
Após mais de uma década, o TelessaúdeRS encerrou em 31 de agosto o serviço de consultoria a profissionais da atenção básica à saúde em todo o Brasil. A iniciativa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) era a única desse tipo com abrangência nacional, e foi descontinuada porque o Ministério da Saúde (MS) deixou de financiar o serviço.
Vice-coordenador do Telessaúde, Natan Katz explica que o serviço de consultoria sempre foi financiado pela Secretaria de Atenção Primária do MS. Com a reorganização do Ministério e a criação da Secretaria de Informação e Saúde Digital (SEIDIGI) em janeiro de 2023, a nova pasta passou a ser responsável pelo financiamento do serviço. “Nós apresentamos uma proposta para a SEIDIGI, mas recebemos o retorno de que a pasta não tem recursos financeiros para manter o projeto”, afirma Natan.
Esse financiamento é executado a partir de convênios que a UFRGS firma com o Ministério, viabilizando o repasse de recursos. Os convênios têm duração de 12 meses ou mais, e vinham sendo renovados até que o último contrato vencesse em agosto deste ano.
“Desde 2013, esse serviço atendia todas as unidades de saúde do Brasil”, relembra Natan. “Médicos, enfermeiros e dentistas podiam nos ligar quando elas tinham dúvidas sobre o diagnóstico ou sobre o manejo de um paciente”.
De acordo com o vice-coordenador, a equipe do Telessaúde já contava com 80 médicos especialistas e atendia de 300 a 400 demandas por dia. A resolutividade dos casos também era alta: 3 em cada 4 casos eram resolvidos sem que o paciente precisasse ser encaminhado para a emergência ou para uma consulta com especialista.
“O tempo de espera para atendimento especializado é um problema no SUS. O que tem se visto até agora é que não vamos conseguir tantos médicos especialistas em cada município. É preciso levar o conhecimento para esses lugares. O Telessaúde, por exemplo, atendia comunidades indígenas e ribeirinhas, onde leva horas para deslocar um paciente. É um serviço que funciona muito bem, e esse deveria ser o melhor caminho para resolver a questão do acesso aos cuidados especializados”, ressalta Natan.
Para a Associação Médica do Rio Grande do Sul (AMRIGS), o fechamento desse serviço do Telessaúde representa “um grave retrocesso para a saúde pública brasileira”. A organização criou um abaixo-assinado online, solicitando a manutenção do financiamento, que já conta com mais de 9 mil assinaturas.
A Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC) também manifestou preocupação com o encerramento do serviço, ressaltando que as consultorias do Telessaúde resultaram em um “uso mais racional dos recursos do SUS e na promoção de uma atenção mais centrada no paciente”.
A SBMFC afirma que está em diálogo com o governo federal, acionando e articulando o Ministério da Saúde, especialmente a SEIDIGI, para esclarecer a política atual de financiamento de iniciativas de telemedicina que contemplem todo o território nacional, bem como a decisão de não renovar o contrato de financiamento do TelessaúdeRS.
Apesar de existirem outros núcleos estaduais de teleconsultoria em saúde, o TelessaúdeRS era o único que oferecia este serviço em nível nacional. O projeto iniciou em 2005 e, em 2007, passou a ser apoiado pelo Ministério da Saúde.
“Quando começamos a fazer as consultorias, era de maneira assíncrona”, relata Natan. “O profissional de saúde nos mandava como se fosse um e-mail, mas tinha pouca adesão dos médicos. Naquela época, havia muita dificuldade para fazer videoconferências. Então decidimos usar a telefonia, já que a ideia era dar uma resposta na hora. O serviço passou a ter uma adesão muito grande dos médicos, que frequentemente nos procuravam durante o próprio atendimento dos pacientes”.
Com o passar do tempo, o serviço foi ficando mais complexo. Os profissionais passaram a anexar materiais, como exames e fotos de lesões na pele dos pacientes.
Os demais serviços do TelessaúdeRS, financiados pela Secretaria Estadual de Saúde (SES), seguem funcionando com abrangência estadual. Existe uma consultoria para pacientes que estão na fila de espera para consulta especializada, além dos projetos TeleFeridas, DermatoNet, EstomatoNet, RespiraNet e TeleOftalmo.
Também continuam disponíveis, online, mais de 300 publicações de materiais do Telessaúde.