Geral
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1 de março de 2023
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16:45

Prefeitura recua de estacionamento subterrâneo e concessão da Redenção por 30 anos

Por
Luís Gomes
luisgomes@sul21.com.br
Articula da sociedade civil em defesa do Parque da Redenção tem crescido nos últimos anos. Foto: Joana Berwanger/Sul21
Articula da sociedade civil em defesa do Parque da Redenção tem crescido nos últimos anos. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Ainda que não confirme publicamente, ao menos de forma clara, a Prefeitura de Porto Alegre já não trabalha mais com a possibilidade de lançar um edital para a concessão do Parque Farroupilha, a Redenção, que também envolveria o Calçadão do Lami, à iniciativa privada por um prazo de 30 anos e com a previsão de construção de um estacionamento subterrâneo no parque.

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A interpretação de que a Prefeitura desistiu da concessão nos moldes que foi anunciada no ano passado — 30 anos e a construção do estacionamento — foi confirmada à reportagem pelo promotor de justiça Alexandre Sikinowski Saltz. Ele era o promotor responsável no Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) por uma Notícia de Fato instaurada a partir de uma representação feita pelo Instituto Gaúcho de Meio Ambiente (Ingá). Na representação, o Ingá pedia a abertura de uma investigação a respeito da concessão de parques em Porto Alegre, o que incluía também o Parque Marinha do Brasil.

Na segunda-feira (27), Saltz comunicou o arquivamento da Notícia de Fato sob a justificativa de que a Prefeitura não iria dar mais andamento ao projeto de concessão.

Isso ocorre porque, em resposta à Notícia de Fato datada do dia 9 de fevereiro, a secretária municipal de Parcerias, Ana Pellini, explicou que, em audiência pública, foi apresentado o argumento de que existem aves migratórias que poderiam ser afetadas por mudanças na Redenção, e que somente um “estudo com monitoramento nas quatro estações do ano poderia comprovar os fatos para que as providências sejam adotadas”.

Além disso, diz que seria necessário realizar os estudos a respeito do impacto do planejado estacionamento subterrâneo. Mais uma vez, a resposta de Pellini ao MP diz que o município não teria recursos para realizar estes estudos no momento.

A secretária afirma então que, como “medida intermediária”, a Prefeitura está adaptando o projeto da concessão para um período mais curto, que ficaria entre 5 e 7 anos, e no qual o concessionário que for contratado pelo edital ficaria responsável por administrar os espaços do parque que já geram receitas atualmente. A exceção seria o antigo espaço do posto de combustível. Na resposta ao MP, a secretária também afirma que os recursos deveriam ser investidos no próprio parque de acordo com um caderno de encargos que estaria em elaboração.

“Nenhum investimento novo poderia ser realizado, nem mesmo o estacionamento subterrâneo, apenas a manutenção das vagas que já existem no local. Neste tempo os estudos seriam realizados, um plano de uso do parque estabelecido, e a administração municipal poderá decidir sobre o modelo mais adequado para a gestão do nosso tão querido Parque Farroupilha, ou Redenção, como é mais conhecido”, diz o documento assinado pela secretária de Parcerias.

 

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A reportagem do Sul21 tentava nas últimas semanas confirmar a informação de que a Prefeitura recuou na proposta de concessão apresentada em 2022, mas oficialmente o retorno é de que a gestão está avaliando as contribuições das audiências públicas e da consulta pública e que não existe uma definição ainda.

O mesmo retorno foi dado ao Coletivo Preserva Redenção, que reúne centenas de representantes da sociedade civil em torno da manutenção do caráter público do parque, em contatos com autoridades municipais.

Contudo, o próprio prefeito Sebastião Melo já indicou publicamente que a Prefeitura mudou os planos. Em entrevista à Rádio Guaíba em 17 de fevereiro, o prefeito, respondendo a um questionamento sobre a situação da segurança no parque, disse que a Prefeitura nunca defendeu o cercamento físico, mas que planejava, sim, aumentar a estrutura de segurança e que, para isso, estava pensando em criar uma figura de “gerente” do parque. Este gerente ficaria responsável por administrar os ativos do parque que geram receitas — cita nominalmente o “trenzinho”, o Refúgio do Lago, os permissionários do Mercado e o “posto de gasolina que está abandonado”.

