
Fernanda Barth (*)
Desde o dia 03/05/24, nossas vidas mudaram. Mudaram para insegurança, impotência, medo, ansiedade, pânico, trauma dentre outros tantos sentimentos que poderíamos ficar aqui listando, pois o trabalho de uma vida inteira foi levado, literalmente , água abaixo pela enchente que assolou nosso bairro Sarandi, nossa cidade Porto Alegre, carregando nossas memórias, nossos lares, nossos trabalhos, nossas escolas, nossos comércios, nossa felicidade. Estamos em luto e será difícil recompor o emocional, recompor o material, investir novamente em algo que talvez percamos de novo. Por quê? Porque poderemos ser afetados novamente pelas cheias, pelo rompimento dos diques, pela comporta do cais que apresenta fendas e falta de manutenção.
Estamos aqui, reivindicando melhorias, reivindicando modernização de projetos que são de 1970, reivindicando novos projetos que, desta vez, não deverão ficar engavetados e esquecidos, reivindicando respeito, dignidade e segurança enquanto moradores pagantes de impostos, trabalhadores, estudantes. Foi só um evento climático? Não, foi negligência também. Negligência dos nossos governantes que esqueceram o principal: cuidar da devida manutenção e modernização do que nos mantém seguros das enchentes.
Diques precisam ser reformulados, levados a sério, manutenção eficaz, sem paliativos como apenas aterrar, precisamos modernizar a casa de bombas, pois embaixo d’água, não funcionam. Façam reforma, invistam em bombas móveis, em bombas anfíbias, consultem especialistas porque não podemos depender de um sistema ultrapassado, que não funciona quando mais precisamos.
As pessoas fazem ideia da dor de quem perdeu sua casa, suas memórias, mas jamais vão sentir o vazio e o desespero de não poder voltar para sua casa, não poder sentar em seu sofá, dormir em sua cama, servir seu chá, sua água gelada, seu conforto, sua vida como era. Teremos que nos endividar, fazer empréstimo, faltar ao trabalho, crianças ficarem sem escola, sem alimentação, sem os cuidados e a atenção dos seus professores na contribuição da sua educação, sem o convívio social e a recuperação das perdas que a pandemia trouxe, coisa que não haveria necessidade, se tivesse sido levado a sério o investimento nas políticas públicas, no saneamento, na atualização de projetos, no planejamento. Precisamos de pessoas que nos representem enquanto cidadãos de bem, que lutem pelo bem estar do povo, que está sempre disposto a trabalhar, a contribuir, a ser humano. Vimos isso nos inúmeros voluntários, que até hoje, dia 29/05, estão lutando pelos seus irmãos, vestindo, alimentando, resgatando vidas, fazendo vaquinhas solidárias para pagar combustível, comprar insumos para amenizar a dor de quem teve sua vida assolada no mês de maio.
E agora? As bombas foram instaladas em alguns pontos da cidade, os alagamentos se mantém, principalmente em bairros de menor poder aquisitivo, sem perspectiva de retorno, sem saber das reais avarias e das reais necessidades que terão que ser supridas quando pudermos retornar, fazer a limpeza do lodo preto e fétido que tomou conta da cidade, devastou nossos lares, nossas vidas.
Mais uma vez solicitamos socorro, visibilidade, atenção, respeito, modernização e comprometimento na execução dos projetos previstos para a cidade. Está na hora de mudar, todos somos responsáveis pelo evento climático, temos que nos reeducar, respeitar e investir no salvamento dos oceanos, das matas, do planeta, assim como cobrar dos nossos governantes projetos que tragam a preocupação e o cuidado para com o meio ambiente.
(*) Moradora e trabalhadora do bairro Sarandi
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