública do Foro Central da Comarca de Porto Alegre, decidiu no último sábado (26) declarar a nulidade da eleição para o Conselho Municipal de Meio Ambiente (Comam) para o biênio 2024-2026. A magistrada tomou a decisão, em caráter liminar, acatando uma ação civil pública ajuizada pelo Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá) e pela Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), que questionava o fato da Prefeitura propor que o certame fosse realizado por sorteio. A ação foi elaborada pelo advogado Marcelo Mosmann.
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O Comam é um órgão de caráter consultivo e deliberativo que tem competência para propor e formular políticas municipais de meio ambiente em Porto Alegre e acompanhar sua execução. Ele é constituído por 27 membros com mandatos renováveis a cada dois anos, o que inclui sete cadeiras (de titular e suplente) destinadas a entidades, divididas em cinco categorias: universidades particulares de Porto Alegre (uma vaga); Centrais Sindicais dos Trabalhadores (uma vaga); entidades setoriais de Saúde (uma vaga); entidades ecológicas (três vagas); e entidades ambientalistas (uma vaga).
Seguindo regras previstas no Decreto Municipal nº. 20.458/20, assinado pelo então prefeito Nelson Marchezan Júnior (PSDB) em 13 de janeiro de 2020, o edital para a eleição do Comam foi publicado originalmente em 16 de abril no Diário Oficial de Porto Alegre (DOPA). No entanto, em razão da enchente e do decreto de calamidade vigente ao longo de maio, os prazos originais foram alterados, em publicação feita no DOPA em 28 de junho, com a eleição sendo agendada para o dia 12 de setembro, quando deveria ocorrer por sorteio eletrônico. O edital explicita que a eleição ocorrerá por sorteio “quando houver mais de uma entidade habilitada para segmento específico e não ser a única habilitada a comparecer na sessão pública eleitoral virtual, e houver mais de uma vaga para conselheiro do Comam”.
Contudo, o certame acabou declarado como deserto pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade em 22 de agosto após o processo eleitoral não receber inscrições suficientes para o preenchimento das vagas destinadas às entidades. Em 29 de agosto, a Prefeitura informou que o mandato dos membros atuais do Comam seria estendido até a realização de novas eleições, com datas a serem definidas, ou até 31 de dezembro.
O InGá e Agapan alegam que a alteração do Regimento Interno com inserção de sorteio é ilegal, uma vez que seria necessário maioria qualificada dos votos no conselho para fazer a alteração, o que não ocorreu, e também porque, em julgamento da ADPF nº. 623, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do decreto que alterou as regras de composição e funcionamento do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), o que configuraria uma jurisprudência por se tratar de situação análoga a do Comam. As entidades defendiam a manutenção do formato que estava consolidado, em que o processo de eleição era realizado entre as entidades reunidas presencialmente, após a homologação de suas inscrições, sendo escolhida a mais votada, mediante diálogo e acordos presenciais entre as mesmas.
“Registro que a situação atual de déficit de representatividade no Conselho de Meio Ambiente é insustentável. Ademais, a prorrogação de mandatos dos atuais membros do Comam até 31/12/2024 ou até a posse dos novos conselheiros eleitos (…), além de perpetuar a violação do estado de coisas constitucional, culmina por esvaziar a própria atuação do Conselho”, diz a decisão da juíza.
Além de declarar a nulidade do Decreto Municipal nº. 20.458/20, que implantou a modalidade de eleição por sorteio no processo de indicação e escolha dos membros do Comam, ela determinou que o Município de Porto Alegre deve organizar novas eleições para o conselho no prazo máximo de 30 dias.
Coordenador do InGá, Paulo Brack saudou a decisão e ponderou que a Prefeitura e a Secretaria Municipal do Meio Ambiente têm esvaziado a atuação do Comam nos últimos anos. “A juíza chamou duas reuniões de tentativa de acordo entre as partes, porém o governo municipal não se comprometeu a mudar sua posição. Este ano, o Comam se reuniu somente três vezes e enfraqueceu as reuniões das câmaras técnicas, onde se acumulam denúncias e pedidos de informações sem respostas. Outra situação que o InGá reclama é a ausência frequente da participação do secretário nas reuniões do Comam e que há quase 5 anos não há qualquer reunião presencial do Conselho. O importante neste momento é o fato que a liminar garante um processo democrático e representativo no Comam, evitando entidades aventureiras que sejam escolhidas por sorteio sem nenhum compromisso com as pautas históricas das entidades ambientalistas”, disse.