“Eu estou pensando em somar todos aqueles ativos [do parque] e talvez um gerente disso, que gerencie melhor, não mudar nada no parque, não mudar nada no parque, e ter todo e qualquer recurso que eu tiver desse gerenciamento, que vai lá duzentos e poucos mil por mês, o que sobrar eu colocar em segurança”, disse.

A entrevista logo muda de assunto e Melo não explica o que seria essa figura do gerente. O Sul21 vem questionando desde o dia 17 de fevereiro a Prefeitura a respeito, se seria um ente privado ou público, mas também não obteve uma resposta clara.

Contudo, pelo que diz a resposta de Pellini ao MP, a figura do gerente seria a proposta de concessão pelo período reduzido e sem a construção do estacionamento subterrâneo. A partir desta interpretação, o promotor Saltz decidiu arquivar a ação.

“Se a manifestação indica que a falta de estudos ambientais mais detalhados impedem, por ora, o desiderato de avançar no projeto de concessão do parque, também evidencia a necessidade desses estudos para uma gestão ambientalmente qualificada daquele espaço público tão importante para a cidade”, diz o promotor. “Se a ausência dos estudos complementares impedirá que o projeto da concessão avance, não há, ao menos por ora, necessidade de converter a presente NF em IC e avançar na investigação”, finaliza.

Nesta quarta-feira (1º), após mais um contato da reportagem, a Prefeitura encaminhou uma nota em que reconhece que uma proposta atualizada de concessão do Parque Farroupilha “mais enxuta” está em estudo no âmbito da Secretaria Municipal de Parcerias e que ela considera “as contribuições recebidas na consulta pública e nas audiências públicas, além de aspectos de viabilidade técnica e econômica”. Segundo a nota, após a conclusão das análises, a gestão “definirá o modelo mais adequado a ser adotado a fim de qualificar a operação do parque”.

Provocado pelo Coletivo Preserva Redenção, o Ministério Público de Contas do Rio Grande do Sul (MPC-RS) pediu em dezembro de 2022 a suspensão do processo de concessão da Redenção sob o argumento de que a proposta da Prefeitura apresentava “impropriedade consistente” por juntar o parque e o Calçadão do Lami em um único projeto, uma vez que os dois espaços públicos não tinham relação entre si e nem correlação cultural ou geográfica que justificasse a concessão conjunta.

O MPC também apontou a ausência de estudos técnicos prévios que demonstrem a viabilidade da proposta da Prefeitura, principalmente a falta de estudos prévios de impacto ambiental, de vizinhança e na mobilidade urbana. Segundo o MPC, o estudo de viabilidade econômica apresentado pela Prefeitura não possuía a assinatura de um economista e, mesmo que tivesse, seria insuficiente, “visto não conter matriz de riscos, dentre outros elementos considerados indispensáveis”.

Em despacho datado de 12 de janeiro sobre o pedido do MPC, o conselheiro Edson Brum, do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS), pontuou que o projeto de concessão ainda estava em fase de estudos, portanto não poderia conceder a suspensão do processo.

Contudo, ele determina que a área técnica do tribunal deveria incluir na auditoria do edital a ocorrência da “impropriedade consistente” de se juntar a concessão da Redenção com a do Lami; a ausência de estudos técnicos prévios de impacto; a ausência de estudo hidrológico para as obras de drenagem que estavam sendo propostas; a construção de um estacionamento subterrâneo sem estudo de viabilidade urbanística e ambiental; a falta de previsão de medidas compensatórias por parte da eventual concessionária; e a possibilidade de descaracterização do Parque Farroupilha como patrimônio imaterial.

No momento, a área técnica do TCE está acompanhando o processo, mas não recebeu formalmente nenhum edital relativo à concessão de parques. Uma vez recebido, terá 90 dias para auditoria antes de devolver à Prefeitura. Com isso, a previsão inicial do Município, de realizar a licitação em abril, já não é mais possível.


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